O bom funcionamento da democracia pressupõe a divisão, a independência, a autonomia e a convivência harmônica entre Executivo, Legislativo e Judiciário. Não são esferas estanques de Poder, como bem demonstram a judicialização da política e o império das medidas provisórias. Mas para assegurar o pleno interesse público se faz necessário o cumprimento integral dos papéis institucionais.
Vivemos hoje no Brasil o mais duradouro e amplo período de liberdade e democracia em toda a nossa história. A anistia, a transição democrática liderada por Tancredo e Ulysses, a Constituinte de 1988 e a ocorrência de seis eleições livres para a Presidência da República consolidaram o ciclo democrático presente e arquivaram experiências autoritárias de triste memória.
Embora os avanços sejam palpáveis, a dinâmica real revela ainda distorções e gargalos. O funcionamento do sistema judiciário e a legislação brasileira ainda dão margens para a impunidade e para uma sensação social de ineficácia. O Congresso é vítima de uma fragmentação excessiva e sem conteúdo, fruto de um sistema político, eleitoral e partidário anacrônico, com impactos claros em seu funcionamento e no ambiente de governabilidade.
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O Executivo, no vácuo provocado pelas debilidades dos outros poderes, aparece ainda como senhor quase absoluto da situação, configurando o que costumo chamar de “presidencialismo imperial de cooptação”. Usufrui de ampla maioria no Congresso construída não em torno de um programa governamental, mas pela cooptação por meio de nomeações políticas e liberações orçamentárias.
Nas últimas semanas, a Câmara e o Congresso tomaram duas atitudes de significado histórico. Aprovando a execução obrigatória das emendas parlamentares, desmontou um velho mecanismo de chantagem e cooptação dos deputados e senadores, na ultrapassada prática do “é dando que se recebe”. Com isso, os parlamentares terão mais autonomia para representar bem a sociedade brasileira.
A apreciação dos vetos pelo Congresso Nacional também foi um grande avanço. Embora todos os vetos da presidente Dilma tenham sido mantidos (proteção do FPE em relação às desonerações, cesta básica, Ato Médico e Prouni), graças à ampla maioria governista no Senado, a simples retomada da prática de apreciar os vetos, interrompida por 12 anos, resgata uma prerrogativa do Congresso e não deixa o Executivo ter a palavra final e o controle absoluto sobre o processo legislativo, via medidas provisórias e vetos sem apreciação posterior pelo Poder Legislativo.
O próximo passo é a provação da PEC aprovado pelo Senado, de autoria do senador José Sarney, com relatório de Aécio Neves, que cria um novo rito para tramitação nas MPs. Para analisar a matéria, a Câmara dos Deputados instalou comissão especial, da qual faço parte.
Sem falar que, paralelo a tudo isso, o “gigante acordou” e a sociedade explode em participação cidadã nas ruas e nos corredores do Congresso.