Recentemente, vimos o desespero em estado puro. Milhares de pessoas agarrando-se a aviões que estavam saindo de Cabul, no Afeganistão. Civis apelando a uma intervenção estrangeira. Mulheres muçulmanas protestando com cartazes. Nos jornais de todo o mundo, as notícias eram uma só: o Talibã retornava ao poder.
Apesar das cenas dramáticas, esse retorno foi mais gradual do que se imagina. Já em 2020, na administração Trump, foi assinado um acordo de paz entre os Estados Unidos e o Talibã. Dentre os pontos do acordo, constavam a libertação de 5 mil presos do Talibã e a retirada das tropas americanas. Em troca, os EUA exigiam do Talibã a interrupção das operações da al-Qaeda em território afegão, assim como “moderação institucional” do grupo.
O governo afegão, estruturado em torno de um presidencialismo pós-2001, foi sempre uma realidade instável e dependente do apoio militar da OTAN.
Em 11 de setembro de 2001, aconteceu o maior ataque terrorista em solo americano. A queda das Torres Gêmeas fora organizada por um grupo jihadista, a al-Qaeda, cujo líder, Osama bin Laden, se refugiou no Afeganistão, sob guarda e proteção de Mula Omar, líder do Talibã.
Este fato precipita a invasão do país pelos Estados Unidos. Em 2001, os Estados Unidos lançam guerra contra o Afeganistão, já após a inclusão do Talibã e da Al-Qaeda como organizações terroristas. O Talibã já havia desfrutado de uma experiência política curta. Tendo sido fundado em 1994, a sua composição era basicamente a seguinte: ex-combatentes na guerra Afegã-Soviética (1979-1989), estudantes e militantes fundamentalistas (talib), religiosos locais fortemente influenciados pela versão teológica islâmica deobandi de origem indiano-paquistanesa. Em 1996, o Talibã chega ao poder, derrubando o governo de Burhanuddin Rabbani.
Leia também
O grupo extremista, responsável por controlar o Afeganistão, caracteriza-se por uma interpretação puritana e reformista da lei religiosa islâmica, a Sharia. Restringindo direitos femininos e educação, perseguindo e matando minorias religiosas xiitas e os próprios sunitas que não se alinham ao Talibã, o grupo é um dos mais agressivos e fanáticos do mundo.
O mais absurdo, no caso brasileiro, é a reação de alguns setores da esquerda ao retorno do Talibã. O PCO, partido conhecido por adquirir notoriedade por suas posições irracionais, saiu em defesa do Talibã reconhecendo no seu retorno uma “derrota do imperialismo”. O diagnóstico é duplamente ilógico.
Em primeiro lugar, a administração Biden continuou uma retirada de tropas que já vinha acontecendo. Se houve uma “derrota” ela foi uma derrota publicitária, mas não uma derrota de um projeto imperialista. Em segundo lugar, vejam a lógica doentia do raciocínio. Não importa o radicalismo do Talibã ou o mal que o movimento imponha a minorias religiosas e mulheres: se o “imperialismo perdeu”, devemos celebrar.
Por fim, ainda temos a ironia de que o Talibã foi um dos movimentos responsáveis pela derrota da URSS no próprio Afeganistão, apoiado, nessa época, pela CIA. Mas, compreendemos, lógica e coerência ética não são o forte da esquerda brasileira.
*Rubinho Nunes é vereador de São Paulo, advogado e coordenador nacional do Movimento Brasil Livre
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
> Leia mais artigos de Rubinho Nunes
Deixe um comentário