Tales Faria*
Deixo minha velha mãe irritada cada vez que lhe digo que pretendo escrever um livro com a história de nossa família intitulado "Na contramão da história". É que meus antepassados tinham o mau hábito de andar na contramão.
Era o caso do meu pai, por exemplo: militante anarquista numa época em que toda a intelectualidade brasileira pendia para o autoritarismo leninista. Físico-químico, acabou acusado de pertencer a uma célula comunista na UFRJ chamada José de Anchieta. Ele que era ateu! Minha avó, uma pianista clássica, desentendeu-se de uma só vez com Villa-Lobos e Carlos Drummond de Andrade. Cresci ouvindo-a recitar "No meio do caminho tinha uma pedra…" em tom de chacota, e dizer que o velho Villa mal sabia anotar partituras.
A onda agora é o caso Freud, o escândalo do dossiê contra o candidato do PSDB a governador de São Paulo, José Serra. Os editores já apostam que o mandato do presidente Lula está por um fio, enquanto Jorge Bornhausen, Tasso Jereissati, José Carlos Aleluia e praticamente toda a elite conservadora do país desenterraram a tese do impeachment.
Aí eu fico assustado. Gente, não morro de amores pelo Lula, mas, como dizia Noel Rosa, "não há alma sobre-humana" que me faça marchar com os conservadores para tirar do poder um presidente recém-eleito pelo povo. Fico muito desconfiado! Na contramão de todos os comentaristas, digo que ainda não engoli essa história da participação do Freud Godoy na compra-e-venda do dossiê. Sei que essa turma do PT já andou com dólares na cueca, mas não dá para acreditar que eles mandaram o segurança do presidente da República levar grana para uns bandidinhos reconhecidamente faladores como o Darci e o Luiz Antonio Vedoin. Acho que essa história ainda está muito mal contada. E muito longe de ser bem contada.
E mais. Na semana passada o pessoal do comitê tucano dizia aos jornalistas que as pesquisas realmente não eram muito favoráveis, mas que "um fato novo" podia mudar o quadro na última hora. Exato: "um fato novo"! Ou eles eram videntes, ou sabiam de alguma coisa. Não gosto de teorias conspiratórias, mas, agora que vejo o noticiário tomado por uma enorme conspiração, tenho que prestar atenção nas teorias de ambos os lados.
Voltando ao tal impeachment, não quero dizer que o Lula, pelo simples fato de ter a oposição conservadora que tem, está blindado contra a cassação. Nada disso. Se cometeu crime, deve ser punido. Se for verdade que um presidente da República mandou seu segurança produzir/comprar/vender dossiês contra seus adversários, ele merece, sim, a cassação.
Só não quero agora fazer coro com aqueles que puxam a bandeira do impeachment às vésperas da eleição. Prefiro ficar na contramão. Até porque sei que boa parte dos que falam agora em impeachment, nas águas de março de 1964, gritaram por tanques nas ruas. Apoiaram o golpe de Estado dos militares naquela época e bem gostariam de ver o país conflagrado agora. Estou fora!
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