As taxas de juros de nosso país são escandalosas. Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central foi mantida a Selic em 13,75%, apesar de não existir ameaças ao processo inflacionário no front externo nem no interno, tal como está escrito na própria Ata. Nem muito menos se justifica quando se constata que o próprio Comitê registra que seus modelos estimam uma taxa neutra, de equilíbrio, de 4%.
O Brasil é o campeão mundial, com uma taxa real de 8%. Os países que o seguem neste ranking são México, Colômbia, Chile e Hong Kong, todos com taxas reais de 5% para menos. Atualmente, a grande maioria dos países tem taxas de juros reais negativas.
Perante essa realidade, o presidente Lula fez incisivas críticas ao Banco Central. As suas manifestações provocaram, no primeiro momento, uma reação agressiva vinda de várias fontes. As críticas de vozes afinadas com o mercado financeiro registraram sua aversão a qualquer murmúrio que toque nos totens do establishment econômico. Chegou-se ao ponto de se questionar a própria legitimidade da fala presidencial.
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A ousadia dos críticos causa espanto. É um direito (e uma obrigação) do principal líder político do país chamar a atenção para uma questão que afeta a vida de todos.
O passar dos dias mostrou o agravamento da situação de crédito no país. Aos poucos houve uma alteração do humor dos chamados “formadores de opinião”, chegando ao ponto de se colher editoriais e artigos reconhecendo que a realidade financeira das empresas exigia revisões de rota. Parece que houve uma percepção de que carregaram nas tintas e que o remédio pode matar o doente.
Essa situação ganhou contornos mais profundos nesta semana com a quebra de dois bancos norte-americanos, já que também nos EUA tem-se uma elevação incômoda dos juros. O ritmo acelerado das elevações definidas pelo FED (o Banco Central norte-americano) impactou a liquidez bancária e ameaça o sistema de crédito dos EUA. E olha que o ritmo dos aumentos de lá nem se aproxima do que aconteceu por aqui.
PublicidadeCom isso, o protesto inicial do presidente passou a ter repercussões favoráveis e mostrou que ele acertou ao comprar a briga. O clamor passou a ser reconhecido como uma atitude indispensável para impedir uma debacle da economia brasileira. Nestas condições, os sinais já indicam que o BC terá que rever sua posição e iniciar a redução da Selic.
Estamos na antessala do que, no jargão financeiro anglo-saxônico, chamam de “credit crunch”, uma crise sistêmica de crédito que antecede recessões e quebra generalizada de empresas. O acompanhamento feito pelo Banco Central ainda não mostra esta situação, mas a ameaça deveria ser levada mais a sério.
Atualmente, as empresas brasileiras, especialmente as médias e pequenas, enfrentam uma realidade complicada. Esta situação pode ser confirmada. Basta indagar meia dúzia de gestores de empresas médias e ainda saudáveis financeiramente. Há um travamento das linhas de financiamento e as que estão disponíveis apresentam taxas proibitivas, que inibe investimentos e penaliza as operações do dia a dia das empresas. Esta situação foi afetada também pela quebra das Lojas Americanas. Já há várias empresas, especialmente do varejo, com dificuldades de rolagem de dívidas e algumas tendo que entrar em recuperação judicial.
O Banco Central brasileiro foi objeto de uma revisão institucional através da LC 179, de fevereiro de 2021. Foi atribuído a ele o status de autarquia especial, sem vinculação hierárquica, e com autonomia técnica, funcional e financeira.
A partir de março de 2021, ou seja, no mês seguinte ao novo estatuto legal de autonomia, o Banco Central iniciou uma acelerada expansão da SELIC. O salto foi de 2% naquele mês para atingir 13,75% em agosto do ano seguinte. Em 15 meses houve esse espantoso crescimento. Tal movimento não ocorre de forma incólume sem ter repercussões diretas na economia. Vide o que está acontecendo na economia norte-americana. O ritmo de expansão foi um recorde.
Jamais houve tal velocidade nos ajustes, a não ser em situações muito específicas de crises econômicas.
A elevadíssima taxa básica da economia brasileira leva a consequências complicadas. O impacto na dívida pública restringe mais ainda a capacidade dos governos promoverem investimentos e custearem suas despesas. Em 2022 o Brasil pagou nada menos que R$586,4 bilhões de juros. Tal valor corresponde a aproximadamente 6% do nosso PIB! É preciso que os leitores entendam o que significa esta realidade. Ela é gravíssima. Significa que no ano houve uma absorção de 6% de toda a riqueza gerada no País para os circuitos financeiros detidos pelos portadores de títulos públicos federais. Isso é um escândalo. Não há correspondência em nenhum outro país.
Mas o problema é mais grave quando se avalia as taxas na ponta, após a inclusão dos spreads bancários. Para as empresas as taxas de financiamento atuais estão ficando entre 25% e 40% ao ano. A taxa de juros do BNDES que é destinada a investimentos de longo prazo está atualmente em 15,44%, isso se fôr feito diretamente com aquele Banco. A maioria das operações é feita por intermédio de bancos repassadores e, neste caso, a taxa final salta para algo em torno de 20%. Já para os consumidores a situação chega a ser absurda. Há linhas de financiamento que ultrapassam os 400% ao ano. Nem os mais agressivos agiotas chegaram a tanto!
Não há economia que funcione com essas taxas de juros.
Porém, o que mais impressiona é o silêncio dos empresários da economia real. Há uma atitude complacente. Tal comportamento pode ser explicado por dois argumentos: um, associado aos rendimentos financeiros de Tesouraria que recheiam os balanços; o outro parece ser fruto de uma ideologização estreita, vinculada aos desdobramentos da ambiência política recente.
Empresário para valer, que persegue a geração de valor por meio de inovações e com a busca de soluções criativas para seus negócios, não pode gostar e aceitar juros altos. Mas é o que acontece no país.
Diante dessa realidade é fundamental intensificar o debate. Os argumentos miúdos de que a taxa de juros é alta porque o “governo não faz o dever de casa” é de um primarismo imenso e não pode ser levado a sério. Enfim, é preciso desarmar os espíritos e avaliar com equilíbrio a situação atual e unir esforços para se buscar soluções que promovam o efetivo desenvolvimento econômico.
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