Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) apontam que desde a década de 1980 o estado do Pará perdeu 148,3 mil quilômetros de florestas. A maior perda coincide com o período de exploração desregrada em garimpos como Serra Pelada. Essa área é equivalente a de todo o estado do Ceará.
Algumas regiões da França onde aconteceram as batalhas de trincheiras na Primeira Guerra Mundial padecem da devastação ambiental até hoje. Por esporte, caubóis durões como Buffallo Bill ficavam das janelas dos trens nos Estados Unidos atirando nas manadas que pastavam nas pradarias. A população de búfalos americanos foi extinta.
A mentalidade colonialista europeia inventou o termo “selvagem” para designar os povos originários que foi encontrado nos novos continentes que ocupava desde o século 16. Mas a cada momento somos nós, os ditos “civilizados”, que damos mostras de selvageria. Com um agravante: as tecnologias que vamos desenvolvendo multiplicam esse poder de destruição.
No Congresso em Foco, há dois exemplos de como se opera essa selvageria. Na cidade de Belterra, no Pará, as plantações de soja vão invadindo por sobre tudo. Uma pequena escola de ensino fundamental ficou ilhada no meio das plantações. Sem dar a menor satisfação às crianças que ali estudam e às professoras que ali trabalham, borrifou-se agrotóxico indiscriminadamente. Resultado: as aulas tiveram de ser suspensas porque se tornou impossível manter as crianças ali. Ali, as crianças e as professoras ainda resistem. Uma escola próxima a outra plantação já foi abandonada.
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A despeito da tragédia ocorrida na região Yanomami, deputados ligados á área de mineração se articulam para abrir na Amazônia, dentro de terras indígenas, um ponto de escavação de potássio. No ano passado, o Congresso aprovou o requerimento de urgência para PL 191/2020, que permite a mineração em terra indígena.
Em visita esta semana à região Yanomami, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, pôde constatar de perto o tamanho da tragédia. De forma indiscriminada, os garimpos de ouro devastam os leitos dos rios. Com o uso de grandes mangueiras que vão jogando fortes jatos de água, as margens dos rios são devastadas. O uso do mercúrio para tornar as pedras mais pesadas polui as águas. Os indígenas ficam sem água para beber. Assim como os animais que eles caçariam. Os peixes desaparecem. Sede, fome, desnutrição, doenças, são as consequências.
Como no caso das crianças na escola no Pará, fica claro que a ambição desmedida pelas riquezas do solo – sejam elas minerais ou pela fertilidade agricultável – chega ao paradoxo de dispensar os próprios seres humanos. A despeito da nobre tarefa de “gerar riqueza”, expulsa-se – ou, pior, mata-se – o ser humano. Expulsa-se – ou, pior, mata-se – o animal que ali habita. O processo final de toda essa loucura é o esgotamento total da área. Como a lama nua que ficou em Serra Pelada. Acaba-se o ouro, abandona-se a terra. Esgota-se ela, planta-se em outro lugar.
Nosso problema é que com nossa capacidade inesgotável de destruição vamos a cada dia tornando maior a devastação. Boa parte das nações e das pessoas que já começaram a compreender isso. Somos vítimas da nossa própria “selvageria”. Somos vítimas da nossa própria “civilização”…