Emanuel estava atrasado em seu encontro diário com Jaci e Oxalá. Pontual, desta vez havia uma razão importante para o aparente desleixo. Ele recebera a visita de seu primo Muhammad. O jovem acabara de chegar do Oriente Médio, escapando das bombas e dos drones que espalhavam morte no solo sagrado que fizera nascer o judaísmo, o cristianismo e o islamismo. O cansaço do querido parente justificava o seu atraso e a própria ausência do visitante naquele iniciar da noite.
– Pena que ele esteja cansado. Eu acho Muhammad muito divertido. Cheio de energia – lamentou Jaci. – Quem sabe ele não acorda e vem, não é? Quero saber das novidades?
– Eu também. Tio Ogum me disse que a destruição no Oriente Médio está assustadora. Ele falou que nunca viu um caos igual. E olhe que de guerra ele entende bem – comentou Oxalá, para depois perguntar. – Emanuel, os cristãos, os judeus e os mulçumanos não são parentes? Por que esta confusão toda?
– Eles são nossos irmãos, descendentes de vô Abraão, Oxaguian – concordou Emanuel. – Mas vá entender o ser humano! Você mesmo sofre com as confusões que eles aprontam.
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– Verdade! Eu não sou da família de Abraão, Isaque, Ismael e tantos outros que nasceram nas tribos de Israel – assentiu Oxalá. – Mas sei que minha prima Iansã sofre muito preconceito.
– Bárbara me falou que muitos não aceitam ela gostar de ser chamada de Iansã – lembrou Emanuel. – Eu não me incomodo quando dizem que eu sou o próprio Oxaguian, mas sei que cometem muita violência quando afirmam que “somos dois em um”.
– Gente! Gente! Muhammad está chegando – era Jaci interrompendo, eufórica, a conversa repleta de belo sincretismo. – Será que ele vai mandar alguma praga contra aqueles que estão matando o seu povo em nome de Deus?
– Que Allah esteja entre nós! – cumprimentou Muhammad, abraçando os seus amiguinhos. – Nós sabemos, Jaci, que não se pode atribuir a Deus os males do homem. “O homem é o próprio culpado de sua própria perdição”.
– Você tem a mais absoluta razão, primo – afirmou Emanuel. – Mas “perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
– Emanuel e sua eterna mensagem de amor – sorriu Muhammad. – Mas devo concordar com você. “Suporta o mal com paciência e perdoa, pois há nele grande e verdadeira sabedoria”.
– Ainda bem que o papa Francisco compreende isso e foi ao Iraque falar em amor no meio do caos, não é Muhammad? – suspirou Emanuel. – Fiquei muito emocionado quando ele se encontrou com o aiatolá Ali al-Sistani.
– Eu também fiquei emocionada, Emanuel – interrompeu Jaci. – Mas, como a sua turma está dizendo em campanha: Fraternidade e vida: dom e compromisso.
– Bem lembrado, Jaci! – concluiu Muhammad. – E que estes exemplos se multipliquem.