Cláudio Versiani*
"Um time para esquecer", cravou o Estadão na primeira página do dia 2 de julho de 2006. Márcia Denser, aqui no Congresso em Foco, em mais um de seus brilhantes artigos, disse que esta é a seleção dos esquecidos. Discordo, eu não vou me esquecer desta seleção brasileira de futebol que disputou ou deveria ter disputado a Copa da Alemanha.
Caro leitor, imagine o absurdo da situação. Dou como exemplo a minha profissão, e você pode abstrair e imaginar qualquer outra. Sou fotógrafo e estou escalado para cobrir o jogo Brasil x França, quartas-de-final da Copa do Mundo. Não custa lembrar que a competição só acontece de quatro em quatro anos. Portanto, eu, como profissional, deveria me preparar muito bem para fazer um trabalho de acordo com minha responsabilidade. No final do jogo, apresento as minhas fotos que estão fora de foco, mal enquadradas, claras ou escuras, enfim, uma porcaria. O meu editor me pergunta o que aconteceu e eu digo que me faltou vontade ou disposição, uma explicação a "la Cafu". Ou então poderia argumentar que estava arrumando a meia. Não é preciso dizer o que aconteceria comigo.
É muito fácil ganhar a Copa do Mundo nos anúncios da TV, duro é ganhar no campo, principalmente sem disposição. Acho que, como disse o Parreira, é o momento de "reflexionar". Estou reflexionando e não consigo chegar a outra conclusão a não ser que a seleção não estava representando o Brasil e sim a Nike. Kaká foi o único lúcido nesse grupo e pediu desculpas ao torcedor brasileiro. Por sinal, ele é patrocinado pela Adidas, mera coincidência ou mais uma jogada de marketing?
Ronaldo, o Fenômeno, disse que não faltou atitude: "Estamos tristes, demos o máximo". Nunca o máximo foi tão pouco! Ronaldo tem um retrospecto impressionante. Já esteve duas vezes morto para o futebol, renasceu e ajudou o Brasil a ganhar a Copa de 2002, ninguém nega isso. Mas também não é possível esquecer o "piripaco" de 1998 e o jogo contra a França – aquele outro. Até aqui Ronaldo estava empatado. Agora, ele conseguiu a façanha de macular esse incrível retrospecto com uma campanha ridícula, apesar dos três gols. "Estamos orgulhosos do sacrifício que a gente fez",disse ele. Nunca a palavra sacrifício foi tão maltratada. E maltratada também foi a bola nos gramados alemães. A seleção brasileira entrou em campo quatro vezes e simplesmente não correu. Deve ter sido a falta de vontade.
Eles que não reclamem quando escutarem a torcida gritar "TIME SEM-VERGONHA". Parreira admitiu que o grupo estava rachado e que era muito difícil mexer nos medalhões. Ora bolas, quem é o chefe? Quem manda nessa espelunca?
PublicidadeJá estava me esquecendo que Parreira é o chefe, e que o chefe dele é o Ricardo Teixeira. O presidente da CBF está tendo de explicar na Justiça a parceria da entidade com uma tal de Planeta Brasil, empresa responsável pela venda de pacotes turísticos para a Copa da Alemanha. Isso para dizer o mínimo.
O chefe de todos é a Nike, com seus dólares e euros. Futebol e política se misturam. Corrupção, lavagem de dinheiro, passaportes italianos, gatos, mensalões, grana correndo, relações promíscuas com a imprensa, empresários não muito corretos, CPIs que não dão em nada e por aí vai. Eurico Miranda é o símbolo do político cartola. Ele precisa ser deputado para ter imunidade. Em 2002, não foi reeleito e não faz mais parte da bancada da bola. Mas Eurico continua sendo a triste cara de um certo futebol brasileiro. E agora querem voltar com Vanderlei Luxemburgo, o amigo do Galvão Bueno.
Voltando aos gramados, eu me lembro de Valdir Peres, Leandro, Oscar, Luizinho e Junior, Toninho Cerezzo e Falcão, Zico, Sócrates, Serginho Chulapa e Éder, a seleção do Telê Santana. Também me lembro quando a seleção brasileira era conhecida com o "escrete de ouro". Em 1982, na Espanha, não ganhamos e fomos eliminados pela Itália. Mas o time encantou o mundo, e ficou na memória de quem gosta de futebol, que um dia Pelé chamou de "o jogo bonito". E tenho saudade do time de 1970.
À exceção de Robinho, Fred, Zé Roberto, Gilberto Silva e mais alguns poucos, essa cambada de 2006 será lembrada como um time sem-vergonha na cara. Sem dúvida, indico Roberto Carlos para astro principal. Um time que confunde honra e dignidade com saldo bancário. Esses cabeças de bagre podem representar quem eles quiserem, menos a seleção brasileira. O Brasil merece mais, muito mais.
Perdão leitor, mas eu sou do tempo em que o escudo da seleção brasileira era mais importante do que o símbolo da Nike e que cada jogador tinha orgulho de guardá-lo no lado esquerdo do peito.
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