Por um ano e dez meses, o jornalista Cláudio Humberto Rosa e Silva foi porta-voz de um dos mais controversos governos do país. Eleito em 1989 com 4 milhões de votos de vantagem sobre Luiz Inácio Lula da Silva, o seu adversário no segundo turno, Fernando Affonso Collor de Mello se inseriu nas páginas da história aos 40 anos de idade como o mais jovem presidente da República Federativa do Brasil. Menos de três anos depois, ganharia um capítulo à parte ao renunciar ao mandato para escapar da cassação, em meio a uma série de denúncias de corrupção que resultaram numa inédita abertura de processo de impeachment.
A crise que levaria à renúncia de Collor, eleito pelo inexpressivo Partido da Reconstrução Nacional (PRN), foi detonada por uma entrevista concedida pelo próprio irmão, Pedro Collor, à revista Veja, em maio de 1992. Nela, Pedro acusava o tesoureiro da campanha presidencial, o empresário Paulo César Farias, de comandar um esquema de corrupção, cobrança de propina dentro do governo e tráfico de influência. Tudo, segundo Pedro, com a cumplicidade do presidente, apontado como um dos principais beneficiários do chamado esquema PC.
Na época, Cláudio Humberto já estava em Portugal, onde trabalhava como adido cultural da Embaixada do Brasil em Lisboa. “Não havia internet e não se sintonizava emissora de rádio e TV do Brasil em Portugal naquela época. Eu ficava muito feliz em não ler os jornais brasileiros”, conta o jornalista.
No meio das investigações, conduzidas por uma comissão parlamentar de inquérito (CPI), um ex-motorista (Francisco Eriberto França) e uma ex-secretária (Ana Accioly) de Collor confirmariam as denúncias contra o presidente. Os parlamentares descobriram que, em dois anos e meio de governo, o esquema PC teria movimentado recursos na ordem de US$ 260 milhões. Os valores apurados, segundo a comissão, representariam apenas 30% do dinheiro manipulado pelo tesoureiro. Pelo menos US$ 10,6 milhões teriam sido repassados para o custeio de despesas pessoais de Collor.
PC recebia dinheiro de empresários em troca de favores junto à máquina administrativa. Convertido em dólares, o montante era enviado a empresas fictícias em paraísos fiscais e voltava ao país por meio de contas fantasmas, abertas em diferentes bancos com nomes fictícios.
Pressão das ruas
Com o cerco das denúncias sobre o Palácio do Planalto, Collor viu a sua já reduzida base de apoio no Congresso tornar-se cada vez menor, à medida que crescia a pressão popular contra sua permanência no poder. Frases como “Fora Collor” e “Impeachment Já” ganharam as ruas durante manifestações de estudantes país afora naquele que seria batizado como o movimento dos “caras-pintadas”.
Por 441 votos favoráveis e 38 contrários, a Câmara autorizou, em setembro de 1992, a abertura do processo de impeachment. Afastado temporariamente do cargo e substituído pelo vice, Itamar Franco, Collor renunciaria ao mandato em dezembro daquele mesmo ano, na véspera do julgamento no Senado. Condenado por 76 votos a três por crime de responsabilidade pelos senadores, perdeu seus direitos políticos por oito anos. O ex-presidente foi indiciado no Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção passiva.
Collor absolvido
Dois anos depois, Collor foi absolvido da acusação por cinco votos a três no STF, mas continuou suspenso da vida pública até 2000, quando tentou, sem sucesso, chegar à prefeitura de São Paulo. Em 2002, colecionou outro fracasso eleitoral: o governo de Alagoas. Desde sua queda, há quase 13 anos, Collor tem como grande vitória política a eleição do filho James Fernando (PRTB), fruto de uma relação extraconjugal, para vereador em Rio Largo, em Maceió, no ano passado.
Eleito como “defensor dos descamisados” e “caçador de marajás” do funcionalismo público, Collor foi responsável por um dos planos econômicos mais desastrososos da história do Brasil, que resultou no confisco do dinheiro depositado em banco de pessoas físicas e jurídicas. A medida era a “bala” com a qual ele prometera matar, com um só tiro, o “tigre da inflação”.
Embora tenha, no primeiro momento, reduzido a inflação, o plano Collor aumentou o desemprego, quebrou empresas e famílias e mergulhou o país na pior recessão de que se tem conhecimento. Também diminuiu o tamanho do Estado, ao promover as primeiras privatizações e extinguir estatais, e abriu o mercado brasileiro às importações.
Aos 55 anos de idade, Collor administra hoje as Organizações Arnon de Mello, o principal grupo de comunicação de Alagoas, e prepara o livro “Crônica de um Golpe”, no qual promete dar a sua versão sobre a sua escalada e queda política em Brasília.