Celso Murilo*
A era digital é marcada pela ausência de fronteiras e pela expansão tecnológica de maneira exponencial. A rede mundial de computadores torna mais fácil e mais democrático o acesso à informação, bem como sua circulação. O conhecimento e a informação tornaram-se veículos de alimentação nas relações sociais, políticas, jurídicas e econômicas. Representam fonte de riqueza do mercado, no modo de pensar e agir da civilização contemporânea.
A nova velocidade de disseminação das informações e criação de mecanismos tecnológicos deixam lacunas quanto ao direito à privacidade. A intimidade da vida privada sofre alterações profundas com tal desenvolvimento tecnológico. As novas formas de comunicação, expressão individual e integração social permitem a publicização de informações pessoais sem haver proximidade direta entre os usuários. As redes sociais, por sua vez, possibilitam uma exposição sem fronteiras.
Não obstante, viabilizar um “poder” aos cidadãos sobre as informações os torna igualmente vulneráveis às sérias ameaças cibernéticas, enfraquece o direito fundamental de privacidade e, como consectário, os direitos da personalidade.
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Em razão das ameaças cibernéticas aos direitos de privacidade, busca-se uma maneira de proteger os dados pessoais, compreendidos como direito da personalidade que permitem ao indivíduo a autodeterminação de suas informações pessoais, pois a natureza do bem protegido é “a própria personalidade a quem os dados se referem”.
Tal autodeterminação informativa, como direito da personalidade, tem status de Direito Fundamental, tornando-se necessária a ingerência do Estado com o objetivo de proteger esses direitos previstos na Constituição Federal de 1988.
PublicidadeEssa necessidade da ingerência do Estado consoante à proteção de direitos da personalidade que espelham direitos fundamentais, fomentou a criação da Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD, com período de vacância de 24 (vinte e quatro) meses previsto em lei. Mas em razão da pandemia, foi prorrogado por mais um ano, entrando em vigor a partir de 1º de agosto de 2021.
A referida lei objetiva proporcionar ao cidadão brasileiro maior controle sobre o tratamento de seus dados pessoais. São estabelecidos critérios e regras de coleta, armazenamento, tratamento e disponibilização de dados, tanto por organizações privadas quanto públicas, e há a criação de entidade reguladora específica para o tema.
São exemplos de dados pessoais considerados pela lei: nome, RG, CPF, gênero, data e local de nascimento, telefone, endereço residencial, retrato ou fotografia, prontuário de saúde, cartão bancário, renda, dentre outros previstos.
No que tange ao caráter punitivo ou sancionatório, a nova norma elenca medidas que transitam entre o aspecto socioeducativo até uma punição pecuniária bem elevada, podendo ser aplicada simples advertência até multas no valor de R$50 milhões. Possui previsão expressa sobre responsabilidade civil e administrativa do controlador ou operador e responsabilidade penal quanto a observância do sigilo de dados.
Na seara criminal, além do previsto na LGPD, outras medidas foram criadas, modificadas e endurecidas no ordenamento penal brasileiro, com o objetivo de reprimir crimes digitais e proteger dados dos usuários. Ou seja, quanto ao arcabouço penal que integra a LGPD, podemos afirmar que é complementado pelo Código Penal e a Lei nº 14.155/21 que tornou mais rigorosa a responsabilização para crimes de violação de dispositivo informático, furto e estelionato cometidos na rede mundial de computadores ou por meio de dispositivos eletrônicos.
Por fim, a LGPD encontra diversos desafios para concretizar seus objetivos. É um grande passo que o Brasil toma para preencher a lacuna normativa em relação ao direito fundamental de proteção de dados. A LGPD é um instrumento de busca de equilíbrio entre o desenvolvimento tecnológico e a atenção aos direitos fundamentais, impede diversas ilegalidades, reflete o cuidado que se deve ter com a dignidade da pessoa humana e seu direito nas dimensões materiais, informacionais, morais e até espirituais.
*Celso Murilo é defensor público e assessor especial da Defensoria Pública-Geral do Distrito Federal
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