Nesta segunda-feira (19), o presidente Jair Bolsonaro estava a quase 9 mil quilômetros de distância de Brasília. Exposto a um dia de clima ameno, em torno de 17 graus nesta manhã de outono na Inglaterra. Mas apesar da distância e da temperatura agradável, Bolsonaro não abriu mão dos seus velhos hábitos brasileiros. Começou o dia xingando os jornalistas. E continuou aproveitando os funerais da rainha Elizabeth II para fazer política.
O que poderia ser engraçado, se não fosse trágico, é que Bolsonaro irritou-se com os jornalistas somente porque eles perceberam qual era a sua intenção ao resolver, a dois domingos do primeiro turno da eleição, deixar Brasília para desembarcar em Londres. O motivo da irritação de Bolsonaro foi com o fato de os jornalistas fazerem a ele perguntas sobre política. “Você acha que eu vim aqui fazer política? Pelo amor de Deus, faça uma pergunta decente!”, cobrou Bolsonaro para interromper a entrevista em seguida.
Veja aqui o comentário em vídeo:
O problema é que, minutos antes, conversando com apoiadores, foi exatamente política a única coisa que Bolsonaro fez. “Como está a Europa perto do Brasil?”, perguntou Bolsonaro para o seu “little fence”, se podemos traduzir assim “cercadinho”. Para puxar em seguida o tom da sua campanha nos últimos dias: “Por que a insistência em querer botar um ladrão de volta na Presidência da República?”. E concluir com a chorumela de quem viajou para Londres em avião particular, hospedou-se em hotel de luxo e depois seguirá da mesma forma para Nova York: “Alguém acha que é uma maravilha ser presidente?”
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Juntou-se, assim, no outono londrino, na despedida da rainha Elizabeth, mais um hábito brasileiro de Bolsonaro: a preferência pelo “little fence”, onde os “cheerleaders” (podemos traduzir assim a turma do cercadinho?) urram com qualquer resposta e não o questionam.
PublicidadePelo amor de Deus, presidente, o senhor poderia ter dado uma resposta mais decente às perguntas que não eram indecentes… Não houve a menor dúvida que Bolsonaro foi a Londres fazer política enquanto os ingleses pranteavam a morte da sua rainha. Como será política o que Bolsonaro fará em Nova York na Assembleia das Nações Unidas. Ok, o discurso de abertura na assembleia da ONU é uma tradição. Mas não é tradição fazer motociata pelas cidades americanas. Nem faz parte da tradição se encontrar com líderes conservadores para uma última tentativa de demonstração de apoio internacional (com o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, ele não irá se encontrar).
O problema para Bolsonaro, a essa altura, é conseguir obter de fato dividendos com esses movimentos. Pelo que mostram as últimas pesquisas, porém, ele não vem conseguindo. Mesmo levantamentos que vinham sendo mais favoráveis a ele, por algumas diferenças de metodologia, já começam a ficar próximos dos percentuais dos demais. Na pesquisa do Instituto FSB para a BTB Pactual divulgada nesta segunda, seu adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, subiu três pontos, de 41% para 44%, e ele ficou estacionado nos mesmos 35%. Juntou-se uma outra péssima notícia para ele: pararam os crescimentos de Ciro Gomes, do PDT, e Simone Tebet, do MDB, que têm levado a disputa para o segundo turno. Ciro caiu de 9% para 7% e Simone de 7% para 5%.
Os números são semelhantes ao da pesquisa do Ipespe para a Associação Brasileira de Pesquisadores Eleitorais (Abrapel), divulgada no fim de semana, onde Lula apareceu com 45% e Bolsonaro com os mesmos 35%.
O agregador de pesquisas do jornal O Estado de São Paulo, que tira uma média dos principais levantamentos de intenção de voto, mostra Lula com 50% dos votos válidos. Ou seja, com uma chance de vencer ainda no primeiro turno. Passar para o segundo turno, portanto, é agora a principal tarefa de Bolsonaro. Para tentar mais duas semanas de remada em mar revolto. Porque ele perde as eleições em todas as simulações de segundo turno.
Se, nesse cenário, Bolsonaro passasse um segundo sequer da sua vida fazendo outra coisa que não fosse política, o errado seria ele. Não os jornalistas e suas perguntas. Se ele encerra abruptamente entrevistas a essa altura, problema dele. Os jornalistas não vão parar de tentar cumpriu com o seu papel.