Na década de 80, o cantor, compositor e multi-instrumentista João Donato deu um corpo musical meio samba meia bossa nova a uma letra de Martinho da Vila. O conjunto formou a canção “Gaiolas Abertas”. A letra era dedicada a uma das filhas de Martinho da Vila, que crescia e se tornava adulta. “Voa, voa passarinha, voa”, dizia a letra. “Tu não estás presa mais”, continuava. Martinho, o pai preocupado, alertava que “há perigos lá fora, visgos e pedras mortais”. Mas concluía, feliz: “Pra ser livre, valem os riscos”. Na próxima segunda-feira (7), Brasília poderá assistir ao encontro de João Donato com uma das filhas de Martinho da Vila, a cantora Maíra Freitas. O show de João Donato, um dos pais da bossa-nova, e do “novo talento”, como Donato define, Maíra Freitas, será a “cereja do bolo” na festa de entrega do Prêmio Congresso em Foco 2011.
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João Donato de Oliveira Neto é considerado por muitos o verdadeiro fundador da bossa-nova. Basta dizer que, para críticos musicais e especialistas no assunto, um dos seus companheiros de violão, um tal de João Gilberto, despejou em “Chega de saudade” a inspiração bebida nos acordes do acreano nascido em 1934. De Donato, João Gilberto gravou, entre outras canções, “Rã”. João Donato é parceiro de grandes nomes da música popular brasileira, como Tom Jobim (“Quando a lembrança me vem”, entre muitas outras) e Gilberto Gil (com quem compôs a magistral “A Paz”). Na festa do Prêmio Congresso em Foco, ele repetirá um show realizado uma única vez, no Rio de Janeiro, com Maíra Freitas, filha de Martinho, irmã de Mart’nalia, que inicia a sua carreira como cantora.
“É um amor de menina”, desmancha-se João Donato. O compositor, que se apresentará ao piano reforçado pela delicadeza da voz de Maíra, garantiu que o público terá “coisa muito boa” no Porto Vitória, casa de eventos localizada à beira do Lago Paranoá, em Brasília. Para tanto, Donato diz confiar no entrosamento e na qualidade do “time” de músicos escalados para o espetáculo.
“Nós já estamos trabalhando há três meses juntos. Ela já está acostumada ao meu repertório, eu já estou acostumado ao repertório dela. Vai ser uma coisa muito boa”, disse Donato, que antecipou à reportagem algumas músicas que serão ouvidas no evento, embora o formato do show ainda não esteja definido. Estão devidamente ensaiadas, e prontas para o deleite dos fãs, o samba-afoxé “Emoriô” e as saborosas “Suco de Maracujá” e “Daquele amor nem me fale”, essas últimas parcerias com Martinho da Vila. Maíra apresentará “A rã”, na versão com a letra de Caetano Veloso que “ela [Maíra] “gosta de cantar”.
Veja aqui tiragostos do que será ouvido no show: João Donato canta “Suco de maracujá”:
E aqui, João Donato e Maíra Freitas:
Para Donato, a “química” com Maíra é facilitada pelo fato de ele trocar há muitos anos experiências musicais com o pai da cantora, Martinho da Vila. E também pela afinidade de ambos com o piano – Maíra tem formação de piano clássico. “Isso é hereditário. Ela é uma ótima pianista, e uma ótima cantora, muito talentosa”, elogia Donato.
Bossa nova
A importância de João Donato para a bossa nova está diretamente ligada ao Sinatra-Farney fã-clube, do qual ele foi um dos fundadores, ainda no final da década de 1940. O clube dedicava-se a idolatrar dois cantores, o americano Frank Sinatra e o brasileiro Dick Farney, que começavam a cantar de maneira menos alta, mais doce e melodiosa, sem os vozeirões exagerados dos antigos cantores de ópera. Ali começou o estilo mais sussurrado de cantar, também consagrado pelo cantor de jazz Chet Baker, que levou a João Gilberto e à bossa nova.
Donato diz que o show terá “consequências” musicais dessa época de nascimento da bossa nova. “Foi um momento de muita importância para nossa juventude. Crescemos juntos, e acreditando em um certo tipo de música que, até então, não se conhecia no Brasil”, diz João Donato sobre os tempos do Sinatra-Farney fã-clube. “Era uma coisa mais moderna, e que ia dar na bossa nova”, observa o compositor, acrescentando que, a partir daquela época, novos artistas, tendências e tecnologias surgiram, mas não foram capazes de desligá-lo de suas raízes acreanas. “Eu trago comigo todas as recordações dos meus tempos de juventude, ou até antes. Tem a infância da mata, da Floresta Amazônica…”
Harmonia com o prêmio
Criado no Rio de Janeiro, Donato diz que a “harmonia” entre ele, a carioca Maíra e a “cozinha” que os acompanha (violão, baixo, flauta e bateria) combinará com o propósito do prêmio – valorizar as boas práticas políticas e, por meio da transparência e da informação, incentivar a interação popular junto aos seus representantes no Parlamento.
Para Donato, os elementos de sua música, agregados às características de Maíra, tornam a ocasião “interessante” – música de qualidade a celebrar o que há de melhor na política brasileira. “A soma dos talentos, das inteligências, das qualidades acrescenta muito a todo mundo. A questão da política também, paralelamente à música. Tudo isso resulta em uma certa harmonia e faz com que a coisa cresça e ande pra frente”, observa, dosando humildade e generosidade em relação aos companheiros de palco.
Ao fazer menção à influência universal promovida por determinado tipo de música, Donato diz que a própria bossa nova sintetiza as potencialidades de interação artística entre países. “Quando a bossa nova surgiu, influenciou o mundo inteiro, e até hoje influencia. Você vê passagens da bossa até hoje em filmes, produções, em atuações de artistas estrangeiros. Tem tudo a ver com essa coisa da reciprocidade”, destacou o artista, cujas palavras podem ser expressadas neste vídeo abaixo, gravado em 1967, em que Sinatra e Jobim mostram ao mundo a que graus de bom gosto a música pode chegar.
Aprecie Sinatra e nosso maestro Jobim, num pot-pourri, com “Corcovado”, “Dance with Me”, “Água de Beber” e outras:
“A gente pegou as influências americanas e mundiais e devolveu pra eles [os americanos] em forma de bossa nova. E eles também adotaram a bossa como maneira de expressão deles, e isso acabou avançando pelo mundo inteiro. A cultura brasileira está difundida no mundo inteiro através da música”, analisa o precursor do gênero, sem qualquer traço de rancor em relação aos ditames da indústria cultural, votada para a massa e guiada, no caso da música, por moldes radiofônicos e publicitários. Ao contrário, ele diz compreender o processo de “comercialização” da obra musical.
“Usam a música como produto de mercado, como sabão, bolacha, biscoito, refrigerante. Fazem muita música, de propósito, para dar resultado comercial, e aí a música sempre perde um pouco. Mas é um problema do mundo inteiro, que é voltado para o consumo. A indústria é muito forte, e se ela quiser fazer propaganda de um produto, ele vende. Eles tocam uma determinada música várias vezes durante o dia, e ela acaba se tornando popular. Você não tem controle sobre: você liga o rádio, está tocando uma música; sintoniza outra rádio, está lá a mesma música… então ela se torna sucesso, entre aspas. Tudo o que é vendável é aceito”, emenda o artista, autodidata em acordeão e cavaquinho.
Piano, acordeão, cavaco
“Eu estudava numa escola pública de Rio Branco [capital do Acre] e, de vez em quando, o pessoal me via assobiando, batendo na panela e tocando flautinha de lata. Um dia, aprendi uns acordes de cavaquinho. Depois, passei a tocar harmônica de ouvido e uma sanfona, que ganhei no Natal. Então, me arrumaram uma professora de música, mas eu faltava sempre às aulas”, relata Donato, que repetiu por quatro vezes o ginasial, o que o levou a desistir dos estudos, em 1949, e se dedicar exclusivamente à música, para sorte dos nossos ouvidos.
Para João Donato, o importante é que, em diversos cantos do país, a música de qualidade continua a ser produzida por “gente boa” – como a sua companheira de palco da próxima segunda-feira. “A vida continua, e existe sempre um dia depois do outro. A música vem se desenvolvendo no mundo inteiro. E o Brasil, como não poderia deixar de ser, é um país enorme onde a música tem um grande florescimento, uma grande exuberância, com diversas tendências”.
E aí, surgem os filhos dos grandes de outrora. Maria Rita, filha de Elis Regina, Daniel Jobim, neto de Tom Jobim. Dory, Danilo e Nana Caymmi, filhos de Dorival Caymmi. E por aí vai. “Todos eles [os filhos] são músicos hoje em dia. São como jogadores de futebol, que dão prosseguimento à obra dos pais. A música brasileira é uma das melhores músicas do mundo e sempre será”, finaliza. Que assim seja”.
João Donato evita falar de política, mas elogia o Prêmio Congresso em Foco. “É uma iniciativa muito saudável, gratificante e importante”, elogia. “É importante que exista isso na política do Brasil”, continua, citando a iniciativa de separar os bons dos maus políticos, de distinguir os que fazem a diferença. “Isso é vital no desenvolvimento geral de nosso país”, considera.
Parceiros
Na sua edição 2011, o Prêmio Congresso em Foco conta com o patrocínio da Ambev e da Petrobras.
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Apoiam o prêmio a Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), o Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários (Anffa Sindical), a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), a Associação dos Notários e Registradores do Brasil (Anoreg/BR), a Associação Nacional de Registradores de Pessoas Naturais (ArpenBrasil), a Federação Brasileira das Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite), e a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip). São parceiros do Prêmio Congresso em Foco o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal e a Agência Rádioweb.
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