Nossos anseios e vontades sobre o serviço público serão atendidos com a PEC 32/2020 que trata a Reforma Administrativa?
Serviço público é um dos temas mais comentados devido à Reforma Administrativa, mas, ao mesmo tempo, é um dos mais difíceis de falarmos neste momento. Naturalmente, temos nossas opiniões formadas a partir de experiências pessoais em repartições públicas ou nos comentários que escutamos por aí, seja num bar ou nas redes sociais.
Se buscarmos os pontos principais do que queremos do Estado, provavelmente muitos deles serão convergentes. Então, vamos pensar nos mais óbvios desses pontos e que ajudariam a melhorar nosso dia a dia, como desburocratização, eficiência no atendimento, conversão dos nossos impostos em serviços de qualidade e o fim da corrupção.
Primeiro, para falarmos sobre a desburocratização, precisamos entender a estrutura do Estado em todas as minúcias e como se dão os fluxos operacionais. Como exemplo, nos deparamos com uma quantidade enorme de diferentes impostos que as empresas pagam para poder abrir suas portas e funcionar, mas isso não se resolveria falando de serviço público, e sim com um debate sobre reforma tributária.
Em relação à morosidade do funcionamento de cada órgão e número de processos internos de cada um deles, a conversa precisa ser aprofundada, buscando ferramentas tecnológicas, simplificação de atos administrativos, digitalização de processos, entre tantas outras coisas e isso nada consta na reforma administrativa. Logo, os pontos cruciais para a desburocratização não fazem parte dessa reforma e você passa a ter a ilusão de que as coisas funcionarão caso ela seja aprovada.
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Em segundo lugar, quando abordamos eficiência, o governo propõe avaliação de desempenho no texto da PEC. Não acredito que qualquer servidor público se recuse a ser avaliado e faz todo o sentido que seja aplicado o procedimento. Essa, inclusive, é uma forma que o próprio servidor tem de comprovar o quanto trabalha e produz. Eles anseiam por isso. Os resultados dessas avaliações servirão para moralizar e acabar com o discurso de que servidor público não trabalha.
O que não pode acontecer é tratarmos de uma reforma em que o empregador sequer detalha quais serão os critérios de avaliação, como está acontecendo. O que será avaliado? Quais são os critérios objetivos? Como esperar uma melhora de desempenho se o próprio empregador, no caso o governo, sequer consegue dizer o que avaliará? É uma cilada.
Em terceiro, quando criamos a expectativa de recebermos nossos recursos de volta por meio de serviços de qualidade, não podemos esquecer que existe uma infinidade de questões que independem de pessoas, ou seja, dos próprios servidores.
Obviamente que um sorriso ao entrar numa repartição não mata ninguém. No entanto, questões como melhoria das estruturas físicas, modernização de equipamentos e estações de trabalho, links de internet com boa velocidade e sistemas internos que não travam no meio de um atendimento podem representar um aumento de produtividade enorme.
Recentemente alguns ministérios, inclusive o da Economia -o mesmo que propôs a PEC 32/2020-, implantaram corte de ponto, desligamento de energia às 18h e não disponibilizam mais aquele cafezinho simples para quem trabalha na repartição. Qual a motivação em produzir dessa forma? Como incentivar qualquer pessoa a trabalhar assim? Se fosse na iniciativa privada, você não começaria a procurar outro emprego? Eu desafio você a encontrar uma linha na PEC 32/2020 que trate de melhoria da parte que cabe ao próprio governo.
Entre todos os nossos anseios, talvez o maior deles seja o fim da corrupção. Esta semana a Servir – Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público, iniciou o processo de coleta de assinaturas para texto alternativo à comissão especial. Entre eles está a manutenção da estabilidade do servidor público.
Como falar de acabar com a corrupção retirando estabilidade? Na maior parte dos casos de corrupção do país encontramos um destino certo que começa em parlamentares, passando por comissionados ou nomeados em estatais e chegando na iniciativa privada através de propinas.
Hoje, na verdade, a estabilidade do servidor é o que ainda mantém o mínimo de moralidade e medo nessas relações escusas que acompanhamos há décadas. Falar de retirar estabilidade é dar salvo conduto para a famosa “carteirada” praticada pelos apadrinhados, que ocupam cargos para servir ao senhor que o colocou naquela cadeira.
Entendam, é preciso conhecer e compreender melhor a PEC 32/2020 antes que seja tarde demais. O que mais queremos que mude no serviço público não será mudado com a proposta apresentada pelo Governo. O foco está em retirar direitos, reduzir o serviço público, eleger culpados pela ineficiência do Estado e, mais do que qualquer outra coisa, abrir o caminho para negociatas de cargos, licitações para terceirizados e pânico dos servidores que não terão mais estabilidade e, sendo assim, perderão a capacidade de se negar a fazer o que não acreditam por medo de perder seus empregos no dia seguinte.
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