Na última entrevista antes da prisão, Dirceu aprova estratégia do PT: “Está tudo arrumadinho”
José Dirceu era a imagem da resignação ao conversar com a reportagem do Congresso em Foco poucos dias antes de sua prisão definitiva, decretada ontem (quinta, 17). Sabia que dali a alguns dias – diante do esgotamento de recursos, da confirmação de sentença e da ordem de execução de sua pena após condenação em segunda instância no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (Porto Alegre) – voltaria ao cárcere para longos anos de prisão. Mas, estrategista máximo do PT dentro ou fora da cadeia, Dirceu volta para prisão com o mapa político das eleições 2018 na cabeça. Um retorno esperado do qual seu pensamento quis fugir todos os dias até hoje. Do lado de fora, Dirceu leu muitas notícias e fez diversas reuniões que o levaram à seguinte conclusão a respeito da corrida presidencial de 2018: “A esquerda está certinha”.
O que Dirceu quis dizer não tem relação com a conduta de seu partido ou diz respeito às denúncias do mensalão ou da Operação Lava Jato. Entre o certo e errado, o ex-ministro da Casa Civil se refere à estratégia política em um cenário com o ex-presidente Lula condenado e preso na Lava Jato, mas líder das intenções de voto. “Do nosso lado, está tudo arrumadinho. [Guilherme] Boulos é candidato [do Psol]. Manuela [D'Ávila, do PCdoB] é candidata. Ciro [Gomes, do PDT] é candidato. Joaquim Barbosa, eu não sei o que vai acontecer, mas está no PSB, que em parte é do nosso campo”, vislumbrou o ex-cacique petista, que tem até as 17h desta sexta-feira (18) para se apresentar à Polícia Federal em Brasília.
Dirceu não sabia, mas cogitava, que o ex-ministro desistiria de concorrer à sucessão do presidente Michel Temer, em um banho de água fria nos 10% de eleitores que, segundo o Instituto Datafolha, nele votariam. Ao diagnosticar a estratégia eleitoral do PT e seu entorno como correta, o petista dava mais uma pincelada sobre o que vinha repetindo a todos os que buscaram suas opiniões no período em que passou fora da cadeia.
Nessa lógica de arranjos eleitorais, até mesmo o ex-ministro e relator do mensalão, Joaquim Barbosa, crítico ferrenho do PT, tem sido visto como alguém mais perto da esquerda do que qualquer outro candidato do centro ou da direita. O ex-magistrado se filiou a um partido em crise, mas que historicamente caminhou ao lado do PT e dos ideais de esquerda e que tenta viabilizar sua candidatura. Joaquim se diz um “social democrata”, mas sem qualquer identidade com a social democracia do atual PSDB, e Dirceu sabe disso.
A conversa transcorreu na tarde de uma dessas quartas-feiras de intensa movimentação no Congresso, em uma casa no Lago Sul, bairro valorizado de Brasília. Ao som do cubano Buena Vista Social Club e cercado por uma estrutura que lhe permite acesso ao mundo, Dirceu reitera o discurso petista: não há plano B, não há alternativa de nome se Lula não for candidato. Mas vai além, e pontua o prazo em que essa estratégia pode mudar.
Nesse sentido, faz apostas altas. “O PT tem que ficar parado. Temos o candidato que ganha em primeiro e segundo turno com 40% dos votos. Pra que nós vamos nos mexer? Os outros é que estão todos desesperados, batendo cabeça, se afogando”, disse, com o característico sotaque mineiro carregado.
O processo
“Vivi clandestino quase 15 anos da minha vida”, recorda-se, ao lembrar do período em que foi preso, deportado e exilado em meio à ditadura militar (1964-1985). Em um dos períodos mais sombrios da recente história brasileira, em setembro de 1969, foi deportado para o México com mais 14 presos políticos, como contrapartida pela libertação do embaixador norte-americano Charles Burke Elbrick, sequestrado naquele ano pela guerrilha armada antirregime.
Dirceu dá adeus à liberdade, mais uma vez, rumo ao cárcere