Renata Camargo
Os pecados da carne estão sendo vistos, cada vez mais, com maus olhos. Erros fatais e ações que em nada agregam de valor à sociedade estão ficando fora de moda e perdendo espaço. Não, não é de sexo nem de luxúria que estamos falando. Não que a sociedade esteja se tornando mais puritana nem que esteja em uma busca espiritual mais elevada. É pecado da carne, literalmente. Se trata de custo e benefício: a carne bovina fruto do desmatamento para a criação de grandes áreas de pasto não tem trazido mais benesses à sociedade.
O Ministério Público Federal no Pará lançou nesta semana uma campanha interessante, que vem ao encontro dessa onda de mobilizações da sociedade brasileira. A campanha “Carne Legal” leva o consumidor a refletir sobre a procedência da comida que ele tem colocado no prato. Hoje, nos supermercados, ainda predomina a lógica do preço mais baixo, com um mínimo, de qualidade. Mas quais as conseqüências de não pensar na origem do produto que você consome?
A campanha chama a atenção do consumidor para o fato de cerca de 70% das áreas desmatadas ilegalmente na Amazônia ser destinada à pecuária. O MP mostra que derrubar a mata para transformar em pasto é bem mais barato do que investir em aumento de produtividade e, por isso, muitos produtores optam pelo custo baixo em vista do alto lucro. Segundo a Embrapa, o custo de derrubar a floresta para se ter um hectare de pasto é de R$ 800, enquanto para aumentar a produtividade de área semelhante gasta-se R$ 1.200.
As conseqüências do desmatamento são inúmeras: aumento da poluição, redução de recursos naturais, degradação dos solos, aquecimento do clima local e global, além de muitas outras. Mas, se o consumidor não é ligado às causas ambientais nem se motiva tanto por essas “ecochatices” de desmatamento, a campanha apela para outros aspectos e leva a refletir sobre as responsabilidades em relação ao combate ao trabalho escravo e à lavagem de dinheiro.
O Ministério Público alerta que, para tornar a atividade ainda mais lucrativa, alguns fazendeiros utilizam mão-de-obra escrava para desmatar e preparar a terra para o gado. Ele enfatiza que a lista suja do trabalho escravo é encabeçada por fazendas da pecuária e mostra que pecuaristas já chegaram a responder por 80% das ocorrências de trabalho em condições análogas à escravidão. O Pará, no caso, é o estado campeão em ocorrência desse tipo de afronta aos direitos humanos.
Veja aqui a propaganda sobre trabalho escravo e pecuária
Mas, se o consumidor ainda não estiver convencido da importância de saber a procedência da carne comprada no supermercado ou na venda da esquina, a campanha alerta ainda que a pecuária é um setor muito vulnerável à lavagem de dinheiro. O Ministério Público explica que, muitas vezes, criminosos utilizam-se da pecuária para dar uma aparência de legalidade ao dinheiro obtido de maneira ilegal e, como é difícil o controle sobre as cabeças de gado, fica relativamente simples “inventar” o nascimento de novas cabeças.
Assista aqui a propaganda sobre lavagem de dinheiro na pecuária
O objetivo maior da campanha é convidar os consumidores a refletirem e participarem de um consumo consciente e mais sustentável, pois as escolhas dos consumidores ditam muitas regras no mercado. A carne que eu compro desmata a Amazônia? Foi produzida com o trabalho escravo? Foi temperada com lavagem de dinheiro? Essas são algumas das perguntas que o Ministério Público quer levar o público a responder.
O consumo consciente – aquele em que o consumidor busca saber não só o preço e a qualidade do produto, mas foca o custo/benefício em quesitos como a procedência do produto – é uma coisa relativamente nova no Brasil. O hábito nas compras no dia a dia ainda condiciona aos consumidores a um perfil mais prático, sem grandes ações politicamente corretas. Mas essa realidade está mudando. Há cada vez mais brasileiros querendo evitar os pecadinhos da carne.
Para saber mais sobre a campanha, acesse o site da campanha Carne Legal. Informações bem interessantes sobre o processo histórico envolvendo a pecuária na Amazônia brasileira, a importância dessa atividade e as medidas que estão sendo tomadas para evitar os maus pecuaristas podem ser vistas no vídeo Virando o Jogo.
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