Sara Campos *
A “surpresa” do presidente Lula ao ver que existe muita gente negra no Rio Grande do Sul amplificou uma realidade: a população negra gaúcha está, sem dúvida, entre as mais afetadas pelas mudanças climáticas. Grande parte dessas pessoas vive à margem da sociedade em locais considerados de grande risco de desmoronamento e com precária infraestrutura para enfrentar esta tragédia mais que anunciada.
As doações recebidas pelo governo do Rio Grande do Sul não chegaram à população negra do estado por diferentes motivos: famílias que receberam notificação da Defesa Civil para saírem de suas casas foram acolhidas em residências de familiares ou em terreiros de religiões de matriz africana (o estado do Rio Grande do Sul registra o maior número de terreiros em atividade do país). Ambos os cenários não configuram em ambientes que recebem ajuda institucional, o que mostra a fragilidade do Estado na gestão de uma crise que não tem data para acabar.
Até a fala do presidente Lula durante um discurso na última quarta-feira (15), o termo racismo ambiental não era visto com frequência na grande mídia. Essa afirmação do petista jogou holofotes em um problema antigo. A definição da pensadora negra Tania Pacheco reúne com maestria todos os elementos que integram o racismo ambiental: “ele é constituído por injustiças sociais e ambientais que recaem de forma implacável sobre etnias e populações mais vulneráveis. O Racismo Ambiental não se configura apenas através de ações que tenham uma intenção racista, mas, igualmente, através de ações que tenham impacto “racial”, não obstante a intenção que lhes tenha dado origem”.
Ao entendermos esse conceito com o letramento racial que precisamos mais que nunca valorizar e compreender verdadeiramente, não podemos esquecer das etnias indígenas que fazem parte das Populações Tradicionais que conservam modos de vida em seus territórios – entre elas Guarani, Mbia Guarani, Kaingang e Charrua – que somavam 18,5 mil indígenas segundo o levantamento do Atlas Socioeconômico do Rio Grande do Sul, publicado pelo governo do Estado em 2010.
Mas como ajudar diretamente essas populações?
PublicidadeA comunicadora socioambiental, nutricionista e influenciadora digital gaúcha Bruna Crioula, da Crioula Curadoria Alimentar, lançou o FUNDO Crioula: direcionado a doações em defesa do povo negro do Estado. As doações são direcionadas a povos tradicionais de matriz africana, Comunidades Quilombolas e famílias negras periféricas. A iniciativa recebe doações pelo PIX oi.crioula@gmail.com . Entre os projetos ajudados pelo Fundo estão Quem tem pouco ajuda a quem não tem nada, Biblioteca Comunitária Aninha Peixoto, Associação Mães Pretas e Coletivo Mães da Periferia.
O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) tem mais de 50 anos de história e distribui doações entre os parentes indígenas pelo pix mobiliza@cimi.org.br. Em Brasília, a Funai está arrecadando agasalhos no ponto de coleta que fica no Edifício Parque Cidade Corporate, no Setor Comercial Sul, quadra 9, Lote C, no hall de entrada da torre B. Sempre estamos em tempo de praticar nossa reparação histórica a essas comunidades que tanto contribuem para nosso país.
* Sara Campos é jornalista socioambiental e mestranda da pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural pela UnB. Trabalhou em veículos como Correio Braziliense, Folha de S.Paulo e Editora Abril cobrindo pautas de gastronomia, alimentação e ruralidades. É coordenadora da Agência Cajuí, focada em comunicação para a sociobiodiversidade, onde realizou consultorias para Organizações Não-Governamentais como Slow Food Brasil, MIQCB, IEB, WWF-Brasil e GIZ.