André Neto *
Como está sendo amplamente considerado, o bolsonarismo não finda com a derrota de Bolsonaro nas urnas. Os recentes atos antidemocráticos, com os bloqueios das vias federais, e os casos de violência e morte de eleitores de Lula que celebravam o resultado das urnas, são provas inequívocas que o modelo trumpista adotado pelo atual mandatário está em vigor. Do mesmo modo que a insatisfação com a derrota se mostrou violenta nas rodovias, a violência simbólica se instaurou no mesmo instante que a apuração dos votos indicava uma virada.
A moderação deu lugar a acusações de infidelidade e falsidade da fé. A relação artificial entre o evangelho e o próprio Bolsonaro se mostrou resistente ao bom senso. Como tenho escrito, o bolsonarismo se sobrepôs ao cristianismo. A ideia de que Bolsonaro encarna os valores cristãos tem sido o principal elemento de defesa da sua eleição. Com a sua derrota, atribuída a pastores e membros que não votaram nele, abastecidos por vídeos de famosos lideres e influenciadores cristãos, uma parcela dos evangélicos preveem um tempo de perseguição e de juízo divino sobre a igreja. Os valores cristãos de temperança e paz, fraternidade e justiça, foram trocados por acusações e rupturas, discriminações e inverdades – alguns não se incomodam em divulgar fake news em suas redes, desde que apoiem o atual presidente.
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Por outro lado, nos últimos dias antes do segundo turno, alguns eleitores de Lula, talvez cansados de estarem acuados e silenciosos, começaram a divulgar sua escolha com mais ênfase. Isso também ocorreu nas publicações feitas nas redes sociais com comemorações explícitas após a confirmação da eleição do petista. Já os pastores, especialmente os batistas como eu, preferiram as demonstrações privadas, dificultando a identificação exata da divisão entre eles. Como os batistas têm como princípio as liberdades de consciência e a autonomia da igreja local, não há a possibilidade de uma orientação denominacional para o voto. Já nas denominações protestantes claramente aliadas ao atual mandatário, como a Assembleia de Deus, a divisão se mostra mais evidente.
Os desafios que a igreja evangélica brasileira enfrentará podem ser agrupadas em três tempos. A curto prazo, é imperativo pacificar os ânimos e manter a unidade da congregação. A médio prazo, será necessário desbolsonarizar a igreja demonstrando com argumentos bíblicos-teológicos em linguagem simples e acessível, que esta filosofia é contrária à fé cristã. A longo prazo, é mister educar para a liberdade, formando uma consciência cristã que seja firmada no Cristo, fiel aos seus ensinos e seu exemplo, imune de partidarismos e de parasitismos oportunistas.
*Os textos publicados pelo Observatório Evangélico trazem a opinião e análise dos autores e não refletem, necessariamente, a visão dos demais curadores ou da equipe do site.
Publicidade* André Neto é pastor da Primeira Igreja Batista de Ubatã (BA). Foi ordenado em 2012, tendo sido antes pastor auxiliar na Igreja Batista da Pituba, em Salvador (BA), e pastor auxiliar na Igreja Batista da Avenida, em Feira de Santana (BA). Licenciado em História pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Bacharel em Teologia pelo Seminário Teológico Batista do Nordeste (STBNE) e mestre em História pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Além de pastor, é professor do Seminário Teológico Batista do Nordeste e bacharelando em Mídias e Tecnologias pela Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB). Ele pode ser contatado pelo e-mail: pr.andreneto@gmail.com ou pelo Instagram: @prandreneto.
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