Na última semana, foi celebrado 30 anos do código de defesa do consumidor. Em setembro de 1990, o então presidente Fernando Collor promulgou a Lei nº 8.078. Nascia ali o código de defesa do consumidor.
No artigo de hoje, pretendo fazer um paralelo sintético entre o direto dos consumidores e o setor de telecomunicações.
Naquela época, o sistema de telecomunicação do Brasil era estatal. O principal serviço era o telefone fixo (o serviço telefônico fixo comutado – STFC) e a comunicação de dados era feita pelo serviço de rede de transporte de telecomunicações (SRTT), que somente depois tornou-se de comunicação multimídia.
Eram tempos de troca de dados embrionária. A Internet era exclusiva de universidades, uma vez que apenas no começo daquela década o serviço passou a ser acessível para qualquer pessoa.
A TV a cabo era novidade, começara alguns meses antes. Até aquele momento, televisão por assinatura era transmitida apenas radiodifusão, por UHF. O telefone celular não tinha chegado ao Brasil. Foi pouco depois, em dezembro de 1990, foi realizada a primeira ligação de telefone celular, no Rio de Janeiro.
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Após esse breve panorama, voltemos ao telefone fixo, que era o existente à época. Com o monopólio estatal o serviço era tratado com um bem, uma propriedade. Os mais novos podem não acreditar, mas ao solicitar um telefone pagava-se caro, muito caro, para entrar em uma fila. Eram anos de espera para a instalação da linha.
PublicidadeLinhas telefônicas eram presentes de casamentos (e dos elegantes). Custavam de mil a R$ 3 mil reais, podiam ser parcelados em até 36 vezes e o proprietário recebia uma ação da companhia telefônica.
Nesse contexto, ser um assinante do serviço telefônica não era direito, mas sim um privilégio.
Em 1995, a Emenda Constitucional nº 8 permitiu a exploração do serviço pelo setor privado. Em 1997, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) foi criada. Em 1998, as empresas estatais foram privatizadas.
Junto das novas concessionárias do serviço telefônico fixo, surgem as empresas espelhos para fomentar a competição, os planos de universalização e de qualidade do serviço.
Assim começa a nova fase das telecomunicações. A expansão do serviço, com a introdução da competição, faz com que o telefone deixe de ser uma propriedade que poucos têm acesso, para um serviço de muitos.
Faço um pequeno parêntese, para lembrar de uma breve anedota de um antigo colega que trocara de emprego, que saíra de uma concessionária do STFC em região com pouquíssima competição e fora trabalhar em uma concessionária que atuava em região onde havia a espelho (empresa entrante) mais forte naquele momento: “só existe uma coisa pior que usuários, concorrente!”
Fico confortável para explanar o comentário, pois nem a concessionária, nem a espelho existem mais.
Em que pese o reconhecimento da importância da competição, que é a força motriz para o desenvolvimento do mercado, quero chamar atenção para palavra usuário.
O consumidor de telecomunicações nasceu como usuário. Com uma assessoria subordinada diretamente ao presidente da Anatel.
Logo no começo da sua atuação (1998), a Anatel instalou sua central de atendimento telefônico. Naquele momento, voltado para esclarecimento dos direitos dos usuários, pois tudo era muito incipiente.
A conceituação como usuários dos serviços de telecomunicações vis-à-vis consumidor, pode parecer frugal nos dias de hoje, mas foi objeto de intensos e acalorados debates no setor. A empresas de telecomunicações não queriam que fossem caracterizadas relações de consumo.
Cada serviço de telecomunicações tinha seu regulamento próprio e cada regulamento listava os direitos dos usuários.
Em 2013, com o novo regimento interno da Anatel, os usuários são empoderados e ganham uma superintendência para “chamar de sua”. Com a superintendência de relações com os consumidores, finalmente os usuários dos serviços de telecomunicações passam a ser tratados como consumidores e começam a ganhar protagonismo.
Em 2014, a Anatel aprovou o regulamento geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações – RGC. Finalmente, os direitos dos consumidores dos diversos serviços são padronizados e agrupados em mesmo regulamento.
O setor de telecomunicações passou a ter seu código de defesa do consumidor. Opa, será? Não! O Código de Defesa do Consumidor é único. Vamos dizer que o RGC apenas traduziu o CDC em linguagem do setor de telecomunicações.
Na sequência, a Anatel cria o Portal do Consumidor , que agrega regulamentação sobre os diretos e canais para reclamações dos consumidores. Na esteira dessas evoluções, a quantidade de reclamações na Anatel é reduzida de quatro para três milhões. Portanto, um milhão de reclamações a menos.
A quantidade de reclamaç1ões pode parecer elevada em termos absolutos, mas quando relativizamos pela base de 315 milhões é até pequena. Ou seja, as reclamações na Anatel giram em torno de cerca de 1% da base de contratos dos serviços de telecomunicações.
Por outro lado, é importante destacar que análise qualitativa das reclamações revela que os problemas são relativamente simples e uma melhora incremental no atendimento das prestadoras pode gerar uma grande melhora na percepção da prestação dos serviços por parte dos consumidores.
Por fim, é importante destacar que o caminho para o desenvolvimento do setor de telecomunicações é colocar o consumidor no centro da regulação. O consumidor é a razão de ser da prestação dos serviços. Cada vez mais é necessário buscar uma regulação que dê transparência e fluidez para as relações de consumo.
No lugar de impor obrigações às prestadoras de serviços de telecomunicações, é preciso que o consumidor consiga comparar de forma simples e inteligível as ofertas, a qualidade e preços ofertados. Sendo possível uma fácil migração para o prestador e serviço que ele consumidor escolher, a facilidade na portabilidade é um grande estímulo a competição. Essa é a fórmula que impulsionará com mais força o desenvolvimento do setor de telecomunicações.
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