Na nefasta cruzada do bolsonarismo, o governo federal concentrou três grandes golpes contra a ciência e a educação pública brasileiras nos últimos dias. O que já tinha piorado, se agrava agora, no momento que a população mais necessita desses setores por causa da pandemia e seus efeitos. Em meio a essa escuridão política, no entanto, há luzes pelo território nacional, graças à postura de instituições científicas, universidades, cidadãos e alguns governos locais.
Evidentemente que para uma solução nacional serão necessários do governo federal a garantia de financiamento, a busca por excelência e a prioridade administrativa concreta aos setores do conhecimento, proporcionando inclusão, geração de capital humano, produção de patentes e tecnologias nacionais. Infelizmente, o governo Bolsonaro preferiu mais três novas ações profundamente nefastas.
Uma delas foi a portaria publicada pelo INEP, em 11 de maio, em que o órgão omite a garantia de realização do Enem em 2021. O órgão, ao ser ouvido pela imprensa, não confirmou a garantia do exame que é, nacionalmente, a mais ampla forma de acesso ao ensino superior. Outra ação aterradora foi o corte de 29% do orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) para 2021, que terá como uma das consequências a redução significativa das bolsas de pós-graduação.
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Apenas o CNPq, uma das principais agências de financiamento de pesquisa brasileira, com uma internacionalmente reconhecida tradição na formação de grandes cientistas brasileiros e redes de pesquisas nacionais, só terá orçamento para garantir 396 das 3.080 bolsas de doutorado e pós-doutorado. Além do prejuízo na continuidade de estudos de alto potencial, o corte coloca sob risco a sobrevida de diversos grupos de pesquisa em temas essenciais.
Por fim, as instituições federais de ensino superior terão um corte aproximado de R$ 1 bilhão neste ano. É sabido que essas instituições já convivem com um cenário de restrições orçamentárias. Um corte dessa magnitude pode inviabilizar o funcionamento de instituições. Registro esses três fatos com enorme preocupação pelo que trazem de consequências em curto e médio prazos.
Entretanto, o Brasil tem resistido e reagido. Os defensores da ciência e da educação não entregaram os pontos. Há reações de instituições, sociedades e lideranças da ciência e do setor educacional, cobrando mudanças de postura desse governo. Desperta otimismo também a ação de alguns estados brasileiros que, mesmo na contramão, têm estrategicamente dado atenção diferenciada ao setor educacional e às atividades científicas realizadas nos seus territórios.
Tomo como exemplo o meu estado do Ceará, onde a educação básica se tornou referência nacional e as pesquisas científicas têm ganhado destaque, até com a possibilidade de uma nova vacina. O aumento das matrículas em todo o ciclo da educação básica, a célere ampliação da educação em tempo integral, a consolidação de uma rede de escolas de ensino médio profissionalizante e a melhoria progressiva e consistente nos indicadores de aprendizagem ao longo dos anos se destacam.
Segundo o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica-IDEB (MEC) de 2019, das cem escolas brasileiras com os melhores resultados de avaliação nos anos iniciais do ensino fundamental, 79 estão no Ceará e 73 das cem melhores nos anos finais também são cearenses. Esse capital humano ascendente, aliás, é o mais fundamental ativo que o Ceará tem hoje para um desenvolvimento econômico sustentável e inclusivo pelos próximos anos.
Na educação superior, o Ceará tem tido franca expansão das vagas na graduação. E duas pesquisas recentes, vinculadas a respostas dadas aos desafios da pandemia e que mereceram atenção recente da imprensa nacional demonstram a relevância dessa comunidade acadêmica do Ceará, a sensibilidade e a capacidade dos grupos de pesquisa locais e, principalmente, a boa articulação institucional existente entre governo do estado, universidades e setor produtivo.
Vale destacar a produção de um equipamento respiratório inovador chamado ELMO, de baixo custo, de simples manuseio e que tem reduzido em 60% a necessidade de internação em leitos de UTI com uso de respiradores. O ELMO é produto de parceria entre o próprio governo local, pela sua Escola de Saúde Pública, a Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC/SENAI), a Universidade Federal do Ceará (UFC), a Universidade Fortaleza (UNIFOR) e empresas locais.
Outra boa notícia também trouxe muita esperança aos brasileiros. O Laboratório de Biotecnologia e Biologia Molecular da Universidade Estadual do Ceará (UECE) desenvolveu a vacina HH-120-defenser, imunizante cearense que agora aguarda autorização da Anvisa para o início de testes em humanos. Dada a dependência tecnológica do Brasil nessa área, essa descoberta pode ter um extraordinário e histórico impacto social para o País.
A ciência e a educação pontuam-se, seguramente, como as luzes desse túnel escuro em que o Brasil foi colocado. Que esses bons exemplos do Ceará e de outros estados, além de outros atores, ajudem o Brasil a transformar, definitivamente, ciência e educação em política pública estratégica, para a saúde, a melhoria econômica e a inclusão social.
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