Osvaldo Martins Rizzo*
No início dos anos 70, o então ministro da Fazenda do governo Médici, Delfim Netto, voltou de uma reunião de cúpula na Europa com a informação de que, em breve, o cartel dos produtores de petróleo reduziria a oferta aumentando enormemente o preço internacional do barril. A informação lhe foi passada pelo seu colega francês, Giscard d’Estaing.
Em reunião ministerial, Delfim repassa a notícia sugerindo a adoção de medidas de contenção para amortecer o choque de oferta que se avizinhava com um grande potencial inflacionário. O general Ernesto Geisel, que presidia a Petrobras, discordou alegando que o francês nada entendia de petróleo, e Médici concordou com o companheiro de farda.
Tempos depois, os fatos deram razão ao francês desacreditado pelos generais, e a censurada imprensa da época noticiou que o governo brasileiro foi “surpreendido” pela inesperada e sideral alta do preço do barril. A inflação anual, que era de 20% no governo Médici, quase dobrou no período Geisel, devido aos efeitos do primeiro choque do petróleo ignorado pelos generais.
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Seguindo o critério da alternância no poder entre as várias facções militares, Geisel sucedeu Médici na Presidência da República e mandou Petrônio Portella avisar Delfim que não o queria como ministro, e nem como postulante ao governo paulista, como almejava Paulo Maluf. O ariano general abominava a idéia de enfrentar a oposição do governador Delfim, aliado da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a mesma Fiesp que hoje quer acabar com a CPMF. Começava a desunião das forças – o grande capital e os militares – que, dez anos antes, depuseram o governo democrático do presidente Jango, minando o apoio empresarial ao regime totalitário.
Os anos seguintes assistiram ao aumento das divergências. No final de 1978, durante o III Encontro Nacional de Distritos Industriais, o presidente da Associação Nacional das Entidades do Desenvolvimento Industrial lidera o pedido da classe dirigente pela abertura política. Insatisfeitos com a condução da economia e às vésperas do segundo choque do petróleo, golpistas de 1964 se converteram em novos democratas, sinalizando que usariam seu poder econômico para apear os militares do poder. Sorrateiramente, o grande capital articulava o fim do regime militar bem antes da visível e involuntária mobilização popular pelas “Diretas Já”, movimento manuseado por meio de um publicitário paulista cuja agência sempre serviu às grandes corporações.
PublicidadeAtualmente, o mundo vive o início de uma nova crise global de grandes proporções, desencadeada pela ganância dos investidores internacionais que esperavam lucrar muito especulando com os bônus lastreados em créditos imobiliários podres. A “corrente da felicidade” – engendrada pelos executivos movidos a estimulantes químicos ilegais dos grandes bancos de investimentos que intermediaram as complexas operações – fracassou, causando enormes perdas patrimoniais aos participantes. Ninguém escapará de pagar por esse prejuízo.
Nos países altamente endividados que necessitam de poupança privada para compensar seu déficit nominal crônico, como o Brasil, a conta será cobrada pelo aumento dos juros. A crise externa, subestimada pelo atual presidente da República quando a rotulou de “crise dos outros”, exigirá a inversão da tendência de queda das taxas de juros internas.
Com o declínio do ritmo das economias norte-americana, européia e japonesa, o tigre chinês pouco poderá fazer para manter o comércio mundial em crescimento. O crescimento do PIB brasileiro perderá força. O ano de 2007 será lembrado com saudades, como foram os de 2004, 2000 e 1997. Esse cenário tornará a classe dirigente nacional insatisfeita, e voltarão as articulações para mudar o quadro político, com o fim do período democrático atual.
* Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro e ex-conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
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