Henrique Fontana *
A necessidade de uma reforma política ampla que faça avançar a democracia brasileira é urgente, mas sua tramitação ainda tropeça em visões e interesses que ainda dominam as práticas parlamentares do país. É necessário avançar em mudanças que radicalizem a questão democrática e consagrem o preceito absoluto inscrito na Constituição Federal em seu art. 1º, parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
O ponto central para a afirmação deste preceito é a legitimidade dos mandatos. Nesse sentido, apresentamos a proposta de emenda constitucional (veja a íntegra mais abaixo), determinando a convocação de eleições diretas sempre que o mandato presidencial for interrompido em definitivo por qualquer razão. O mesmo vale para governadores e prefeitos.
Pela lei atual, no caso de vacância de algum desses cargos executivo, o vice assume até o final do mandato, o que configura uma tremenda distorção do ponto de vista democrático. Ninguém vota para vice no sistema atual. Seu nome sequer consta da cédula eletrônica, e muitos brasileiros não sabem quem é o vice-prefeito de sua cidade, o vice-governador de seu estado ou até o nome do vice-presidente da República. No entanto, essa situação tem sido o pivô de crises políticas e conspirações em vários lugares do país. Não é raro termos notícias, por exemplo, de vice-prefeitos que negociam com as casas legislativas para cassar o prefeito por qualquer motivo e, assim, assumirem o cargo.
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Nossa PEC é clara: no caso de interrupção do mandato presidencial, o poder imediatamente volta ao povo que elegerá seu substituto através de eleições diretas 90 dias após a vacância do cargo. O vice terá a função de ocupar a Presidência na ausência do titular temporariamente, mas em nenhuma hipótese em definitivo. Ao mesmo tempo, a proposta afasta alternativas esdrúxulas que às vezes surgem como a eleição indireta do substituto através do Congresso. Propomos também que, caso a interrupção ou vacância ocorra no último ano do mandato vigente, as eleições devem ser antecipadas, ou seja, o eleito agrega esse tempo restante ao seu mandato.
É preciso reforçar o Estado Democrático de Direito, afirmar o poder que emana do povo e ressignificar nossa democracia devolvendo aos cidadãos o direito de eleger representantes, especialmente, o mandatário maior da nação. A crise política e institucional deixou de ser conjuntural e passou a ser estrutural, atingindo todas as instituições do Estado brasileiro, direitos e garantias constitucionais, com graves consequências sociais e econômicas para o país.
PublicidadeA grande luta do povo brasileiro pela redemocratização do país, após mais de 20 anos de ditadura; as manifestações populares pelas Diretas Já!, em 1985, que marcaram o início do período democrático nacional; a crescente crise de representatividade da democracia vivida no país e no mundo; a crise política brasileira em curso e o contestado impeachment da presidenta Dilma Rousseff revelam um cenário de mobilização popular no qual a sociedade afirma querer mais participação política, deseja escolher diretamente seus representantes e exige mais democracia.
O remédio mais eficaz para a crise é a democracia, valor basilar e universal. E o povo é o único portador desta universalidade e legitimidade.
* Henrique Fontana, médico e administrador de empresas, é deputado federal pelo PT do Rio Grande do Sul
Veja a íntegra da PEC:
“PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N° , DE 2019.
(Do Sr. Deputado Henrique Fontana – PT/RS e Outros)
“Altera os artigos 28, 29, I, 32, §2º, 77, §1º, 78, parágrafo único, 79, 80 e 81 da Constituição Federal para dispor sobre substituição do cargo de Presidente da República, bem como de Governadores e Prefeitos, em caso de impedimento temporário e eleição direta em caso de vacância do cargo, estabelecendo que em nenhuma hipótese o vice assumirá o cargo em definitivo. ”
As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte emenda ao texto constitucional:
Art. 1º. A presente Emenda Constitucional altera os artigos 28, 29, I, 32, §2º, 77 e seu §1º, 78, parágrafo único, 79, 80 e 81 da Constituição Federal para dispor sobre a substituição do cargo de Presidente da República, bem como de Governadores e Prefeitos, em caso de impedimento temporário e eleição direta em caso de vacância do cargo, estabelecendo que em nenhuma hipótese o vice assumirá o cargo em definitivo.
Art. 2º. Os artigos, 28, 29, I, 32, §2º, 77, §1º, 78, parágrafo único, 79, 80 e 81 da Constituição Federal, passam a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 28. A eleição do Governador, com um Vice-Governador de Estado, para mandato de quatro anos, realizar-se-á no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato de seus antecessores, e a posse ocorrerá em primeiro de janeiro do ano subseqüente, observado, quanto ao mais, o disposto no art. 77
Art. 29. (…)
I – eleição do Prefeito, com um Vice-Prefeito e dos Vereadores, para mandato de quatro anos, mediante pleito direto e simultâneo realizado em todo o País;
Art. 32. (…)
- 2º A eleição do Governador, com um Vice-Governador, observadas as regras do art. 77, e dos Deputados Distritais coincidirá com a dos Governadores e Deputados Estaduais, para mandato de igual duração.
Art. 77. A eleição do Presidente realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano anterior ao do término do mandato presidencial vigente.
- 1º. O Presidente da República será eleito com um Vice-Presidente.
Art. 78. (…)
Parágrafo único. Se, decorridos dez dias da data fixada para a posse, o Presidente, com seu Vice-Presidente, salvo motivo de força maior, não tiver assumido o cargo, este será declarado vago.
Art. 79. Substituirá o Presidente, no caso de impedimento temporário, o Vice-Presidente.
Art. 80. Em caso de impedimento do Presidente ou vacância do cargo, serão sucessivamente chamados ao exercício temporário da Presidência, o Vice-Presidente, o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.
Art. 81. Vagando o cargo de Presidente da República, em qualquer época, far-se-á eleição direta noventa dias depois de aberta a vaga.
- 1º. Se as eleições diretas, na sua conclusão, corresponderem a menos de um ano do término do mandato, dá-se à mesma o caráter antecipatório do mandato seguinte, somando o tempo restante ao próximo mandato presidencial.
- 2º Em nenhuma hipótese o Vice-Presidente da República assumirá a Presidência em definitivo.
Art. 3º. Esta Emenda Constitucional entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Em momento de grave crise institucional e de legitimidade da representação política no Brasil é preciso radicalizar a questão democrática e fazer imperar um valor absoluto inscrito na Constituição Federal em seu art. 1º, parágrafo único: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.
Assim, conscientes da dimensão da crise vivida pelo país e imbuídos em garantir o exercício direto da democracia pelo povo brasileiro, nos termos da CF, se faz necessário que o Congresso Nacional revise urgentemente os artigos em questão, que determina, de um lado, a substituição do chefe do poder executivo pelo vice e, de outro, a esdrúxula previsão de eleições indiretas para o preenchimento de cargos eletivos do Poder Executivo.
A grande luta do povo brasileiro pela redemocratização do país, após mais de vinte anos de ditatura; as manifestações populares pelas Diretas Já!, em 1985, que marcaram o início do período democrático nacional; a crescente crise de representatividade da democracia vivida no país e no mundo, demonstrada pela Primavera Árabe, pelos Indignados da Espanha ou nas jornadas de junho de 2013 no Brasil; a crise política brasileira em curso e o contestado impeachment da Presidenta Dilma Rousseff; revelam um cenário de mobilização popular nos quais a sociedade afirma querer mais participação política, deseja escolher diretamente seus representantes, e exige mais democracia. A democracia é valor basilar e universal, e o povo é o único portador desta universalidade e legitimidade.
De outra parte, o evidente esgotamento do sistema eleitoral nacional, sobretudo na espera por uma reforma política, sempre discutida, nunca realizada plenamente; e a necessidade de repactuação do contrato democrático nacional, indicam que a eleição indireta do Presidente da República pelo Congresso Nacional não configura a melhor solução para a crise por dentro da democracia vigente.
É preciso reforçar o Estado Democrático de Direito, afirmar o poder que emana do povo e ressignificar nossa democracia devolvendo aos seus cidadãos o direito de eleger representantes, especialmente, o mandatário maior da nação.
A crise política e institucional deixou de ser conjuntural e passou a ser estrutural, atingindo todas as instituições do Estado brasileiro, direitos e garantias constitucionais, com graves consequências sociais e econômicas para o país.
Nesse sentido, apresentamos esta proposta de emenda constitucional, propondo eleições diretas sempre que o mandato presidencial for interrompido por qualquer motivo ocorrido dentro da ordem constitucional.
A proposta estabelece ainda, que o Vice-Presidente da República, assim como os Vice-Governadores e Prefeitos, conquanto registrados juntamente com o candidato principal, serão apenas auxiliares temporários no que diz respeito à assunção da chefia do Poder Executivo, sem prejuízos de outras atribuições legais e/ou constitucionais, de modo que em nenhuma hipótese poderão substituir, em definitivo, o titular eleito.
Privilegia-se, desta forma, o princípio democrático, devolvendo ao titular do poder (povo), nos casos de impedimentos definitivos ou vacância, a escolha do mandatário da Nação, dos Estados e dos Municípios, através de eleições diretas.
A proposta de emenda constitucional prevê, ainda, que se a interrupção ou vacância ocorrer no último ano do mandato vigente, as eleições devem ser antecipadas.
Nessa perspectiva, esperamos contar com o apoiamento de nossos nobres pares.
Sala das Sessões, em 19 de fevereiro de 2019.
Henrique Fontana
Deputado Federal PT/RS”