O presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), insinua que o partido romperia com o governo Lula caso houvesse uma participação direta do Palácio do Planalto nas eleições municipais. Candidato do PMDB na capital paulista, ele até admite que a máquina federal trabalhe em favor da prefeita Marta Suplicy (PT), mas aconselha o presidente Lula a não participar da campanha.
"Eu acho que o presidente terá a sabedoria de não fazer essas visitas, digamos assim, no momento da eleição", avisou.
Temer é o que os antigos costumavam chamar de velha raposa política. O deputado não brinca em serviço. No início do ano, foi reconduzido mais uma vez à presidência do PMDB, depois de vencer cardeais como os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e José Sarney (PMDB-AP).
Na última quarta-feira (2), após votar contra a Medida Provisória do governo que fixa o salário mínimo em R$ 260,00, Temer conversou com o Congresso em Foco. Ao longo de uma hora de entrevista, ficou claro que o parlamentar tem um pé fora do governo. Ao mesmo tempo em que fala da necessidade do PMDB colaborar para a governabilidade, não poupa críticas ao estilo petista de administrar.
Temer acha que já passou da hora do presidente Lula mudar o modelo econômico conduzido pelo ministro Antonio Palocci, da Fazenda. Mais do que isso, o deputado também não hesita em afirmar que é preciso mais “harmonia” interna no governo para evitar os ministros lavem roupa suja em público. Publicidade
"Nós do PMDB esperávamos que no segundo ano do governo houvesse um redirecionamento dessa política econômica. Eu acho que o ministro Palocci tem capacidade e competência administrativa para fazer esse redirecionamento", afirmou.
Ao contrário de Renan e Sarney, que sonham com a indicação de um peemedebista para vice na chapa de Lula à reeleição em 2006, Temer ainda aposta que o partido terá candidato próprio. Nesse caso, sairia da base aliada.
"Até por uma questão ética, se num dado momento o PMDB resolver, como tem resolvido, ter candidato próprio, num prazo muito antecedente, o PMDB tem que sair do governo", disse o ex-presidente da Câmara.
Congresso em Foco – Até que ponto o PMDB apóia o governo Lula? Quase toda semana, parece que o governo tem que entrar em ação para buscar o apoio do PMDB.
Michel Temer – Apóia em favor da governabilidade. O PMDB entende que tem compromissos com o país e, convenhamos, se o PMDB não der apoio a muitas das teses governamentais, eu acho que fica difícil governar, pelo menos aqui no parlamento. As maiorias que têm se constituído aqui, têm se constituído com o voto do PMDB. Evidentemente, há no PMDB sugestões críticas, digamos assim, à conduta muitas vezes até da política econômica. Mas não há objeção radical do PMDB. Quando o PMDB faz críticas, o que ele está fazendo é colaborar, o que, aliás, é função de todo parceiro. Parceiro que só aplaude, prejudica. Parceiro que critica, muitas vezes ajuda.
"Se o PMDB não der apoio a muitas das teses governamentais, eu acho que fica difícil governar, pelo menos aqui no parlamento"
Nessa parceria com o governo, como ficam as eleições municipais? Que sugestão o PMDB teria a dar para o governo, sobretudo com um salário mínimo de apenas R$ 260,00?
O que nós podemos sugerir é uma das coisas mais óbvias: a história do crescimento econômico. Eu acho que o governo deveria encontrar meios e fórmulas para buscar o crescimento. Você só faz o Brasil crescer se você investir. Eu dou exemplo do superávit primário, que tem sido superior ao acordado com os credores internacionais. Se você tomar um dos últimos superávits primários, que foi de 5,21%, é superior uma quinta parte ao superávit acertado com o FMI (Fundo Monetário Internacional). Isso representava, mais ou menos, R$ 2 bilhões, que, se reinvestidos, poderiam gerar empregos e desenvolvimento. No tocante ao social, é claro que o Brasil tem muitos pobres, até alguns abaixo da linha da pobreza, de modo que uma certa atividade assistencialista é importante. Tome-se o exemplo do Fome Zero. Mas o Fome Zero só se completa se ele embutir a tese do crescimento econômico porque na tese do crescimento econômico está o fenômeno do emprego.
"O Brasil tem muitos pobres, até alguns abaixo da linha da pobreza, de modo que uma certa atividade assistencialista é importante"
O senhor avalia que o presidente Lula está sendo muito paciente com a política econômica do ministro Antonio Palocci, da Fazenda?
Eu acho que, durante o ano passado, o governo agiu bem. A manutenção do ajuste das contas públicas, a política econômica sem interrupções, acho que foi uma coisa útil para o país. Agora, nós do PMDB esperávamos que no segundo ano do governo houvesse um redirecionamento dessa política econômica. Eu acho que o ministro Palocci tem capacidade e competência administrativa para fazer esse redirecionamento. Eu não digo que o presidente esteja sendo paciente ou não. Evidentemente, ele deve estar conversando com a área econômica e deve estar convencido que esse é o melhor caminho. Nós não achamos, mas eu não creio que essa seja a posição do presidente.
"Nós do PMDB esperávamos que no segundo ano do governo houvesse um redirecionamento dessa política econômica"
Apesar das diferenças dentro do PMDB, há um consenso contra a política econômica atual.
Sob esse ângulo, não há divergência no PMDB.
O senhor acha que pode haver uma ruptura mais para frente? A popularidade do presidente Lula está estável, mas o governo enfrenta uma queda na avaliação positiva. O senhor acha que isso pode ser motivo para uma ruptura eventual do PMDB com o governo Lula?
Eu não acredito. Eu volto a dizer que o PMDB tem muita responsabilidade perante o país. Por isso, ajuda o governo. Evidentemente, o PMDB vai acentuar sempre suas observações críticas com o objetivo, naturalmente, de ajudar a chamada governabilidade. Evidente, se lá para frente também não houver nenhum redirecionamento, não sei o que pode acontecer. Neste momento, eu não diria que há essa possibilidade de ruptura. O que pode, talvez – e aqui é preciso é tomar cuidado – , o que pode agravar o relacionamento é a eleição municipal. Nas eleições municipais, deverá haver muitas divergências entre o PMDB e candidatos do PT. Agora, se o governo não entrar nas eleições municipais, eu não creio que haja qualquer agravamento nessa relação. Haverá se o governo entrar.
O senhor acha que o presidente Lula vai ficar de fora da campanha em São Paulo, já que a reeleição da prefeita Marta Suplicy é considerada prioritária para o PT?
Eu espero que fique. Agora, se ele vai ficar ou não, eu não saberia dizer.
Por exemplo, qualquer visita do presidente Lula a São Paulo para qualquer solenidade, com a presença da prefeita Marta Suplicy, já será um ato de campanha eleitoral.
Eu acho que o presidente terá a sabedoria de não fazer essas visitas, digamos assim, no momento da eleição. São três ou quatro meses de eleições, não mais do que isso.
"Eu acho que o presidente terá a sabedoria de não fazer essas visitas (a Marta Suplicy, em São Paulo) no momento da eleição"
O senhor falou muito de sugestões para o governo, que é um discurso muito utilizado pelo líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Até que ponto as sugestões do partido têm sido aceitas?
Eu diria que até o presente momento, não. Mas, aí, nós temos que insistir. Eu acho que a nossa tendência é realmente insistir nessas propostas. Nós insistimos na correção da tabela do imposto de renda. Está surtindo um efeito mínimo.Nós colocamos o tema na pauta de discussões. A questão do crescimento econômico está na pauta de muitos partidos. Não é só o PMDB. Até no PT há setores que sustentam a necessidade de rediscussão.
"Nós insistimos na correção da tabela do imposto de renda. Está surtindo um efeito mínimo"
A votação do salário mínimo de R$ 260,00 na Câmara exigiu um enorme esforço do PMDB, com a vinda de ministros do partido para tentar reduzir a rebeldia na bancada.
Os ministros do governo são ministros do governo. Não vieram aqui como integrantes do PMDB. Vieram como integrantes do governo. Acho legítimo que o governo, por meio dos seus ministros, faça a sua pregação. Como acho legítimo também que muitos deputados entendam que o valor de R$ 260,00 não é o ideal.
"Os ministros vieram aqui (fazer campanha a favor do salário mínimo de R$ 260) como integrantes do governo, não do PMDB"
Esse salário mínimo de R$ 260,00, caso seja mesmo mantido pelo Senado, representará um ônus político muito grande, sobretudo para um governo de esquerda?
Claro que haverá um ônus popular, eu não tenho dúvida. Tanto que eu propus muito que o governo fizesse uma proposta de R$ 275 neste momento porque acho que ganhariam muito o governo, o país, os trabalhadores e o Congresso Nacional.
Voltando às eleições em São Paulo, como o PMDB ficaria no segundo turno?
No segundo turno, acho que é Michel Temer mais um.
"No segundo turno (em São Paulo), acho que é Michel Temer mais um"
Hoje, o senhor tem 1%. Se José Serra (candidato do PSDB) e a prefeita Marta Suplicy forem para o segundo turno, quem o PMDB apoiaria?
Eu nem falo nessa hipótese. Há meses atrás, a Marta era imbatível. Há dois meses atrás, o Paulo Maluf era imbatível. Hoje, o Serra é imbatível. E nós temos ainda quatros meses para as eleições. Vai haver muita modificação até lá. Eu prefiro não fazer nenhum comentário sobre o segundo turno. Sobre segundo turno, somente vou falar no segundo turno.
O senhor é presidente do PMDB, que faz parte da base aliada, e candidato a prefeito de São Paulo. Não vai ser difícil fazer uma campanha sem se referir ao governo federal?
Nem um pouquinho. Você sabe que isso é uma concepção equivocada. A idéia que as pessoas tem é a seguinte: se há uma coalizão governamental, os partidos que apóiam o governo para permitir a governabilidade perderiam inteiramente a sua identidade, jamais poderiam disputar eleições e só o partido que está no governo poderia ser cabeça de chapa. Isso é um equívoco até da cultura política nacional. Quando nós fizemos o acordo aqui, eu deixei muito claro ao presidente Lula e a todos os membros do governo que a aliança era uma aliança parlamentar, que não teria nada a ver com as alianças eleitorais.
"Quando nós fizemos o acordo aqui (do PMDB com o governo), eu deixei muito claro ao presidente Lula que a aliança era parlamentar, que não teria nada a ver com as alianças eleitorais"
Toda semana vêm a publico diferenças gritantes entre integrantes do governo Lula, esquecendo-se do velho ditado que roupa suja se lava em casa. Como o senhor avalia isso?
Eu acho que cabe ao governo evitar que aconteça um caso por semana.
Faltaria coordenação interna?
Eu não saberia dizer. Eu não participo da intimidade do governo. Se está estourando um fato por semana, o governo é que precisa harmonizar-se internamente. Se há uma desarmonia interna, eu não saberia nem como identificá-la nem como solucioná-la.
Supondo que o governo Lula melhore o desempenho nos próximos anos, com crescimento econômico, o PMDB vai reivindicar ser vice na chapa do presidente candidato à reeleição?
Não, o PMDB vai reivindicar e tem direito de ter candidatura própria.
Mas, nesse caso, teria que sair da base aliada?
Claro, num dado momento… Até por uma questão ética, se num dado momento, o PMDB resolver, como tem resolvido, ter candidato próprio, num prazo muito antecedente, o PMDB tem que sair do governo. Só se manteria no governo caso houvesse um acordo político entre os dois partidos (PT e PMDB). Fora daí, o PMDB teria que sair do governo.
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