Roberto Kupski *
A substituição da secretária da Receita Federal do Brasil, Lina Maria Vieira, divulgada no último dia 15, justificada sobretudo pela queda na arrecadação e pela suposta multa aplicada à Petrobras, que de acordo com a imprensa nacional desagradou profundamente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, traz à tona questões importantes relacionadas ao Fisco e à sua função na sociedade.
Inicialmente, devo afirmar que a atividade de fiscalização é um direito do Estado e do cidadão, respaldado pela Constituição Federal. A missão da administração tributária é cuidar da tributação, arrecadação e da fiscalização, com justiça fiscal e respeito ao cidadão, em benefício da sociedade. Portanto, seu trabalho independe de ingerências políticas e garante que o Estado busque recursos para cumprir o seu papel social.
A suposta insatisfação de representantes do Poder Executivo em relação à fiscalização sobre grandes contribuintes nos remete a duas questões: será que para exercer ação fiscal de empresas de grande porte deve-se pedir autorização ao ministro Guido Mantega, ao próprio presidente ou aos demais representantes do Executivo? É isso que a sociedade espera dos servidores do Fisco?
Além disso, apesar da reconhecida competência da auditora Lina Vieira à frente de órgãos de receitas públicas, o gestor não muda o resultado da arrecadação. Ela é proporcional ao resultado da atividade econômica do país. Não podemos esquecer que estamos em período de crise financeira mundial e, portanto, é mais que esperada a queda na arrecadação. Vale ressaltar, novamente, que o trabalho dos auditores fiscais é essencial para garantir que as consequências da crise não sejam inteiramente repassadas à população sob a forma de redução dos benefícios oferecidos pela administração pública.
As administrações tributárias da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios exercem atividades essenciais ao funcionamento do Estado, conforme enuncia a Emenda Constitucional número 42/2003 (inciso XX do artigo 37). A atividade de fiscalização, de acordo com o Código Tributário Nacional (artigo 142), é vinculada, ou seja: constatado o erro, deve haver fiscalização e o lançamento do crédito tributário de acordo com a lei. Apesar disso, a empresa tem todo o direito de se defender, tanto na esfera administrativa quanto na judicial.
É importante destacar, também, o trabalho dos entes federados por meio de programas específicos de recuperação de dívida que garantem recursos, os quais são repassados à sociedade por meio da ação de seus gestores, ou seja, da atuação do presidente, dos governadores, dos prefeitos. Todo esse processo deve-se ao trabalho da ação fiscal.
A demissão em razão de causas políticas só comprova a necessidade urgente da autonomia do órgão, por meio de Lei Orgânica, com normas gerais, que possibilitem uma identidade nacional de seus servidores, respeitadas as competências específicas, definindo as prerrogativas, direitos e deveres do Fisco, a exemplo do que já ocorre com o Ministério Público e a magistratura.
O episódio demonstrou que é inadmissível que o exercício da função esteja condicionado à vontade política dos governantes. Diante disso, só podemos esperar do Congresso Nacional a edição urgente da Lei Orgânica do Fisco, a fim de regulamentar o inciso XX do artigo 37 e o inciso IV do artigo 167, disciplinando uma atividade já considerada essencial ao funcionamento do Estado pela Constituição Federal.
A Lei Orgânica do Fisco brasileiro, promovendo autonomia funcional, administrativa e orçamentária, é fundamental para proteger os servidores da Receita Federal do Brasil e a própria sociedade brasileira de possíveis ações políticas e interesses econômicos, além de garantir o pleno exercício do Fisco e de sua função vinculada, a qual deve observar somente a lei, sem nenhum tipo de ingerência de ordem política, para, com isso, garantir a eficácia e a justiça fiscal.
* Presidente da Federação Nacional de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite)
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