Fábio Barbosa e Ana Marina de Castro *
O Brasil está diante de um momento único. Vivenciamos um processo eleitoral que em nada alterou as bases de uma crônica crise de representatividade. Estamos no período de maior desconexão entre a política – sem regeneração efetiva – e a sociedade.
O debate público e as decisões de governo estão distantes da população e, como consequência, o radicalismo tem alcançado novas dimensões. Em pesquisa recente do Instituto Ipsos, 94% dos brasileiros disseram que os políticos no poder não representam a sociedade, e 81% deles acreditam que o problema é o sistema político. O mais grave: 86% acreditam que a democracia, tal como a entendem, não é observada no país.
> Para 94% dos eleitores, atuais políticos não os representam, aponta pesquisa
A recente onda de renovação não se repercute em transformações efetivas, o que pode aprofundar ainda mais a frustração de diversos segmentos, sobretudo dos mais jovens. O cenário de desconfiança e de falta de representatividade sugere a necessidade de mudanças imediatas.
Leia também
A boa notícia é que existe uma oportunidade para mitigar parte dessas mazelas já no próximo ano, em caráter de prioridade. Consta da pauta de votações da Câmara dos Deputados um projeto de lei (PL 9212/2017) para a implantação do Voto Distrital Misto, uma solução que diminui a distância existente entre o mundo político e os cidadãos.
O modelo atual de eleição de deputados e vereadores está esgotado. No Congresso que estreia em 2019, menos de 20% dos deputados federais eleitos receberam efetivamente votos para isso. Todos os demais herdaram votos dos chamados “puxadores de voto”, personalidades que, por terem recebido mais votos que os necessários para sua eleição, tiveram seus contingentes redistribuídos para mais de 400 candidatos à Câmara.
A extensão territorial dos estados e a complexidade dos centros urbanos impõem desafios crescentes de campanhas, cada vez mais curtas e caras. Além de fatos como o dos 513 deputados federais eleitos em 2014 terem gasto quase R$ 1 bilhão em campanhas, os eleitores não têm oportunidade de conhecer adequadamente os candidatos e são levados a eleger uma maioria de parlamentares que não vivencia os problemas da sua região. Esse cenário difuso leva à eleição de congressistas que não têm compromisso de construir, em seus partidos, programas fortes para enfrentar os problemas do país, ou mesmo que não zelam pela transparência de suas legendas.
O Voto Distrital Misto para a eleição de deputados e vereadores apresenta-se como solução para o futuro do Brasil, numa combinação dos modelos majoritário – já utilizado para eleger prefeitos e governadores, por exemplo – e o proporcional. Pela proposta, os eleitores terão direito a dois votos no momento de escolher cada tipo de parlamentar.
Para o primeiro voto, o eleitor escolhe um candidato que resida no mesmo distrito – uma região específica da cidade ou estado – que o seu; e cada partido pode oferecer um único candidato em cada distrito. No segundo voto, os eleitores escolhem um partido específico, a partir de uma lista pré-ordenada de candidatos.
Nos distritos, serão eleitos os candidatos com mais votos obtidos. Já os votos para o partido são computados em toda a cidade (no caso das eleições para vereadores) ou em todo o estado (no caso das eleições para deputados). Assim, até metade das vagas disponíveis para o Legislativo será ocupada por uma pessoa que resida na localidade do seu eleitor e, uma outra parte das vagas será ocupada por candidatos dos partidos mais bem votados.
Com o Voto Distrital Misto amplia-se a possibilidade de fiscalização dos políticos pelos eleitores e pelos partidos. Esse modelo também traz mais representatividade ao sistema, com a eleição de candidatos melhor orientados às demandas dos eleitores e aos valores e propostas das suas legendas.
As oportunidades de fazer transformações nem sempre surgem nos momentos de maior de necessidade, mas agora temos esta oportunidade. Cada cidadão tem importância fundamental para impulsionar essa conquista: fale sobre o Voto Distrital misto com seus atuais representantes, com os candidatos eleitos, e em suas redes sociais.
Com engajamento de todos, as mudanças podem valer já para as próximas eleições. Nas próximas semanas, uma ampla rede de entidades dos mais diversos e representativos segmentos da sociedade civil lançam a rede Voto Perto, Voto Certo: Distrital Misto Já!, uma forma organizada para buscarmos, todos juntos, a concretização deste passo histórico.
* Empresário e presidente do Conselho do Centro de Liderança Pública (CLP). Ana Marina é coordenadora de Mobilização do CLP.
> STF decide que novas eleições podem ser convocadas após cassação de mandato