|
Ao confirmar ontem no Conselho de Ética todas as denúncias feitas em depoimento ao jornal Folha de S. Paulo na semana passada, o presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), aumentou o arsenal da oposição contra o governo. Durante quase sete horas, Jefferson não fez grandes revelações, mas ampliou o leque de problemas do Planalto e do PT ao contar detalhes que comprometem o ministro da Casa Civil, José Dirceu, e outros integrantes da cúpula petista, no suposto esquema de pagamento de mesada a deputados em troca de apoio no Congresso. O petebista, porém, preservou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não teria conhecimento do chamado “mensalão”. "Dirceu, se você não sair daí (Casa Civil) rápido, você vai fazer réu um homem inocente, que é o presidente Lula. Sai daí rápido para você não fazer mal a um homem que eu tenho orgulho de ter apertado a mão", provocou. Publicidade
Leia também Publicidade
O depoimento de Jefferson parou o Congresso e parte do país. O momento mais tenso ocorreu quando o presidente do PTB acusou seis lideranças do PL e do PP de receberem dinheiro para votar com o governo: os deputados José Janene (PP-PR), Pedro Henry (PP-MS), Pedro Corrêa (PP-PE), Valdemar Costa Neto (PL-SP), Carlos (Bispo) Rodrigues (PL-RJ) e Sandro Mabel (PL-GO). Apesar de dizer que não possui provas sobre as acusações, Jefferson foi minucioso ao fornecer detalhes sobre supostos encontros e diálogos. "Sou uma testemunha", disse. O deputado abriu mão de seus sigilos fiscal, bancário e telefônico, negou envolvimento com o caso de corrupção nos Correios e afirmou que não está preocupado com a eventual cassação. PublicidadeO presidente do PTB voltou sua artilharia contra o que ele chamou de “cabeça do PT”: o presidente do partido, José Genoino, o tesoureiro, Delúbio Soares, e o secretário-geral, Sílvio Pereira, além de Dirceu. O deputado chegou a se incriminar ao descrever como o seu partido teria recebido dinheiro ilegalmente do PT. Ele admitiu que não declarou à Justiça Eleitoral, conforme exige a lei, o recebimento de R$ 4 milhões de suposta contribuição feita pelos petistas. O dinheiro teria sido entregue em notas de R$ 50 e R$ 100, com etiquetas do Banco Rural e do Banco do Brasil, pelo publicitário mineiro Marcos Valério de Souza. A cifra combinada, no entanto, seria de R$ 20 milhões. “Fui ao Zé Dirceu pedir para ele ajudar a liberar o resto do dinheiro. Ele me disse: ‘Não dá, a Polícia Federal é tucana, meteram na cadeia 60 doleiros que internalizavam o dinheiro’”, disse. O petebista também se comprometeu ao admitir que pediu dinheiro ao ex-presidente do Instituto Brasileiro de Resseguros (IRB), Lídio Duarte, para o PTB. “Seria uma contribuição de brokers, de seguradoras que operam com o IRB aos cofres do PTB”, contou Jefferson. Acusado de comandar um esquema de corrupção nos Correios, Jefferson se disse vítima de perseguição do governo e de setores da imprensa. Segundo ele, a Polícia Federal não está investigando o principal foco de irregularidade na estatal, a diretoria de Tecnologia, cuja nomeação teria sido feita pelo secretário-geral do PT, Sílvio Pereira. Leia os principais trechos do depoimento de Roberto Jefferson ao Conselho de Ética da Câmara: José Dirceu "Dirceu, se você não sair daí (Casa Civil) rápido, você vai fazer réu um homem inocente, que é o presidente Lula. Sai daí rápido para você não fazer mal a um homem que eu tenho orgulho de ter apertado a mão." “Fui ao Zé Dirceu pedir para ele ajudar a liberar o resto do dinheiro (supostamente prometido pelo PT para financiar campanha eleitoral do PTB). Ele me disse: ‘Não dá, a Polícia Federal é tucana, meteram na cadeia 60 doleiros que internalizavam (traziam para cá) o dinheiro.’” “Disse a ele (Dirceu): ‘Você tem como me ajudar na Veja? Ele disse: ‘Não, a Veja é tucana’. Disse a ele: Tem como me ajudar no Globo? Ele falou ‘esse eu tenho, por cima, eu seguro’. E não segurou.” “O PTB não é responsável pela corrupção nos Correios, não é, Sílvio Pereira?! Não é, Zé Dirceu?!” “Depois entendi por que a gente sempre esbarrava no Zé Dirceu, o Rasputin.” "Tudo o que eu disse aqui é de conhecimento do ministro José Dirceu. Tudo!" (afirmou ao final do depoimento) Lula “A reação do presidente foi como uma facada nas costas. As lágrimas desceram dos olhos dele. Ele levantou, me deu um abraço e foi embora. E sei que de lá para cá secou porque os passarinhos estão todos com o biquinho aberto. E as coisas (votações) pararam aqui nessa Casa, é síndrome de abstinência.” “O presidente Lula é inocente nisso, a reação é a reação do traído." "Vi um homem honrado se desfazer diante de uma cinta que fizeram em torno dele." “O presidente Fernando Henrique ouviu falar de miséria lendo ‘Vidas Secas’, de Graciliano Ramos. Collor, lendo os versos de Catulo da Paixão Cearense. Mas Lula, não. Ele sabe o que é a miséria, o desemprego. É um homem simples.” “Lula é igual ao povo. Gente igual ao Brasil. Pobrezinho, retirante do Nordeste, passou fome, sabe o que é desemprego, pau-de-arara… Viveu concretamente o que os outros ouviram dizer.” Mensalão "Tenho 23 anos como deputado. Jamais vi um partido do governo pagar mesada a deputados para que apóiem o governo. Nem mesmo no governo do presidente escorraçado. Mas desde agosto de 2003 é voz corrente até nos banheiros da Câmara que o doutor Delúbio, com o conhecimento do senhor Genoino, repassava dinheiro para deputados, sim." “Chegou lá (na sede do PTB em Brasília) um homem simples, fumando um charuto, com aquele jeitão de goiano do interior e disse: eu gostaria de ajudar a desencravar uma unha de algum companheiro aí que esteja precisando. Eu disse: Delúbio, obrigado. Eu quero participar da formulação do governo, mas mensalão eu não quero não!” Quem receberia o “mensalão” "Não são todos os deputados que recebem mensalão. Tem muita gente do PP que está acima disso, tem muita gente do PL que está acima disso. Mas, deputado Valdemar Costa Neto, deputado José Janene, Pedro Corrêa, Sandro Mabel, Bispo Rodrigues, Pedro Henry, me perdoem, de coração, não posso ser cúmplice de vocês". De onde viria o dinheiro “O senhor tem que perguntar ao Genoino e ao Delúbio. Pelo que ouvi do Marcos Valério, ele faz via agência de publicidade nos contratos que têm. Penso que é dessa relação de empresas privadas com o governo. Não há nenhum partido que não o faça e o de Vossa Excelência também. Não aluguei meu partido. Mas temos a hipocrisia de não confessar isso ao Brasil. Que o dinheiro vem de empresários que mantêm relações com as empresas públicas. Esse dinheiro contaminou o PT. Mas não há quem não o faça”, em resposta ao relator, Jairo Carneiro (PFL-BA). Acordo financeiro com o PT “Aprovaram os R$ 20 milhões para as campanhas do PTB em todo Brasil. Mas só cumpriram a primeira parcela em julho, R$ 4 milhões. O dinheiro foi levado ao partido pelo senhor Marcos Valério, quando estive com ele pela primeira vez, carequinha, falante, fala em dinheiro como se caísse do céu." "Primeiro, R$ 2,2 milhões, duas malas enormes com notas de R$ 50 e R$ 100 etiquetadas: Banco Rural e Banco do Brasil. Três dias depois, ou cinco, uma semana, ele volta com R$ 1,8 milhão. E a promessa de outras quatro parcelas iguais." “Todos aqui sabem de onde vem o dinheiro para as campanhas dos partidos. Vem das empresas. É assim e sempre foi. Todo mundo sabe aqui. Precisamos abrir aqui no Conselho de Ética para que todo o Brasil saiba.” José Genoino "Perguntei: Genoino, como é que a gente vai fazer para justificar esse dinheiro? Ele disse no final a gente dá a entrada via partido e a saída como contribuição do PT, mas até hoje essas notas não chegaram, os recibos não chegaram. Isso gerou uma crise brutal no meu partido", afirmou o petebista. Por que não declarou o dinheiro à Justiça Eleitoral “Recebi a doação como cidadão Roberto Jefferson, não como presidente do PTB. Não quero envolver meu partido, não posso envolver meu partido. Quero prestar conta como o cidadão Roberto Jefferson.” O sapo e o escorpião "Essa gente (PT) não é leal, nos usa como o sapo para atravessar o rio e sempre nos dão uma picadinha aqui e ali. Isso pode nos levar ao fundo do rio, mas levaremos junto esses escorpiões da cúpula do PT." “A bancada do PT está fora disso. Ninguém recebeu mensalão.” Dando nome aos acusados “Sei que não são todos que recebem o mensalão. Tem muita gente do PP que está muito acima disto, como tem muita gente do PL que está muito acima disto. Mas os deputados Valdemar Costa Neto, José Janene, Pedro Corrêa, Sandro Mabel, Pedro Henry e Bispo Rodrigues que me perdoem. Me perdoem de coração. Eu não posso ser cúmplice disso” Jefferson x Mabel Mabel: “O nobre deputado faz teatro. Não vou aceitar. Vossa Excelência deveria ganhar o Oscar da mentira.” Jefferson: “Eu não fui acusado por nenhum deputado de ter feito proposta de luvas de R$ 1 milhão. Já sublimei este mandato. Vossa Excelência é mentiroso.” Mabel: “Em 14 de outubro de 2004, Vossa Excelência fez um jantar para o presidente, de quatro horas. Não teve um tempinho para falar com ele a sós?" Jefferson: “Vossa Excelência não nomeia para estatais sem contrapartida para o partido. Vamos abrir… Por que nomear para o Departamento Nacional de Trânsito (Dnit), para a Vale do Rio Doce (Valec)? Só que eu, olhando nos olhos do Brasil, admito. O modelo está certo? Vamos ter que discutir os critérios de nomeação.” Mabel: “Se o senhor é macho para contar mentira, eu sou macho para contar a verdade.” Jefferson: "Não é a mim que a deputada Raquel (Teixeira) acusa. Mas a CPI vem aí.” Jefferson x Valdemar Valdemar: “Nós no PL só temos bons deputados. Diga o nome de quem recebe (o "mensalão”). Caso o PL tenha parlamentares envolvidos, quero que o senhor dê o nome, para nós investigarmos" Jefferson: "Eu afirmo que Vossa Excelência recebe. Vossa Excelência recebe". Valdemar: "Eu sabia que o senhor viria aqui hoje só para desmoralizar esta Casa." Jefferson: “Respeito os gostos de Vossa Excelência, que é conhecido como um mulherengo e jogador” Valdemar: "Melhor gostar de mulher do que de um cidadão de Cabo Frio Por que demorou 17 meses para fazer a denúncia "Porque me senti acuado. Porque vi a Casa Civil e a Agência Brasileira de Inteligência empenhados em jogar no colo do PTB a corrupção nos Correios. Saí em defesa do meu partido e da minha honra." "O deputado Pedro Henry (líder do PL na Câmara) tentou tirar dois deputados do PTB. Eu mandei avisar a ele: Se continuar tentando, eu vou à tribuna denunciar." Em nome da “honra” "Não sou melhor do que ninguém. Mas também não sou pior. Sou igual a qualquer um de vocês. Faço tudo isso para lavar minha honra e a honra do PTB. Estou tentando reconstruir minha imagem". Dinheiro público para os partidos “Não há nenhum partido que não o faça e o de Vossa Excelência (Sandro Mabel, do PL) também. Não aluguei meu partido. Mas temos a hipocrisia de não confessar isso ao Brasil. Que o dinheiro vem de empresários que mantêm relações com as empresas públicas. Esse dinheiro contaminou o PT. Mas não há quem não o faça.” Risco de cassação “Sublimei o mandato, passei dele, não vou lutar por ele. Tenho um objetivo maior. Quero lavar a minha honra, a honra de meu partido.” Abin "Quero deixar claro isso aqui, minha convicção plena de que a montagem (a gravação em que o ex-funcionário dos Correios Maurício Marinho pede propina em nome do PTB) foi feita pela Abin.” Corrupção “Tão zelosos, tão ciosos e não investigaram o correio aéreo noturno do doutor Silvinho (o secretário-geral do PT, Sílvio Pereira). Um superfaturamento de 300%, um contrato milionário e continuam atrás do Marinho (ex-assessor dos Correios flagrado recebendo propina) por causa de R$ 3 mil reais.” “Tem muita gente boa dos Correios me procurando, da Sky Master, da Novadata, da Vale do Rio Doce, do Dnit, lá do PL.” Imprensa "Quando me senti isolado, no dia 6, com aquela matéria covarde do ‘diário oficial’ que é ‘O Globo’, ‘diário oficial’ do governo, como diz o Zé Dirceu: ‘Esse eu controlo’, e quando me senti atingido pela revista que acompanha o ‘diário oficial’, a revista ‘Época’, que expõe a mãe dos meus filhos, avó dos meus netos de baby doll, e abre a porta do meu banheiro e me coloca sentado na privada, numa matéria desconstrutiva da minha imagem, eu falei aos meus companheiros de partido: o governo vai botar o cadáver no colo do PTB, olha a imprensa oficial como está vindo." |