Renata Camargo
Uma decisão sobre a tramitação de medidas provisórias tomada no dia 9 de junho pelo presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), impede a aprovação de emendas sem relação com o texto original enviado pelo governo. Editada antes da nova regra, a MP 462 se transformou na última oportunidade de os deputados tentarem aprovar itens que nada têm a ver com o objetivo inicial da proposta. No Congresso, a antiga prática ficou conhecida como “contrabando” ou “jabuti”.
A MP 462 dispõe sobre a prestação de apoio financeiro da União aos municípios. Prevê a transferência de R$ 1 bilhão ao Fundo de Participação dos Municípios e aumenta de R$ 1 bilhão para 5 bilhões o valor que a União poderá aplicar no Fundo de Garantia para Construção Naval.
Os deputados aproveitaram bem a última chance de pegar carona nas medidas provisórias. Uma emenda apresentada à MP 462 dispensa o licenciamento ambiental para obras como a BR 319, rodovia federal que liga Manaus a Porto Velho, considerada uma das prioridades do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A proposta acirra a briga dos ambientalistas com o governo federal.
Esta mesma emenda, que já havia sido feita na MP que criava o Fundo Soberano, foi enxertada na MP 462 pelo relator, o líder do PR, deputado Sandro Mabel (GO), que incluiu o item no texto final. Mabel pertence ao mesmo partido do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, que tem interesse em facilitar o licenciamento de rodovias.
Na primeira tentativa, a intenção de facilitar o licenciamento da BR 319 provocou uma crise interna no governo, envolvendo o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e o ministro dos Transportes. O governo pressiona para que as obras nessas rodovias sejam entregues antes do fim do mandato, mas o ministro do Meio Ambiente se recusa a conceder a licença caso as exigências ambientais não sejam cumpridas. Em resposta, a ala desenvolvimentista do governo pressiona por alternativas para minimizar essas condicionantes ambientais.
No parecer final, que deve ser divulgado nesta sexta-feira (3), Mabel incluiu 26 itens, além dos 10 que constavam no texto original enviado pelo Executivo ao Congresso.
Impasse
Um dos mais polêmicos, o artigo que dispensa licitações introduzido na MP 462 já havia sido incluído na MP 452. Essa medida, no entanto, perdeu a validade, o que trouxe a necessidade de uma nova tentativa de aprovação dessa proposta pelo Congresso.
O novo artigo incluído pelo relator dispensa o estudo de impacto ambiental (EIA) e o relatório de impacto ambiental (RIMA) de obras rodoviárias federais de pavimentação, melhoramento, adequação e ampliação de capacidade. Na prática, o artigo dispensa o licenciamento ambiental e considera que essas obras em rodovias são de pouco impacto ambiental.
O texto modificado por Mabel estabelece prazos para emissão das licenças ambientais. De acordo com o artigo, licenças prévias e de instalação – autorizações ambientais concedidas na fase preliminar do planejamento do empreendimento, que permitem a retirada da vegetação para a execução da obra – devem ser dadas em 90 dias. Enquanto as licenças de operação – que autoriza a operação da atividade ou empreendimento – têm 60 dias para serem concedidas.
“Essa emenda é absurda. Não tem nada a ver com o assunto da MP e favorece o desmatamento. Esse artigo é encomendado para beneficiar obras do governo, é encomendado para beneficiar a BR 319, sem dúvida. Acho um absurdo fazer essa rodovia. Nessa área da Amazônia, deveria ser uma ferrovia”, disse ao site o líder do PV, Sarney Filho (MA).
Carona
Entre as emendas enxertadas no Congresso, está a redução a zero das alíquotas do Imposto de Exportação e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para certos tipos de armas e munições, mudanças na lei que autoriza o uso do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) na compra de imóvel residencial e a possibilidade de que empresas se tornem fundações.
Outras emendas “contrabando” foram apresentadas, porém descartadas pelo relator. Entre elas, duas emendas da deputada Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) que beneficiam empresas com sede na Zona Franca de Manaus e outra, da mesma deputada, que favorece os produtores de fibras de juta e malva.
Também foi apresentada uma emenda do deputado William Woo (PSDB-SP), para instituir o número único de Registro de Identidade Civil e o Cadastro Nacional de Registro de Identificação Civil. O deputado Vírgilio Guimarães (PT-MG) também tentou pegar carona na MP e apresentou emenda para reajuste de aposentadorias, sob a justificativa de que beneficiar os aposentados é tão relevante quanto repor as perdas dos municípios.
A MP, que já tranca a pauta no plenário da Câmara, é o primeiro item de votação da próxima semana. O Congresso em Foco procurou o deputado Sandro Mabel para saber as justificativas em relação ao seu parecer. O parlamentar, no entanto, não retornou ao site.
Contrabando
A assessoria da Presidência da Câmara explica que a proibição de emendas de “contrabando” não vale para a MP 462 porque ela já estava tramitando e a decisão não é retroativa.
As novas regras começam a valer a partir da MP 464, que, segundo o secretário-geral da Mesa na Câmara, Mozart Viana, já teve quatro emendas “contrabando” descartadas.
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