Na principal revelação de um depoimento considerado “frustrante” pelos parlamentares, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares admitiu ontem, em depoimento à CPI do Mensalão, que usou dinheiro de caixa dois – chamado por ele, insistentemente, de “dinheiro não contabilizado” – para quitar dívidas da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, em 2002.
Márcio Lacerda, ex-secretário executivo de Ciro Gomes no Ministério da Integração Nacional, retirou R$ 457 mil de uma conta da agência de publicidade SMP&B, de propriedade do empresário Marcos Valério – acusado de ser o principal operador do mensalão. Delúbio confirmou a versão de Lacerda de que o saque foi feito para pagar gastos com a gravação de mensagens de apoio de Ciro a Lula, no segundo turno das eleições presidenciais. Em vários momentos do depoimento, Delúbio se contradisse, afirmando que a campanha de Lula não recebeu dinheiro “por fora”.
As respostas do ex-tesoureiro fizeram com que se reforçasse a suspeita de que o ex-ministro da Casa Civil e deputado José Dirceu (PT-SP) tinha conhecimento dos empréstimos feitos por Valério ao partido. Questionado por senadores petistas se membros da Executiva do PT sabiam da procedência dos recursos da campanha eleitoral de 2002, Delúbio afirmou que as decisões eram tomadas por um comitê financeiro, do qual Dirceu também fazia parte.
Leia também
O ex-tesoureiro foi enigmático ao responder se havia traído Lula e o partido. “Sou uma pessoa fiel e quero dizer uma coisa à CPI: não costumo delatar ninguém e nem questionar a opinião das pessoas. Não me sinto traidor, não incorporo isso”, afirmou, deixando no ar a dúvida se estaria preservando alguém de responsabilidade.
O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu não quis comentar a afirmação do ex-tesoureiro. Por intermédio de sua assessoria, Dirceu afirmou que cabe ao presidente Lula dizer quem é "o traidor" ao qual se referiu no discurso da última sexta-feira, 12. Em pronunciamento transmitido pela TV, Lula pediu desculpas ao país sobre as denúncias de corrupção envolvendo o PT e se disse traído, mas não declinou nomes.
Durante o depoimento, Delúbio voltou a assumir responsabilidade exclusiva pela constituição do “caixa dois” do PT. Confirmou, também, a informação do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, de que houve um acordo financeiro entre ambos os partidos para a coligação eleitoral na campanha de 2002. Ele corroborou a versão de Valdemar de que houve uma reunião entre os dois partidos para definir qual o valor a ser pago ao PL para compensar as perdas causadas pela verticalização (pela legislação eleitoral, em todos os estados, o PL só poderia se coligar com o PT, algo que prejudicou severamente o partido). Assim, o PT decidiu repassar R$ 10 milhões, o que corresponde a 25% do valor total da arrecadação da campanha presidencial, ao Partido Liberal.
PublicidadeO ex-tesoureiro também envolveu mais uma vez o PTB, assegurando que o partido foi contemplado pelo esquema de empréstimos montado para quitar dívidas do PT e de partidos aliados. Ele não confirmou, no entanto, a informação de que teria repassado R$ 4 milhões ao PTB. Ao ser questionado pelo relator da CPI, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), sobre qual seria o valor exato da transação financeira, ele se esquivou, dizendo que somente as investigações lhe permitirão conhecer esses números.
Delúbio voltou a negar a existência do chamado mensalão. "O PT nunca comprou deputado ou deu dinheiro a parlamentar para votar em projeto A ou B." E ressaltou que não houve utilização de dinheiro público nas campanhas eleitorais do partido. O ex-tesoureiro declarou que não tinha conhecimento de que o publicitário Duda Mendonça havia aberto uma conta e uma empresa num paraíso fiscal para receber pelos trabalhos prestados ao PT em 2002. “Como foi feito entre o Marcos Valério e o Duda, não tenho nenhuma responsabilidade em relação a isso.” “O PT não tem dinheiro no exterior”, completou.
A reunião teve de ser suspensa por alguns minutos pelo presidente da CPI, senador Amir Lando (PMDB-RO). Um tumulto envolveu parlamentares que protestavam e falavam ao mesmo tempo, pedindo ao PT pedisse desculpas ao país. Lando ainda tentou convencer Delúbio a dar respostas mais firmes. Assegurou que, embora o depoente estivesse sem a proteção de um habeas-corpus, não corria risco de ser preso na comissão.
Duda perde conta do governo
A Presidência da República decidiu não renovar o contrato que possui com o publicitário Duda Mendonça. O contrato venceu ontem, e o governo optou por não prorrogá-lo, a fim de desvencilhar por completo o governo federal de qualquer relação com o publicitário. Duda Mendonça depôs na quinta-feira, 11, à CPI dos Correios. Seu depoimento, feito para tentar se livrar de acusações, deixou o Planalto em situação delicada, ao afirmar que recebeu dinheiro da campanha de 2002 em paraíso fiscal. Apesar do contrato com Duda Mendonça integrar um pacote com três empresas, totalizando R$ 131,8 milhões, o Planalto só renovou com as outras duas agências – Matisse e Lew Lara –, excluindo a Duda Mendonça & Associados, que prestava serviços ao governo Lula
Deixe um comentário