Há alguns dias iniciei a leitura de um fascinante relatório produzido pelo Conselho de Inteligência dos EUA. Trata-se de um documento intitulado “Tendências Mundiais 2030”, e busca apresentar cenários sobre o futuro próximo do planeta.
Uma das tendências mais fortemente destacadas pelos autores do estudo é a da “urbanização” do mundo. Vamos aos números: em 1950 apenas 30% da população viviam em cidades. Atualmente, são 50% – e prevê-se que em 2030 serão cerca de 60% das estimadas 8,3 bilhões de pessoas que habitarão o planeta.
Só para que se tenha uma ideia do tamanho desta mudança, a cada ano 65 milhões de pessoas se somam à população urbana – é como se o mundo ganhasse cinco novas cidades do porte de Londres.
Detectou-se, neste estudo, que nove países se destacarão neste processo, contribuindo com nada menos que 26% do crescimento urbano. São eles: Bangladesh, Brasil, República Democrática do Congo, Indonésia, México, Nigéria, Paquistão, Filipinas e EUA. Tradução: podemos esperar, no nosso país, um processo de urbanização bem mais acelerado que a média mundial.
Este fenômeno traz oportunidades incríveis, dado o aumento de demandas por obras e serviços. Calcula-se, por exemplo, que o volume de construções nos próximos 40 anos superará a soma de tudo que já se construiu ao longo de toda a história. Daí estimar-se que as cidades serão responsáveis por nada menos que 80% do crescimento econômico previsto nos próximos 17 anos.
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Ao ler este estudo fiquei a recordar-me de um livro que li há alguns anos, de autoria do economista japonês Kenichi Ohmae. Dizia ele, em resumo, que grandes cidades podem ser ferramentas de desenvolvimento de vastas áreas ao redor – e citou os casos de Shanghai, Guangdong, Hong Kong, Singapore e outras tantas pelo mundo afora.
PublicidadeHá, porém, e eis aí o alerta feito, que se providenciar a melhor infraestrutura possível. Estas cidades devem ter, por exemplo, energia e comunicações fartas e baratas, transporte público eficiente, ordem tributária simplificada e sistema legal ágil.
Caso isto não seja alcançado, o que deveria ser um milagre de desenvolvimento transforma-se em um inacreditável emaranhado de problemas. E está lá, no livro de um economista japonês, a orientação do que não se deve fazer, baseada nos exemplos de algumas cidades latinas – Brasil incluído.
São cidades imensas e ricas, com um potencial fabuloso, mas cuja rede viária e de transportes é precária, que padecem sob sistemas tributários e legais confusos e obsoletos e que não foram contempladas com redes de energia e comunicações modernas e eficientes.
Os resultados desta cegueira gerencial aparecem na forma de cinturões de miséria bloqueando o que deveria ser uma fronteira de desenvolvimento. Também se manifestam no alto grau de informalidade da economia e nos elevados índices de criminalidade.
Acredito que uma simples visita a qualquer grande cidade brasileira seja suficiente para percebermos que nos encaixamos, sim, no exemplo do que não se deve fazer para se obter progresso econômico sustentável e de longo prazo – são desnecessários maiores comentários sobre este aspecto.
Penso que não devemos nutrir a ilusão de que mudaremos todo o país. Mas podemos, sim, participar mais ativamente da vida de nossas pobres cidades, tornando-as mais lógicas, dinâmicas e preparadas para o futuro venturoso que se prenuncia – e com isto, por via reversa, estaremos começando a mudar todo o Brasil.