Marcos Magalhães*
Existe uma armadilha no caminho do Brasil. Armadilha montada por quem não tem interesse na construção de um modelo alternativo de geração de energia. E adotada pelos líderes de países que integram um eixo de esquerda na América Latina, que segue de La Paz a Havana, com epicentro em Caracas. Esses líderes não têm perdido oportunidade de combater o programa brasileiro de produção de etanol, sob o argumento de que as terras destinadas ao plantio de cana-de-açúcar poderiam ser utilizadas para a produção de alimentos.
Os produtores brasileiros de cana estão mesmo longe de ser os heróis descritos pelo presidente Lula há poucos meses. Muitas vezes agridem o meio ambiente, derrubam matas nativas e até mesmo, em alguns casos, utilizam mão-de-obra em regime próximo ao escravo. Em algumas regiões do país os usineiros chegam, compram terras antes usadas em outras culturas e tomam conta da área rapidamente.
Em outras palavras, ainda existem muitas vidraças a serem quebradas. Nem sempre, porém, os que arremessam pedras contra elas compraram seus estilingues nas lojas do Greenpeace. Os ataques à produção de etanol cresceram depois que o Brasil e os Estados Unidos firmaram um protocolo de entendimento sobre a criação de um mercado mundial para o álcool, que pode vir a beneficiar os dois países – mas também o meio ambiente global.
Um dos principais críticos da opção brasileira pelo etanol é o líder cubano Fidel Castro. Em artigos publicados na imprensa oficial de seu país, ele questiona a prioridade ao etanol, que, a seu ver, poderia fazer diminuir a produção de alimentos e aumentar a fome no mundo. A contestação ao movimento liderado por Brasília e Washington, pelo aumento da produção mundial de álcool, guarda coerência com o eterno tom crítico de Fidel em relação às iniciativas que têm apoio dos Estados Unidos. Mas não deixa de surpreender por partir do líder de um país que sempre apostou na cana-de-açúcar como produto básico de sua pauta de exportações.
O maior crítico do programa, porém, é o presidente da Venezuela, Hugo Chávez. Na sua opinião, existe um problema “ético e ecológico” com o etanol, como declarou em recente viagem a países do Caribe. Segundo relato da agência de notícias BBC, ele pediu aos países caribenhos que comprem petróleo da Venezuela e não dediquem suas terras à produção de cana, que chamou de “alimento dos carros dos ricos”.
A oposição de Fidel e Chávez ainda conta com o apoio do Irã, que tem procurado se aproximar de diversos países da América Latina, como a Nicarágua, como caminho para reduzir a influência de Washington sobre a região. Mais uma vez, a oposição à expansão da produção de etanol vem de um país com forte interesse no setor de petróleo.
PublicidadeAs críticas feitas pelo eixo de esquerda latino-americano, com o apoio do Irã, têm muito de oportunismo – tanto pelo interesse no petróleo como na vontade de atingir os Estados Unidos. Por outro lado, o Brasil tem sido criticado por países ricos por supostamente permitir o desmatamento de áreas da Amazônia para a produção de etanol – informação contestada por Brasília.
A batalha pela opinião pública internacional está apenas começando. Os consumidores, cada vez mais conscientes, pensarão duas vezes antes de encher o tanque de seus carros com álcool, apesar de este ser bem menos poluente que a gasolina, se desconfiarem que seu dinheiro vai para produtores que não respeitam o meio ambiente, destroem florestas ou não respeitam os direitos dos trabalhadores.
A resposta do Brasil deve ser menos retórica do que prática. O país deve se empenhar na elaboração de um certificado, internacionalmente aceito, de qualidade ambiental e social da produção de etanol. Certificado que só seria obtido por produtores que rejeitem o caminho fácil de derrubar florestas e desrespeitar os direitos humanos – e que optem, ao contrário, por uma produção sustentável, do ponto de vista ambiental e social.
Além desse certificado, o país precisa adotar com urgência um zoneamento ecológico-econômico, que indique as áreas onde a produção de álcool seria uma solução, não um problema. Tudo isso feito com transparência, para reduzir ao máximo qualquer dúvida sobre o processo de produção do etanol que vier a ser exportado a diversos países do mundo. Somente assim as armadilhas poderão ser evitadas.
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