Luci Maria Teston *
Há entendimentos divergentes sobre meio ambiente entre os sete candidatos a governador do Acre em seus planos de governo. Propostas desde zerar o desmatamento ilegal até a necessidade de reformar as consideradas “draconianas” leis ambientais do estado são apresentadas nos documentos.
Como última fronteira a ser incorporada ao sistema econômico dominante, a Amazônia vem se tornando o centro de discussões globais envolvendo o meio ambiente. Parte deste debate relaciona-se aos desafios decorrentes da exploração ilegal de madeira, do avanço da agropecuária e da mineração. Regionalmente, permanece o eterno dilema entre preservação e desenvolvimento econômico.
A poucas semanas para as eleições gerais, o plano dos principais candidatos a governador do Acre foram analisados quanto à inclusão da problemática ambiental, considerando as ações propostas pelos postulantes ao cargo.
Gladson defende regularização ambiental e manejo florestal sustentável
Favorito nas últimas pesquisas, o governador Gladson Cameli (PP), eleito no primeiro turno em 2018 na onda do conservadorismo, busca a reeleição. Disputa os votos bolsonaristas com antigos aliados, os senadores Sérgio Petecão (PSD) e Márcio Bittar (União Brasil), além de Mara Rocha (MDB), deputada federal eleita com o maior percentual de votos nominais no Acre nas últimas eleições.
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Em seu plano “Compromissos de governo”, o candidato traz a questão ambiental como eixo estratégico e propõe ações relacionadas à área ambiental, boa parte associada ao ordenamento territorial, regularização ambiental e fundiária. Defende a desburocratização do sistema de licenciamento ambiental e o apoio à expansão da prática de manejo florestal sustentável.
Gladson pretende ainda contribuir para a redução dos impactos ambientais oriundos do descarte de resíduos sólidos, investir em fontes renováveis de energia e atuar de forma integrada com organismos nacionais e internacionais pela redução dos impactos causados pelas mudanças climáticas.
Jorge Viana fala em “agronegócio sustentável”
O ex-governador por dois mandatos, Jorge Viana (PT), tenta retomar o domínio petista no estado. O partido esteve no poder por vinte anos anos, a mais duradoura hegemonia na história política do Acre. É o único dos candidatos competitivos que aglutina os votos dos eleitores lulistas e petistas.
Com maior destaque ao meio ambiente se comparado aos demais, o plano “Compromissos para melhor servir ao povo acreano” inclui somar-se ao esforço mundial contra a crise climática e a retomada de ações de combate ao desmatamento ilegal. Também propõe “reformar os regulamentos e o sistema de licenciamento do manejo florestal madeireiro”, “criar incentivos para restauração e recomposição florestal”, bem como “combater todo e qualquer tipo de grilagem e invasão de terras e contribuir na mediação de conflitos agrários”.
No plano é detalhado o conceito de “agronegócio sustentável” e sugeridos caminhos possíveis para uma agenda de desenvolvimento econômico com foco nas áreas de floresta e de agropecuária. Estes caminhos incluem a “restauração da floresta original” e o aumento das exportações de produtos compatíveis com a sua conservação. Além disso, propõe “aproveitar as oportunidades apresentadas pelos mercados de carbono para as partes da floresta que ainda estão de pé” e sugere criar “oportunidades para aumentar a produtividade agrícola no Acre” para atender a demanda de expansão do agronegócio.
Petecão pretende revisar e implementar plano de combate ao desmatamento
Apesar do tema não constar como um eixo estratégico no plano de governo do candidato do PSD, o senador Sérgio Petecão elenca oito ações relacionadas à agenda ambiental. No documento “Com a Força do Povo” propõe fortalecer a gestão nas unidades de conservação estadual, revisar e implementar o Plano de Gestão de Recursos Hídricos e o Plano de Combate ao Desmatamento e Queimadas Ilegais.
Outras propostas visam criar e fortalecer os programas de regularização de vazios fundiários nas regionais do estado, bem como realizar campanhas educativas de preservação ambiental e de uso consciente da água.
Bittar defende reforma nas “draconianas leis ambientais do estado”
Ao ganhar projeção como relator do Orçamento da União em 2021, o candidato do União Brasil, senador Márcio Bittar, traz em seu plano a defesa do governo federal e tece críticas à forma como foi e é conduzida a política ambiental.
Em “Ordem, Progresso e Competência para fazer”, critica a ideia de intocabilidade da região Amazônica. Dificuldades estariam sendo impostas para “atender interesses estrangeiros, alguns explícitos e outros ocultos, e não permitir que a região seja um celeiro de produção”.
O candidato propõe flexibilizar as leis ambientais para tornar a região um “celeiro de produção” e enfatiza a “loucura que foi a tal da florestania”, conceito elaborado durante o governo de Jorge Viana, que teria obtido resultados para além de “discursos submissos e ofensivos à soberania nacional”.
Também critica a postura do atual governo estadual, enfatizando não haver vontade política nem “coragem para fazer uma reforma, mínima que fosse, nas draconianas leis ambientais do estado. Tudo continuou travado e nada mudou”.
No documento são elencadas três ações pontuais relacionadas à pauta ambiental: “remoção de inibidores à exploração da terra”, “alocar recursos e programas de fomento que destravem a exploração da terra e da própria floresta com o menor dano possível”, além de “recuperar centenas de milhares de hectares de terras degradadas”, incentivando sua exploração.
Perspectivas e desafios para o meio ambiente
Apesar dos dados alarmantes de desmatamentos e queimadas na Amazônia, quando são analisadas percepções do eleitorado da classe C, o tema apresenta-se como secundário em comparação com economia e saúde pública, sendo considerado assunto pouco sensível para esta população.
Não obstante essa percepção, torna-se difícil desconectar o meio ambiente das questões econômicas e sociais. Há importantes relações entre meio ambiente e economia. Também não se pode desconsiderar a conexão com a saúde pública quando se observa o crescimento considerável de doenças respiratórias decorrentes da baixa qualidade do ar em função das queimadas em períodos de seca. Somente no Acre, entre agosto de 2021 e julho deste ano, foram desmatados 865 km², segundo dados do Imazon.
Essa incompreensão em relação ao meio ambiente e sua conexão com a vida das pessoas pode ser uma das respostas às diversas formas como o tema é apresentado no plano de governo dos candidatos.
Uma transformação da ordem estabelecida pressupõe trazer o meio ambiente para o centro das discussões e não como um elemento periférico no debate eleitoral. Enxergá-lo como um tema que permeia e é permeado, influencia e sofre as consequências de decisões em outros campos. A vida das pessoas é afetada pelo meio ambiente, mesmo que elas não se deem conta disso.
* Luci Maria Teston é professora no Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Acre (UFAC). Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP) e mestra em Ciência Política pelo antigo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Graduada em Direito, em Administração e em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo.
Esse artigo foi elaborado no âmbito do projeto Observatório das Eleições 2022, uma iniciativa do Instituto da Democracia e Democratização da Comunicação. Sediado na UFMG, conta com a participação de grupos de pesquisa de várias universidades brasileiras. Para mais informações, ver: www.observatoriodaseleicoes.com.br.
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