Artur Henrique da Silva Santos*
Novamente, e desta vez através do Banco Mundial, tecnocratas internacionais vêm propor ao Brasil medidas de eliminação de direitos trabalhistas, sob o argumento de apontar caminhos para que nosso país finalmente consiga “adentrar uma era de modernidade”, de “equiparação a países mais desenvolvidos”, enfim, de superação daquilo que seria uma vocação anacrônica mantida por nosso vício de achar que quem trabalha em troca de salário, ou algo minimamente semelhante a isso, precisa de proteção.
Como é regra nesses casos, toda voz que se opõe a tais medidas é rotulada de burra por uma parte considerável dos analistas econômicos, para os quais, ceder unilateralmente seria uma aposta corajosa, com vistas a um futuro promissor de geração de empregos e investimentos produtivos.
Pois como é doce poder retrucar na mesma medida. Ao propor que o FGTS seja subitamente eliminado, como forma de desburocratizar o Brasil e aguçar o apetite dos investidores, os técnicos do Banco Mundial pisoteiam um argumento que, em outras ocasiões, é tido como caro aos investidores. Estudo que o banco divulgou recentemente, intitulado Avaliação do Clima de Investimentos no Brasil, aponta o FGTS como obstáculo ao crescimento, mas não destaca que esse fundo é hoje um dos principais responsáveis pela manutenção de uma poupança interna, compondo, portanto, um grupo de instrumentos de proteção contra investidas especulativas, de independência econômica e até mesmo de controle da inflação, em torno do qual há unanimidade.
Pode-se dizer, então, que o FGTS desempenha importante papel na busca por uma imagem positiva no cenário internacional, na redução do risco-país e na composição de números saudáveis que comprovem a responsabilidade na condução das contas. Ou, então, tais princípios prezados pela banca internacional valem, mas nem tanto?
Idéias como as do Bird têm se multiplicado nos últimos tempos, seja na forma de déficit nominal zero, de redução de alíquotas de importação para produtos industrializados ou da persistente defesa da flexibilização ou mesmo da eliminação de direitos trabalhistas. Mas, como sinal de que os conservadores não são tão insensíveis como o movimento sindical imagina, o Banco Mundial não se esqueceu de propor que os 8% de contribuição mensal ao FGTS sejam depositados diretamente na folha salarial dos trabalhadores, que teriam assim seus rendimentos ampliados.
Pode parecer sedutor, mas avançando um pouco mais no estudo preparado pelo Bird, veremos que a atual rotatividade da mão-de-obra seria ainda maior caso fosse aprovada outra proposta do banco, a de acabar com o conceito de demissões sem justa causa. Assim, para os empregadores, seria ainda mais fácil demitir e contratar substitutos com salários mais baixos, o que transformaria em pó as supostas vantagens de o trabalhador receber diretamente os 8% de contribuição do FGTS. A massa salarial cairia.
PublicidadeCom o fim do instrumento de demissões sem justa causa, desapareceria consequentemente a multa rescisória de 40%. É claro que não concordamos com a proposta, assim como qualquer trabalhador se consultado.
Não podemos esquecer que o FGTS é também uma fonte de fomento da atividade econômica, atualmente restrita à construção civil, leve ou pesada. Em lugar de fazê-lo desaparecer, a CUT acredita que melhor seria estudar ampliação dos destinos dos recursos, ampliando-o para investimentos em outras necessidades do trabalhador.
Em sua origem, o FGTS já representava uma flexibilização das leis trabalhistas, ao extinguir a estabilidade no emprego. Não achamos que a legislação deva permanecer estanque, mas que mudanças sejam pautadas pelos interesses dos trabalhadores, ou seja, da maioria da população. Além de manter o FGTS, uma proposta justa, correta e produtiva seria a adoção da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Essa convenção, tornada realidade em diversos países, estabelece que os empregadores devem avisar com antecedência ao trabalhador e ao seu sindicato a intenção de demitir. Cria-se, com isso, tempo para que as partes busquem soluções em conjunto e para que a demissão, em lugar de tornar-se a primeira alternativa adotada em momentos de crise, seja a última. A continuidade de tal prática representaria, a longo prazo, um aprendizado de como se constrói uma política coletiva de desenvolvimento.
*Artur Henrique da Silva Santos é secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
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