Muita tinta já foi gasta para decifrar o suposto “recado das urnas” em 2024 e suas consequências para a sucessão presidencial em 2026. Já expus aqui, com base na reflexão teórica, mas sobretudo, na experiência política concreta, que há baixíssima conexão entre os resultados das eleições locais intermediárias e os cenários para o futuro no plano nacional. Vivemos sob um presidencialismo bastante peculiar e um sistema político, partidário e eleitoral “sui generis”.
Os partidos, em sua esmagadora maioria, não têm identidade ideológica clara, organicidade, democracia interna, unidade nacional, e se norteiam por excessivo pragmatismo. As bancadas no Congresso dividem-se ao meio em votações cruciais. Prefeitos e vereadores não obrigatoriamente seguem a orientação partidária nas eleições presidenciais.
Por outro lado, as eleições presidenciais no Brasil são dominadas pela relação direta do candidato com o eleitorado, sem mediação institucional, vale dizer, dos partidos e das lideranças regionais e locais, sobretudo na era da TV e das redes sociais. O carisma individual e a capacidade de comunicação e mobilização valem muito mais que estruturas partidárias, embora algum tempo de TV, capilaridade orgânica e um mínimo competitivo de financiamento de campanha sejam importantes. Vargas, JK, Jango, Collor, FHC, Lula, Bolsonaro foram ou são muito maiores que suas estruturas partidárias.
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Portanto, as análises “tour de force” que partem dos números das eleições de 2026 para projetar o fortalecimento ou a decadência de Lula ou Bolsonaro, ou do espaço para uma futura terceira via, não passam de futurologia de baixa qualidade, sem base empírica ancorada na experiência histórica. As eleições de 2026 dependerão muito mais da situação econômica da época, do grau de satisfação da população, da elegibilidade ou não de Bolsonaro, do estado de saúde de Lula, e da ousadia do centro político de aparecer com cara própria ou se acomodar em posição subalterna aos dois polos mais bem situados, de início, no tabuleiro eleitoral.
O quadro partidário brasileiro atual tem sua órbita em torno de três campos ideológicos e um pragmático. O PL e o Novo formam um polo que procura agregar elementos do pensamento conservador e liberal, embora haja contradições entre uma coisa e outra. O PT lidera um bloco de esquerda que reivindica as tradições de um socialismo às vezes anacrônico formado por Psol, PSB, Rede, PCdoB e PV. Sobrevive ainda um polo que já teve peso político e vive hoje dificuldades conjunturais e indefinição de rumos, que espelha o movimento socialdemocrata e trabalhista, unindo PSDB, Cidadania, Solidariedade, e, com outra dinâmica, o PDT. Mas os “grandes vitoriosos” foram os partidos pragmáticos, que fazem um movimento pendular entre esquerda, direita e centro, tendo dado relativo apoio parlamentar e participado do ministério dos governos FHC, Lula, Dilma, Temer e Bolsonaro. É difícil saber como se comportarão, em 2026, cinco dos seis partidos que fizeram entre 440 e 891 prefeitos (PSD, MDB, PP, União Brasil e Republicanos).
Quem disser que sabe, pode estar delirando, mentindo ou mal-informado. A única coisa que antevejo com alguma certeza é que eles terão grandes bancadas no Congresso e farão parte do ministério de qualquer futuro governo, seja de direita, de esquerda ou de centro. Quem viver, verá!
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