Cléber Lourenço *
O Brasil pós-Bolsonaro possuí alguns compromissos para o reestabelecimento e fortalecimento da institucionalidade, e, além de controlar a militância político-partidária dos generais, também precisará evitar possíveis esbirros lavajatistas que arrasem com o país inteiro.
O nosso Ministério Público (MP) entrou em rota de colisão direta com o Estado de Direito e a democracia.
E o principal problema está no corporativismo da instituição que é tão pujante quanto o dos militares. E isso vem desde a sua formação, já na constituinte de 88, fizeram um poderoso lobby – um dos mais poderosos na ocasião – para acumular superpoderes.
Isso somado com uma independência não supervisionada permitiram o desvio de suas funções primordiais para empreender uma escalada em busca de estabelecer-se como poder moderador.
Foi esse mesmo excesso de poder concentrado nas mãos deles que levou seus membros a cometem abusos e a interferir na vida pública. Substituindo e balizando ações contra os poderes legislativo e executivo, valendo-se da intimidação via abertura de ações por atos de improbidade, isso quando ações não são abertas em ano eleitoral ou próximo de datas de votação, como registrado nos últimos anos.
Uma reportagem da jornalista Maíra Magro, de 2013, publicada no “Valor Econômico” revelou que de 2005 a 2012, o CNMP recebeu 2.696 reclamações, destas, apenas 64 geraram procedimentos administrativos disciplinares terminando em 31 punições. Notem, tudo isso antes dos descalabros da lava-jato.
Ainda hoje as corregedorias e conselhos são demasiadamente cautelosos em assuntos “sensíveis” para membros da instituição. E infelizmente, a lava jato criou uma mentalidade de que se faz obrigatória a onipresença do Ministério Público, principalmente na política.
E se os procuradores e as primeiras instâncias do MP já causaram estragos. A PGR não muda muita coisa. Assim como os militares, o Ministério Público se tornou um elemento de instabilidade no país. Não me surpreende que ambas as instituições já rogaram para si a alcunha de poder moderador.
E o que fazer quando a cúpula do MP se torna um órgão de governo aditivado dos benefícios da vitaliciedade, irredutibilidade salarial e inamovibilidade? Tudo isso municiada com poderes que permitem a criação daquilo que vimos seguidas vezes na lava jato: a criação de materialidade para dobrar a verdade ao seu sabor.
A flagrante omissão da Procuradoria-geral da República é ainda mais grave! Para cada arroubo do presidente da República, há uma PGR pronta para fornecer guarida através do silêncio e inatividade.
O descontrole da PGR é tão grande que uma notícia-crime contra Aras no Conselho Nacional do Ministério Público foi despachada para o gabinete do próprio Aras que prontamente mandou a petição para Senado, onde goza de certo crédito com os senadores.
Com isso, o entendimento que fica claro é de que Aras não poderia ser penalizado por crimes comuns, apenas de responsabilidade. Quem vigia os vigilantes?
E embora Aras tenha acertado com a supressão do lavajatismo no MP, as estultices ditas durante a sua sabatina deixam claro o quão problemático são os “superpoderes”, principalmente, da PGR.
Se Janot pecava pela falta de diligência e seus planos para assassinar um Ministro do STF, Aras peca pela inércia fantasiada de diligência em demasia. Nos dois episódios o MP foi o ator principal dos desequilíbrios que assolaram o Brasil nos últimos 10 anos.
E eu nem vou falar do descalabro que é a tal listra tríplice! Onde, uma entidade de classe que define em seus próprios critérios para a escolha do chefe do Ministério Público, sujeitando a escolha do PGR ao sabor do momento e interesses da instituição.
Fecharei esse bloco com a reflexão do Promotor de justiça, Haroldo Caetano, que deu origem ao texto:
“Um tema que vamos ter de enfrentar é o papel do Ministério Público. A experiência desses pouco mais de 30 anos provou que a concentração de poderes no MP brasileiro, cujo desenho institucional é único no mundo, tornou-se armadilha contra o projeto de 1988”.
O 7 de setembro
A lava jato foi quem gestou e carregou nos braços a crise que vislumbramos, afinal de contas, quem, desde 2013 insuflou as massas e banalizou os acintes contra as instituições?
Lá estavam os procuradores inflamando a sociedade contra a PEC 37 (que eu sou a favor), alfinetando e alçando o Supremo Tribunal Federal como o maior dos males, lá estava a lava jato rosnando contra o falecido Teori Zavascki sempre que ele apontava alguma irregularidade da operação.
Foram eles que patrocinaram a mentalidade antipolítica e de quebra fizeram parte do governo Bolsonaro (olá Moro).
Foi Moro, que enquanto Ministro da Justiça disse que o motim do Ceará era ilegal, MAS que o policial não pode ser tratado como bandido. Por fim, na mesma semana, decidiu passear de tanque pelas ruas de Brasília, se tornando um vanguardista do movimento dos tanques na capital do século 21.
Sem golpe
E embora o cenário no horizonte pareça aterrorizante, não podemos deixar os desvaneios de quem não respeita a constituição nos cegar.
As vezes que a PM se amotinou, foram de maneira isolada e por questões da própria classe (aumento de salários, condições de trabalho e afins), e sim, existem bolsões bolsonaristas nas PMs de todo o país, isso não significa elas possuem força para alguma intentona.
Mesmo no primeiro semestre de 2020, quando tivemos ameaças de sublevação da PM em vários estados, a crise não se intensificou.
Os motivos para tanto alvoroço naquela ocasião eram o motim do Ceará e a intimidação dos PMs contra Romeu Zema em Minas gerais, o que resultou em um aumento salarial acima da inflação mesmo com o estado em severa crise fiscal.
A situação que o país enfrenta agora não é muito diferente do que o país já vive, desde 2013, em todo 31 de março. Onde sempre assistimos agitações na véspera, com gente injetando dinheiro, quarteis alvoroçados e Clube Militar com suas notas pomposas desprovidas de qualquer conteúdo.
Desde 2013, “dessa vez é sério”.
Outro ponto importante: uma sublevação organizada e generalizada das PMs sem a coparticipação das Forças Armadas será muito vergonhosa para a já fustigada credibilidade da instituição.
Nossos generais já deixaram bem claro: melhor do solapar a democracia, são os 3 mil cargos que ocupam no governo e seus enormes soldos e benefícios.
E a diferença de lá para cá? Bolsonaro no poder. Sim, o presidente mais fraco e incompetente de toda a história.
Esqueçam o dia 7 de setembro, ele passará assim como tantos outros dias 31 de março. Recomendo atenção redobrada para os dias que se seguirão. Se a tentativa de mostrar força virar uma demonstração de fraqueza – como tantas outras que assistimos -, ele terá problemas.
Infelizmente não dá para cravar se isso irá abrir alas para o impeachment, mas certamente irá gerar ainda mais dificuldades para o governo e consequentemente para os brasileiros, já que o chefe do executivo nacional está mais preocupado em gerar crises do que de fato trabalhar.
O país está paralisado por um homem que flagrantemente não quer e não gosta de trabalhar. Um governo inexistente de um presidente que se empolga unicamente com conflitos entre as instituições e outros poderes.
* Cleber Lourenço é pós-graduando em Jornalismo político.
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