Renata Camargo
As forças contrárias aos movimentos ambientalistas atuantes no Congresso colecionam vitórias importantes nas disputas com os preservacionistas. Levantamento feito pelo Congresso em Foco mostra que quase um quinto das matérias votadas de fevereiro de 2007 até julho deste ano tem efeito negativo para o meio ambiente, de acordo com critérios estabelecidos por organizações e especialistas em sustentabilidade. No total, os parlamentares apreciaram 53 iniciativas que mantêm alguma relação com o tema. Dessas, oito medidas provisórias e dois projetos de lei são considerados contrários aos interesses ambientais.
O levantamento do site deu origem a uma série de reportagens publicadas a partir de hoje sobre como o Legislativo brasileiro trata as questões ambientais. A análise das votações revela o posicionamento de grupos que desqualificam as leis ambientais federais a partir da mentalidade de que as atividades econômicas estão sendo prejudicadas pelo excesso de proteção à natureza.
“O Congresso hoje é o Brasil do século XIX, é um Legislativo quase que escravocrata, que está no caminho do atraso, em que conquistas importantes na legislação ambiental tem sido tratoradas. O Congresso está despreparado para resolver os desafios do mundo contemporâneo e o Executivo tem muita participação nessa história”, afirma o ex-deputado constituinte Fábio Feldmann, autor da Lei de Redução de Emissões de Poluentes por Veículos. Ele compara o Congresso Nacional ao Brasil agroexportador dos tempos do Império de mentalidade latifundiária e escravista e relações políticas e sociais baseadas no clientelismo.
Para Feldmann, o comportamento do Congresso em votações recentes e as atuais investidas contra o Código Florestal mostram um cenário de retrocesso, pouco propício a avanços ambientais. Feldmann foi deputado federal durante três mandatos consecutivos (1986-1998). Ele avalia que na atual legislatura dificilmente seriam aprovadas leis importantes como a Lei de Política de Educação Ambiental e a Lei de Acesso Público aos Dados e Informações Ambientais, propostas de sua autoria. “No Congresso de hoje, não há ambiente para aprovar a Lei do Snuc [Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação], por exemplo. Nem a Lei da Política Nacional dos Recursos Hídricos. Fui relator dessas duas propostas e conseguimos aprovar sem grandes problemas”, disse.
A pesquisa feita pelo Congresso em Foco aponta três setores como principais responsáveis pelas mudanças mais agressivas contra os recursos naturais, segundo organizações e especialistas: agropecuário, infraestrutura e energia. “A pressão contra o meio ambiente vem de todos os cantos”, afirma o coordenador de Políticas Públicas da ONG Greenpeace, Nilo D’Ávila. “A bancada ruralista exerce muita pressão, mas a indústria de energia e os lobistas de mineração também têm um lobby muito forte. Eles conseguem as coisas sem ninguém ver, sem ninguém saber de onde vem. Eu trocaria o barulho que a gente faz pela competência deles”, acrescenta o ativista.
Veja a lista de matérias sobre o tema aprovadas nesta legislatura:
Na Câmara
No Senado
A bancada ruralista tornou-se a mais conhecida força contra os ambientalistas pela pressão por terras para o plantio e criação de gado. No governo Lula, no entanto, o segmento da infraestrutura teve grande impulso com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e tenta aprovar emendas que dispensam licenciamento ambiental para obras de grande impacto, como a da BR 319, estrada que liga Manaus (AM) a Porto Velho (RO) e cruza a parte mais preservada da Amazônia. O setor de energia também pressiona pela aprovação de emendas, como a que estendeu vantagens de pequenas hidrelétricas para usinas de maior impacto ambiental, e inibe que propostas de energias renováveis sejam priorizadas.
Ameaças
A sociedade brasileira tem vivido as consequências das reações da natureza. O caso das enchentes em Santa Catarina – que, no final do ano passado, deixou 12.027 desalojados e desabrigados, 135 mortos e dois desaparecidos – foi, sem dúvida, o mais trágico da história recente. Mas outros números também causam alerta. Dados da Faculdade de Medicina da Universidade de Paulo (USP), apresentados em abril durante o seminário Qualidade do Ar e Políticas Públicas Socioambientais nas Metrópoles Brasileiras, revelam que, por ano, 3,5 mil pessoas morrem devido à má qualidade do ar na cidade de São Paulo.
São Paulo é a cidade mais poluída do país. O número de mortes na capital paulista, no entanto, nem se aproxima dos alarmantes dados da Índia e da China. Segundo o estudo Poluição de Ar em Pequim – Olimpíadas 2008, do Instituto de Física da USP, somente no país chinês 400 mil pessoas morrem prematuramente, todos os anos, por causa dos altos índices de poluição do ar todos os anos. Na Índia, o número é ainda maior: a má qualidade do ar causa 527 mil mortes anuais.
O levantamento do site mostra que o Congresso nem sempre está atento aos alertas do meio ambiente. A pesquisa revela que as grandes ameaças do ponto de vista ambiental dentro do Legislativo nos últimos dois anos e meio vieram do Executivo. As ameaças são fruto de medidas provisórias enviadas pelo governo Lula ou por meio de emendas de contrabando (emendas enxertadas nas MPs que não tem relação direta com o conteúdo da medida). A principal delas, segundo ambientalistas, foi a MP 458, conhecida inicialmente como MP da Amazônia e, posteriormente, batizada por ambientalistas como MP da Grilagem.
A MP 458 – transformada na Lei 11.952 – acelera o processo de regularização fundiária de terras públicas na Amazônia, simplificando as etapas de legalização de terras de até 1,5 mil hectares. Ambientalistas alegam que a proposta facilitará a regularização de terras públicas griladas, o que poderá causar um aumento do descontrole em relação ao desmatamento (leia sobre a MP 458).
De acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente, 70% das emisões de gases do efeito estufa no Brasil são causadas pelo desmatamento. Informações do site Breathing Earth, uma espécie de simulador virtual em tempo real de emissões de gás carbônico, apontam que o Brasil emite por ano aproximadamente 336 milhões de toneladas de CO2 na atmosfera. Os dados mundiais relativos a emissões diferem entre si, mas de acordo com Breathing Earth, em média, cada brasileiro emite 1,69 toneladas de CO2 por ano.
O Brasil é considerado o quinto país em liberação de gases de efeito estufa na atmosfera. Mas a emissão per capita brasileira está bem aquém do que é liberado por um norte-americano. Nos Estados Unidos, segundo a mesma fonte, a emissão per capita é de 19,66 toneladas por ano, com emissão de mil toneladas a cada 5,3 segundos. No total, o país norte-americano lança no ar mais de seis milhões de toneladas de gás carbônico por ano. A emissão anual é calculada a partir da relação da emissão per capita com o total da população do país (Veja como estão os outros países) (Confira o ranking dos países do G8).
A preocupação com emissões de gases do efeito estufa também foi o argumento usado por ambientalistas para protestar contra a MP 422. A medida – também batizada de MP da Grilagem – foi aprovada em maio de 2008 e transformada na Lei 11.763 de 2008. Essa lei
Leia também
Deixe um comentário