Helena Wajnman Lima*
Que diferença faz a boa liderança? É difícil precisar o impacto dos líderes porque é praticamente impossível estudar o contrafactual do que teria acontecido caso determinado líder não tivesse assumido o poder. Se alguém diz que um líder foi determinante, imprescindível, revolucionário, sempre pode haver contra argumentos de que o que fez mesmo a diferença foi o projeto de poder, o grupo político ou a conjuntura nacional ou internacional. Mas com um pouco de criatividade e algumas técnicas econométricas dá pra jogar um pouco de luz a essa discussão.
Em um paper de 2009, Benjamin Jones e Benjamin Olken tentam responder a essa pergunta utilizando experimentos naturais. Experimentos naturais são variações que ocorrem quase que ao acaso ou, pelo menos, à revelia do impacto que se quer medir. No experimento natural de Jones e Olken, os autores analisam tentativas de assassinatos de líderes de Estado e comparam as vitoriosas e as fracassadas. Os contextos que levam a tentativas de assassinato de líderes podem ter muito em comum, de deterioração econômica a instabilidade política. Mas o fato de uma tentativa ter sucesso ou não pode se dar quase ao acaso. Quando o líder sucumbe, há uma ruptura de poder. Quando o líder não é atingido, em geral, há continuidade. Analisando inúmeras tentativas agregadas (e não foram poucas: desde 1950, um líder nacional foi assassinado em dois a cada três anos até a publicação do paper), pode-se chegar a algumas conclusões sobre a importância da figura de um líder.
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Jones e Olken encontram que os assassinatos de líderes autocratas geram mudanças substanciais nas instituições de um país, enquanto assassinatos de líderes democratas não. Há aí uma distinção fundamental. Uma interpretação plausível é que as democracias têm instituições mais fortes por si próprias e são, portanto, mais difíceis de desarranjar em função de uma pessoa. Por outro lado, autocracias dependem muito da figura de um líder e têm muito a perder (ou ganhar) se esse líder sai de cena.
Em outro artigo, os mesmos autores exploram mortes naturais ou acidentais de líderes enquanto no poder e concluem que as lideranças exercem individualmente importância crucial sobre o desenvolvimento econômico. Mais uma vez, em contextos ditatoriais, o impacto individual de um líder é mais acentuado, pois o líder encontra menos restrições ao exercício de seu poder.
Podemos tirar muitas lições desses resultados. Em primeiro lugar, queremos um líder competente, sério, inspirador, crível, que saiba articular, gerir e comandar. Se o desenvolvimento da nossa nação vai depender tão fortemente de uma única pessoa, que seja quem esteja mais bem preparado entre nós todos a assumir essa missão. Em segundo lugar, e talvez mais importante, queremos um líder que respeite as instituições democráticas e os limites a seu próprio poder, precisamente para que não seja a sua própria força, humor, caprichos, preconceitos e vontades pessoais a ditarem as regras do jogo. Queremos um estadista. Queremos alguém que governe, inspire, concilie e ouça as legítimas forças políticas e sociais, inclusive daqueles de quem difere em termos de ideologias. Em larga medida, são inclusive essas as características que tornam alguém uma pessoa cujas marcas individuais nós queremos ter em nossas estruturas sociais.
PublicidadeEstamos falando de líderes de Estado, mas poderíamos também falar de quaisquer outros líderes. Profissionais públicos em cargos de liderança, lideranças privadas, lideranças comunitárias, lideranças estudantis e tantas outras. Esperamos líderes que sejam hábeis, visionários e inspiradores, mas que sejam finitos, que se preocupem com sua sucessão, que construam instituições que os limitem e que trabalhem para se fazerem desnecessários.
*Diretora executiva da República.org; mestre em Dados, Economia e Políticas de Desenvolvimento pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT)