São 109 os deputados (84) e senadores (25) que apresentaram emendas para modificar o texto da polêmica Medida Provisória 808/2017, que altera 17 artigos da reforma trabalhista sancionada em julho do ano passado (veja a íntegra). Ao todo, os congressistas formalizaram 967 sugestões de mudança da matéria – há quem peça a própria revogação da nova lei trabalhista –, boa parte delas destinada a repor na legislação o imposto sindical obrigatório. Com a pauta da segurança pública tornada prioritária no Congresso, não há entre parlamentares a certeza de que a matéria seja votada no prazo regimental, o que a invalidaria.
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Descontada já na folha de pagamento, a taxa sindical obrigatória foi um dos pontos mais atacados da reforma por parte de parlamentares da oposição, para quem o governo Temer atua para enfraquecer sindicatos e retirar direitos trabalhistas. Já o governo diz que se trata de “modernização” das relações de trabalho e que parte dos próprios empregados defendiam o fim do imposto.
Confira o quadro de emendas, seus autores e o conteúdo de cada uma delas
Em um rápido levantamento no texto da MP 808, constata-se que são mais de cem as emendas que fazem algum tipo de referência ao imposto sindical (são cerca de 150 as citações ao tema). Mas nem todas visam simplesmente a revalidação da taxa, e algumas sugerem a substituição da cobrança por um modelo negociado com sindicatos. O tema é um dos mais recorrentes desde que a reforma ganhou força, a partir do início de 2017, ao lado de questões como a dos direitos das trabalhadoras gestantes ou lactantes, que são revistas na medida provisória (leia abaixo os principais pontos).
PublicidadeMas há quem acredite que, por não ser de interesse do governo, a matéria será deixada de lado até “caducar”, ou seja, perder validade – o que terá acontecido em 24 de abril, caso o texto não seja aprovado por deputados e senadores. “É bem provável que eles façam isso [deixa o prazo correr], mas nós [da oposição] não vamos fazer. O governo vai enrolar. Se a MP cair, vai achar até que é melhor”, disse o senador Paulo Paim (PT-RS) ao Congresso em Foco.
Um dos parlamentares mais associados à causa trabalhista, Paim apresentou 58 emendas à medida provisória. “A medida não é grande coisa em relação ao que foi aprovado. Nós vamos trabalhar para reverter [pontos da reforma], votar para derrubar um monte de arquivos e introduzir outros. O governo não tem tanto medo da derrubada [da MP], mas tem medo das introduções”, acrescentou o petista.
Cronograma eleitoral
Presidente da comissão mista que analisará a medida antes da votação em plenário, o senador Gladson Cameli (PP-AC) garantiu à reportagem que a matéria terá tramitação regular, dentro dos prazos, e que não há movimento para que ela perca a validade em razão das desmobilização da base. “Não existe isso. Em nenhum momento o líder do governo – ou o próprio governo – me procurou para tratar desse tipo de assunto. Pelo contrário”, enfatizou Gladson, que discutirá com os membros do colegiado na próxima quarta-feira, às a partir das 14h, um “cronograma de trabalho” para debater e votar a medida.
“Vamos cumprir todos os prazos regimentais para não dar brecha para questões políticas internas, que possam vir a atrapalhar. Não vou deixar politizarem a situação, que é o que muitos querem fazer. Temos que pensar no trabalhador e no nosso país”, acrescentou o senador.
Vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (MDB-MG) disse ao site que o governo não o procurou para tratar da MP. “Então não posso adiantar o que eles querem ou não.” Mas Fábio sinalizou que, em ano de disputa nas urnas, tudo é muito imprevisível quando o assunto é pauta polêmica, de forte apelo popular.
“No período eleitoral, você sabe que a cabeça de todo mundo está voltada para a eleição… Então, não sei se as coisas andam como deveriam andar. Numa questão polêmica, talvez não seja a hora de pautá-la. Isso deveria ter se resolvido no ano passado, não neste ano”, acrescentou o emedebista, aludindo a outra matéria prioritária para o governo, mas que saiu de pauta depois de não ter avançado em 2017, a reforma da Previdência.
Tucano na mira
Líder da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP) afirmou ao site que segue na defesa de uma alternativa para o fim do imposto sindical, desde que não seja a mera revalidação da taxa. Nos últimos meses, Paulinho da Força se reuniu com Temer algumas vezes com o objetivo de buscar uma saída para os sindicato – como o Congresso em Foco mostrou em maio do ano passado, Temer usou a questão do imposto sindical como moeda de troca para aprovar reformas.
Ciente do alinhamento do governo com o empresariado, Paulo Pereira também diz acreditar na tese de boicote do governo à MP. “Eu acho que é meio verdadeiro isso. Nós temos que trabalhar para aprovar, mas acho que o governo vai trabalhar para não aprovar”, sintetizou o deputado, que desde já trabalha contra a indicação de Rogério Marinho (PSDB-RN), que relatou a reforma trabalhista, para a relatoria da MP 8080.
“Vamos tentar tirar o Rogério Marinho. Ele vai querer fazer toda uma encrenca para dentro da Câmara em um ano eleitoral”, vislumbrou, em referência indireta à rejeição ao tucano entre trabalhadores e sindicalistas.
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Na MP 808, o líder do Solidariedade propõe uma emenda com vistas à alteração da estrutura sindical do país. “Não é repor [o imposto sindical]. É criar uma nova contribuição, com um novo formato, dentro de um novo sindicalismo com força de mobilização”, acrescentou o parlamentar, que apresentou três emendas à medida provisória de Temer e defende a “contribuição de negociação coletiva”.
Contribuição Negocial
São diversas as emendas relativas à contribuição sindical. Há a sugestão, por exemplo, para enxertar na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) artigo “para regulamentar a Contribuição Negocial, com a redução gradual da contribuição sindical compulsória, conhecida como imposto sindical”. A ideia é compartilhada por deputados como Roberto de Lucena (PV-SP) e Rôney Nemer (PP-DF) e senadores como Paulo Paim e Otto Alencar (PSD-BA).
A “Contribuição Negocial” também é defendida pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-BA). “Havia um acordo entre as entidades sindicais para instituição da contribuição sobre a negociação coletiva, a qual será decorrente do processo de negociação coletiva. Trata-se de uma forma alternativa de financiar a atividade sindical, uma vez que a compulsoriedade do imposto sindical – principal fonte de financiamento dos sindicatos – foi excluída com a reforma trabalhista”, defendeu o deputado, que define percentuais de colaboração na sua sugestão de conteúdo.
Já a emenda de mesmo teor apresentada por deputados como Heitor Schuch (PSB-RS) e Severino Ninho (PSB-PE) é clara ao defender a reposição da antiga regra, importante fonte de custeio de sindicatos. “No ato da admissão de qualquer empregado, dele exigirá o empregador a apresentação da prova de quitação do imposto sindical”, diz a sugestão dos parlamentares, para quem os sindicatos foram prejudicados com a reforma.
“A Reforma Trabalhista subtraiu importante fonte de custeio do movimento sindical brasileiro, a saber, a contribuição sindical, e isso sem qualquer transição, praticamente inviabilizando para a maioria das entidades sindicais as condições materiais mínimas para que possam bem representar suas bases. Com isso, o Brasil institucionalmente adota uma postura antissindical, pondo-se em rota de colisão com os princípios defendidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT)”, reclama Heitor, acrescentando que a gestão Temer, “além de subtrair direitos dos trabalhadores, busca inviabilizar que os seus respectivos sindicatos tenham as condições de defendê- los”.
Já Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que norteia seu mandato pela questão dos trabalhadores e aposentados, é claro ao defender o desconto obrigatório na folha. “Os empregadores ficam obrigados a descontar na folha de pagamento dos seus empregados as contribuições devidas as entidades sindicais, criadas por lei ou definidas em convenção coletiva de trabalho, e serão devidas independentemente de prévia autorização de todos os participantes de categoria, quando por este notificados”, anota o parlamentar.
“Papai Estado”
Temer enviou a MP ao Congresso em novembro, contrariando as objeções do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Naquela ocasião, o presidente se reuniu com o deputado e lhe disse que, durante a votação da reforma, teve que se comprometer com senadores acerca do envio de uma medida provisória ao Congresso, pois do contrário não teria conseguido aprovar a matéria em tempo hábil – repleto de polêmicas, o texto enfrentou resistência de parlamentares ligados à causa trabalhista e poderia ter retornado à análise da Câmara caso não fosse logo aprovado, atrapalhando os planos do governo.
Um dos fiadores da política reformista de Temer, Maia disse à época – em meio a um cenário de pressão de aliados por mais espaço no governo – que a complementação da reforma trabalhista via MP “enfraquece o Parlamento”. Para o deputado, o correto seria o envio de um projeto de lei, que tem tramitação mais facilitada em relação às medidas provisórias.
O compromisso de Temer com os senadores da base e da oposição foi apenas parcialmente cumprido, em um contexto de controvérsia que ensejou agressões físicas em comissão temática e ocupação da Mesa do plenário, com o objetivo de obstruir a votação da reforma. Em 28 de junho, durante reunião da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, o líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), levou ao colegiado uma carta em que o presidente prometeu vetar pontos polêmicos da reforma, ou ao menos editar uma MP.
Mas Temer sancionou, sem vetos, o texto aprovado em plenário pelos senadores dias depois das promessas na CCJ. E, para tentar acalmar os ânimos no Congresso, dizia que estava a caminho a medida provisória para resolver as pendências. No entanto, devido a restrições na legislação, a MP só pôde ser editada em novembro, depois do prazo de três meses para que as novas normas trabalhistas entrassem em vigência. Em uma das imagens que marcaram aquele momento, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) passou a exibir, em discursos no plenário, placas mostrando a quantidade de dias que haviam transcorrido desde a promessa governista.
“O forte desse governo não é a palavra, a ética, o compromisso feito, e sim o que o mercado determina. Como nessa MP o governo fez muitas concessões… Bobeira foi de quem acreditou e, para aprovar as modificações na lei trabalhista, achou que essa MP ia compensar ou resolver”, disse Chico Alencar (Psol-RJ) à reportagem, lembrando que até o excesso de emendas vai provocar confusão e, assim, favorecer os planos do governo. “Ele vai alegar que não é com ele mais, que fez a parte dele.”
“Agora, os sindicatos têm que aprender a viver da mobilização e da adesão voluntária das suas bases. né? Chega de contar com o ‘papai Estado’. Não dá, nem quando ele promete”, concluiu Chico.
O QUE PODE MUDAR COM A MEDIDA PROVISÓRIA:
1 – Gestante e lactante em ambiente insalubre
O texto sancionado por Temer prevê que a trabalhadora gestante deverá ser afastada automaticamente, durante toda a gestação, apenas das atividades consideradas insalubres em grau máximo. Para atividades insalubres de graus médio ou mínimo, a trabalhadora só será afastada a pedido médico. Mas, com a MP, fica proibida a execução de atividades por mulheres gestante/lactante em ambiente com qualquer grau de insalubridade, mesmo diante de atestado médico.
2 – Trabalho intermitente
A MP pode regular os contratos do chamado trabalho intermitente, aquele no qual a prestação de serviços não é contínua, embora com subordinação. A lei permite a alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador. Agora, a medida sugere, por exemplo, um prazo de carência para demissão do trabalhador, que depois poderia ser recontratado. A MP também sugere que a remuneração por hora ou dia de trabalho nesse tipo de contrato seja equivalente, de maneira proporcional, com o salário mínimo.
3 – Acordo individual para a jornada 12 por 36
A medida provisória permite que sindicatos negociem com empregadores os temos da chamada jornada 12 por 36, aquela em que o empregado trabalha 12 horas seguidas e descansa as 36 horas seguintes. A lei em vigência prevê que tais acordos sejam feitos pelo trabalhador individualmente, diretamente com os patrões, o que poderia tornar a relação trabalhista desigual.
4 – Contribuição previdenciária
O governo propõe a criação de uma espécie de recolhimento complementar proporcional aos meses em que o empregado receber remuneração inferior ao salário mínimo.
5 – Dano moral
O valor da condenação imposta ao empregador por dano moral e ofensa à honra (assédios moral ou sexual, por exemplo) deve deixar de ser calculado de acordo com o salário do empregado ofendido. A questão, que consta da lei em vigor desde sábado (11), havia sido vista como uma forma de discriminação ao fixar punições segundo o nível remuneratório dos trabalhadores, no contexto em que quase metade dos brasileiros sobrevive com até um salário mínimo. O pagamento de indenização por dano moral pode chegar a 50 vezes o teto do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), que é de R$ 5.531,31.
6 – Autônomos
A medida provisória prevê a negociação de regra para a situação dos trabalhadores autônomos. Esse ponto da matéria pretende proibir a cláusula de exclusividade, em que estaria configurado o vínculo empregatício e, consequentemente, a obrigação de observância (por parte dos empregadores) dos compromissos trabalhistas dele decorrentes.
7 – Representação em local de trabalho
A MP assegura que as comissões de representantes dos trabalhadores, permitidas em empresas com 200 empregados ou mais, não substituirá o papel dos sindicatos. Assim, os grupos sindicais terão que participar, obrigatoriamente, das negociações coletivas in loco.
8 – Prêmio
O texto da medida também permite que sejam pagos em duas parcelas alguns prêmios concedidos ao trabalhador. Produtividade, assiduidade e méritos congêneres são os critérios considerados na premiação.
9 – Gorjetas
A MP 808 determina ainda que as gorjetas não sejam consideradas no cálculo de receita própria dos empregadores, reservando-se aos empregados. Normas coletivas de trabalho nortearão o rateio dos valores.
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