Eu confio e gosto de pesquisas eleitorais. Mas devemos ter cuidado com o que tiramos delas.
Após Bolsonaro demonstrar melhoria nas intenções de voto, surgiram, e com abundância nas redes sociais, muitas interpretações das pesquisas. Há interpretações estáticas e dinâmicas. As primeiras importam, mas as segundas importam muito mais.
Um grupo comemora as pesquisas. E aqui lembramos novamente o calendário de Ciro Nogueira que já comentamos em outras ocasiões, o qual projeta empate entre Bolsonaro e Lula já em maio. Para esses, os ganhos nas intenções de voto em finais de março e início de abril mostram que Bolsonaro irá reverter o quadro negativo. Quais as razões levarão a isso não se explicitou adequadamente – talvez a distribuição de dinheiro, melhor propaganda, discurso menos radical, palanques mais fortes etc.
Os que querem tirar Bolsonaro da presidência em 2023 postam-se do outro lado. Aqui abundam as interpretações.
As estáticas são várias. Alguns somam os votos de quem ficará de fora no segundo turno – conforme o quadro de hoje – e os distribuem entre Lula e Bolsonaro. Avalia-se o impacto da saída de Sergio Moro e vê-se, para Bolsonaro, “a volta dos que não foram”, com o retorno de bolsonaristas meio insatisfeitos. A taxa de rejeição também é vista como um teto e fazem-se considerações sobre até onde um candidato pode crescer. Outros questionam a metodologia das pesquisas, desde os recortes de idade até a forma se presencial ou telefônica. Entram em detalhes dos vieses de uma pesquisa que use mais telefones fixos, questionam se pessoas pobres atendem mais ao telefone celular, etc.
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Interpretações estáticas iluminam o quadro de hoje. Contudo, grave é que muitas dessas interpretações funcionam como elementos de esperança infelizmente falsas. Não adianta extrapolar o quadro atual para o futuro porque ele será diferente, novos elementos entrarão em cena. E aí avançamos para as análises dinâmicas.
PublicidadeQuando alguns olharam a taxa de rejeição como um teto, isso é real. Contudo, o teto se move, a depender da avaliação do governo e dos próprios candidatos. Igualmente, a distribuição dos votos daqueles que não alcançarem o segundo turno pode se dar de muitas formas, a depender da tônica da eleição, das mensagens fortes na hora da campanha. Nada, hoje, é garantido.
Assim, mais importante do que mostram as pesquisas agora, é o fato de que taxas de rejeição, intenção de voto e temas mais importantes podem variar.
Hoje o governo é mal avaliado – a economia patina e continuará assim até outubro –, mas está distribuindo dinheiro adoidado para reverter votos. O tema da corrupção tenta ser levantado pelo governo, contudo, ele luta com suas próprias denúncias e problemas. Ainda, a manutenção da democracia, os direitos humanos e a proteção ao meio ambiente falam permanentemente a determinados grupos da sociedade, assim como a agenda moral e a corrupção.
Então, as pesquisas de hoje mostram um Lula ainda com certo conforto e um Bolsonaro ganhando posições. Contudo, para frente não há segurança da manutenção do quadro atual.
O que se vê agora é Bolsonaro com uma campanha em plena ação, com dinheiro e conivência de todas as autoridades de controle (o que foi a motociata senão campanha antecipada?). De outro lado, Lula avança com uma campanha ainda não estruturada, sem discurso claro, perdendo-se em temas que mais atrapalham do que ajudam, como as críticas à classe média. E nos interstícios a terceira via busca forma de se viabilizar.
O que importa no final das contas é quem vai conseguir modular o discurso às pretensões do eleitorado, e levar os temas da campanha para a seara que lhe for mais confortável: combate à corrupção, melhoria de vida, mudança, renovação, segurança etc.
Se a oposição pretende vencer a eleição, precisa abandonar o ainda confortável quadro das pesquisas de hoje e colocar na rua uma campanha organizada que foque na crise econômica e na necessidade de manter a democracia. Module seus discursos a cada público e sua necessidade, sempre com a mensagem que quer unir a nação, gerar prosperidade econômica e manter a verdadeira liberdade democrática, aquela que serve para nós e também para nossos adversários. Sem profissionalismo na campanha o barco vai pro brejo.
PS: a dificuldade de organizar uma campanha é que ela é distribuição de poder, já é um pré-governo. Abundam as cotoveladas e disputas por espaço.
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