Reinaldo Azevedo não toma jeito. Vira e mexe ele escreve no seu blogue que irá à polícia registrar queixas contra os internautas que lhe enviam mensagens desaforadas. Como prezo muito a liberdade na web, duas vezes já ridicularizei tais demonstrações de paúra extremada diante do que, quase sempre, não passa de trote de adolescentes bobinhos (perdi a conta das ameaças que recebi, por e-mail ou telefone, sem jamais ter-lhes dado a menor importância). Foram estes os artigos em questão (clique p/ abrir), que o RA, claro, não ousou responder:
Quem nasce para Reinaldo Azevedo nunca chega a Carlos Lacerda
Dedico a canção “Goldfinger” ao Reinaldo Azevedo
Ele também se orgulha de, em 2013, haver sido o primeiro nostálgico do arbítrio a defender o enquadramento dos jovens manifestantes de rua na famigerada Lei de Segurança Nacional, entulho ditatorial que esqueceram de jogar na lixeira da História. Quando um delegado mentalmente ancorado naquele passado funesto tentou seguir-lhe o conselho, o próprio Geraldo Alckmin brecou a iniciativa, por considerá-la excessiva e inadequada para uma democracia. Ou seja, o RA conseguiu a proeza de ficar à direita do governador Opus Dei…
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Agora, ele sugere que a Marina Silva seja investigada, por suspeita de delito não especificado. Para não pegar mal demais, propõe que repórteres o façam. Mas, no fundo, no fundo, quer mesmo é atiçar as ‘otoridade’ contra ela. Leiam:
“Eu não sei, por exemplo, e ninguém sabe, do que ela vive e quem sustenta o aparato — que não é pequeno! — que a acompanha. Há tanto tempo sem legenda, flanando por aí, a questão é pertinente. Fosse outro, o jornalismo investigativo já teria se ocupado de apurar. Como é Marina, não se toca no assunto. Imaginem se algum outro candidato à Presidência da República tivesse um banqueiro — ou uma banqueira… — pra chamar de seu. Ela tem. O que nos outros seria pecado é, em Marina, tratado como virtude”.
Ora, se o Fisco, a polícia e a Justiça Eleitoral jamais viram motivo para aporrinharem-na, deverão fazê-lo agora porque um denunciante contumaz está subindo nas paredes ante a possibilidade de que a candidatura da Marina acabe com as chances eleitorais do Aécio Neves?
Pois é disto que se trata, já que o RA faz campanha desbragada para Aécio sair vitorioso (se eu raciocinasse à maneira dele, proporia uma investigação jornalística sobre eventual jabaculê tucano em seu favor, mas acredito que a motivação do RA seja outra, a de sempre: reacionarismo puro e simples).
Quanto à tempestade em copo d’água que ele faz, a pretexto de que a filha do Olavo Setubal passa o chapéu entre os ricaços e ajuda Marina em seus projetos políticos, o RA não deve ignorar que, no século passado, o PCB contava com um sem-número de grandes burgueses o financiando, servindo-lhe de testas-de-ferro e até abrigando comunistas perseguidos.
E daí que Marina, personagem de porte heroico, tenha uma fã em família de banqueiros? Não seria a primeira nem será a última vez que abastados admirarão os que travam o bom combate.
Aliás, a futrica do RA vem ao encontro de futricas na mesmíssima linha, partidas de blogueiros petistas. Estes, com toda a má-fé do mundo, martelam que Marina é apoiada pelo Itaú, não pela psicóloga Maria Alice Setubal. Assim como o RA, invariavelmente eles omitem que a dita cuja, não estando entre as quase duas centenas de nomes que compõem as diretorias da Itaú Unibanco Holding e da Itaú BBA, provavelmente nada tem a ver com as decisões e simpatias políticas dos dirigentes do grupo.
O RA fica nos devendo alguma prova de que ela seja banqueira; e os blogueiros petistas, a de que ela esteja trazendo para Marina o endosso do Itaú e não apenas o pessoal.
Trata-se, na verdade, de apenas de uma herdeira com ocupações características de herdeiras: dirige uma fundação humanitária, a Tide Setubal, criada em 2005 “para ressignificar e inovar o trabalho pioneiro de promoção humana iniciado por sua inspiradora na região de São Miguel Paulista, na zona leste da cidade de São Paulo”; fundou um centro de pesquisa em Educação e cultura; administra, junto com o marido, um hotel-fazenda.
Por pertencer a uma classe, alguém está impedido de seguir a sua consciência individual? Tudo que fizer, em cada momento da vida, será para defender os interesses de sua classe?
Que concepção mecanicista, tacanha, das motivações humanas! E, no caso dos blogueiros petistas, que maneira manipuladora, repulsiva, de se comunicarem com os seguidores, induzindo-os a equívocos, incutindo-lhes ódio e exacerbando preconceitos!
É hora de voltarem a Rosa Luxemburgo (“A verdade é revolucionária”). E de deixarem Maquiavel e Goebbels para os antípodas ideológicos como o RA, pois ambos de nada servem como guias para a esquerda: existimos para despertar as consciências, não para embotá-las, reduzindo-as ao primarismo, ao fanatismo e à unidimensionalidade.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. Mantém o blog Náufrago da Utopia.
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