Não faz muito tempo a humanidade deparou-se com dois vídeos, ambos divulgados pelo planeta afora e merecedores de uma ampla e muito profunda reflexão.
O primeiro deles veio da China. Mostra uma indefesa criança de apenas dois anos de idade, andando bem no meio de uma passagem bastante movimentada. O nome desta semelhante nossa: Yueyue.
Eis que surge uma van branca, conduzida por um motorista que simplesmente não teria como não ver a criança exatamente no meio da passagem, trajando uma vistosa calça vermelha.
Apesar disso, seguiu-se um atropelamento. A roda dianteira direita do veículo passa sobre o frágil corpo de Yueyue. O motorista interrompe a marcha. Seria para saltar e ver o que havia pelo caminho? Não: foi apenas para tomar impulso a fim de que a roda traseira direita do veículo passasse com mais facilidade sobre a menina, que ficou largada no chão se esvaindo em sangue.
Porém, o mais chocante viria em seguida. Um ser humano passou andando a não mais do que 15 cm do corpo da infeliz criança, e sequer diminuiu o passo. Segue-se outro em uma bicicleta, que viu Yueyue caída no chão, desviou-se dela e da poça de sangue que se formava e foi embora sem sequer olhar.
Aí aparece um pequeno caminhão e atropela novamente a indefesa criança. Atropela e vai embora. Em seguida passam dois veículos de entrega ao lado do corpo estendido no chão. Sequer reduzem a marcha. Segue-se em terceiro. Uma outra motocicleta. Um outro pedestre. E mais duas motocicletas. E outros dois pedestres. E continua ali, no asfalto, sangrando, uma criança – o futuro da nossa raça.
Eis que aparece, então, no meio de tantas pessoas ocupadas demais com seus afazeres diários, uma miserável catadora de lixo. Parece incrível, mas foi a única pessoa que preocupou-se em retirar a criança do meio de uma movimentada rua. E só então alguns conhecidos apareceram para prestar socorro.
O segundo vídeo veio do outro lado do mundo, lá do Chile. Foi feito pela câmera de segurança de uma das mais movimentadas rodovias daquele país, a Costanera. Trata-se de uma via de três faixas para cada mão, pela qual os veículos passam em velocidades próximas de 100 km/h.
E eis que um infeliz cachorro é atropelado por um caminhão e fica lá, ferido, entre a primeira e a segunda faixa da rodovia. Outros carros e caminhões continuam passando a centímetros dele, sempre em alta velocidade.
O que se viu em seguida foi emocionante: um segundo cachorro aparece, e vai para o meio da estrada. Fica junto do seu semelhante. E começa, da forma mais surpreendente possível, uma tocante operação de resgate.
Este segundo cachorro começou a puxar o primeiro para o acostamento, antes que um novo atropelamento acontecesse. Tocou-me o coração ver que ele não fez isso com os dentes, ou de forma brusca. Não. Com as patas dianteiras, milímetro a milímetro, foi arrastando seu semelhante até a beira da estrada. Não mostrou, em um momento sequer, medo diante do risco de vida que corria – a indomável vontade de salvar seu semelhante foi maior até mesmo que o instinto de sobrevivência.
O final deste episódio foi feliz: o cachorro acidentado, atendido em seguida por uma equipe de resgate, sobreviveu. Enquanto isso, lá na China, Yueyue teve morte cerebral. Faleceu.
Que coincidência esses dois vídeos terem surgido para o mundo ao longo de uma mesma semana! Mas terá sido mesmo coincidência? Segundo Nelson Rodrigues, “Deus está nas coincidências”. Que tal meditarmos sobre isso?
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