João Pedro Casarotto*
É louvável o esforço do Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar equacionar a polêmica da regulamentação das perdas de arrecadação dos estados, como as dos créditos decorrentes de aquisições destinadas ao ativo permanente e as com exportações de produtos primários e semi-elaborados.
As perdas com as exportações tiveram origem na lei complementar federal 87/96 (Lei Kandir) e foram consolidadas na constituição federal pela emenda constitucional 42/2003, que introduziu o artigo 91 no ato das disposições adicionais transitórias prevendo a edição de lei para regulamentar a compensação destas perdas.
Com a omissão legislativa declarada, o STF viabilizou um acordo entre as partes para tentar encerrar a discussão político-jurídica que perdura há anos.
Porém, o acordo depende da promulgação de específica emenda constitucional, da edição de lei que recepcione este acordo e do sucesso do leilão de blocos de exploração de petróleo, ou seja, condições que devem ser cumpridas pelo Congresso Nacional e pela própria União.
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Aliás, o próprio acordo prevê a possibilidade de o STF ser novamente instado a se manifestar nos autos da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, diante de eventual descumprimento do prazo e das condições fixadas no julgamento.
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Assim, os estados e municípios ainda não podem considerar como certo o recebimento dos valores acordados, que, por sinal, não chegam a uma décima parte do total das perdas, uma vez que o acordo prevê o repasse de R$65,6 bilhões num período de dezessete anos enquanto que desde 1996 até o final de 2020 as perdas devem ultrapassar o montante de R$800 bilhões; somente no ano de 2018 as perdas dos estados chegaram, a preços de junho de 2019, a R$54 bilhões e este acordo somente se justificou pela situação de penúria em que se encontram os entes federados.
De qualquer modo, o ponto principal deste imbróglio federativo ainda não foi atacado, que é a necessidade de serem revogados os dispositivos causadores de uma das principais causas do enfraquecimento dos entes e que está levando a economia brasileira a uma lenta e contínua decadência.
Somente o retorno ao estabelecido pelo constituinte originário minimizaria a agonia dos serviços públicos e não as falsas soluções recorrentemente apresentadas como as de novas transferências compensatórias temporárias – que, além de instáveis, são fonte de permanente conflito político – e, tampouco, via aumento do endividamento, seja destes entes ou da própria União, que somente postergam, com altos custos, a solução do problema.
Portanto, urge a revogação dos créditos do ICMS sobre as aquisições de ativo permanente e de bens e consumo – pois a passagem do crédito físico para o crédito financeiro mostrou-se inviável – bem como a revogação da imunidade do ICMS para a exportação dos produtos primários e semi-elaborados, que se sustenta em alguns sofismas que precisam ser desconstruídos, como segue:
- não se exporta imposto, ora, a tributação visa reter estes produtos para que ocorra no país a instalação de uma cadeia produtiva com o objetivo de exportar produtos com maior valor agregado evitando a transferência de empregos e renda para outros países, bem como, visa enfrentar a lógica financeira do produtor de não se submeter aos custos da industrialização;
- o custo do ICMS é um fator de perda de competitividade do preço destes produtos, ora, o preço internacional destes produtos é regulado pelos mercados e não pelo seu custo, como, aliás, tem-se verificado com as exportações brasileiras de minério de ferro;
- estas exportações trouxeram ganhos para arrecadação dos estados, ora, a expansão da arrecadação verificada no início dos anos 2000 decorreu do aumento de alíquotas, dos preços e da demanda dos combustíveis, comunicação e energia elétrica, bem como, decorreu da ampliação da substituição tributária, da implantação da nota fiscal eletrônica e do avanço tecnológico e de gestão das administrações tributárias.
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Esta imunidade do ICMS modificou o modelo de desenvolvimento previsto pelo constituinte originário, que visava a substituição de importações e a promoção da exportação de produtos elaborados, que geram renda, emprego, desenvolvimento tecnológico e maiores volumes de divisas para o nosso país.
Portanto, é imperioso que a União deixe de sustentar estas políticas que esgarçam a relação federativa e que beneficiam apenas poucas empresas, que deixam de contribuir para com o país que lhes fornece graciosamente as riquezas naturais do solo e subsolo e as necessárias infraestruturas para a exportação de seu desestruturante extrativismo.
*João Pedro Casarotto, especialista em finanças públicas.