Quem acompanha diariamente a rotina do Congresso via que o agora senador Sergio Moro (União Brasil-PR) era até a semana passada figura coadjuvante no Legislativo. Como, no fundo, vinha sendo até então a grande maioria dos oriundos mais radicais do bolsonarismo. O ex-presidente Jair Bolsonaro perdera a eleição. Lula era o novo presidente. O país passara ainda pela absurda tentativa de golpe do dia 8 de janeiro. O líder máximo disso tudo encontrava-se autoexilado nos Estados Unidos, enrolado até o pescoço com a história das milionárias joias ganhas do governo saudita que tentou fazer entrar por aqui de contrabando. Enfim, tratava-se de virar a página de todo esse pesadelo. Mas então Lula resolveu falar de Moro. E apareceu a tal história do plano de assassinato do Primeiro Comando da Capital (PCC). E Lula, novamente, em vez de ficar quieto, outra vez resolveu cutucar Sergio Moro.
Moro agradece. Lula deu a ele um palanque que ele não tinha mais. A chegada de Moro ao campo da política parecia uma apresentação de ginástica olímpica de Rebeca Andrade. Ainda que mais marcada por uma banda marcial do que por um “Baile de Favela”. Na primeira evolução, Moro abandou suas funções de juiz para imprimir uma perseguição a Lula em busca da sua cabeça. Exagerou tanto na dose que todas as condenações de Lula acabaram anuladas, e ele pode voltar à vida pública, elegendo-se pela terceira vez presidente da República.
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Na parte, então, em que a atleta faz evoluções de dança, Moro resolveu sambar na cara de Jair Bolsonaro, fazendo as graves acusações de que ele buscava aparelhar a Polícia Federal para proteger a si, aos seus amigos e seus familiares.
Até completar a evolução com seu duplo tuíste carpado. Moro sai dessa condição de acusador de Bolsonaro para se tornar de novo seu aliado. A evolução só não foi perfeita pelo tropeço dado por Moro quando tentou ser primeiro candidato por São Paulo e não conseguiu comprovar o domicílio eleitoral.
Certamente, toda essa evolução não rendeu a Sergio Moro a medalha de ouro no quesito coerência. Por mais que ele tenha se reaproximado de Bolsonaro ao final da campanha, estava longe de ser agora fiel aliado do bolsonarismo. Mas alguém de quem o bolsonarismo deveria desconfiar. E, evidentemente, não era alguém que pudesse se aproximar do governo Lula. Alheio, portanto, a seu próprio partido, que tem ministros no novo governo.
Então, Lula primeiro confessa seus desejos mais primitivos sobre Moro numa entrevista. Desejos legítimos, por tudo o que ele passou, diga-se, mas dispensáveis de serem tornados público na atual posição de Lula, de presidente da República. No dia seguinte, aparece, pela voz do próprio ministro da Justiça, Flávio Dino, a história do plano de sequestrar e assassinar Moro. E o que faz Lula? No dia seguinte, volta a cutucar Moro com a história de que tudo seria “armação” dele.
Então, as “armações” de fato surgem. Como a tentativa deplorável de querer associar Lula e o PT ao plano do PCC. E, por outro lado, o esforço igualmente boboca de querer comprovar a tal “armação” de Moro só porque Lula, o oráculo, disse. Cumpra-se o oráculo de Lula, mesmo que se desmoralize a Polícia Federal e o Ministério da Justiça.
O problema disso tudo é que, antes de tudo isso acontecer, Lula já tinha obtido o resultado final do seu desejo de ferrar (não é preciso repetir o verbo exato usado pelo presidente) com Moro. Tinha suas condenações anuladas. Tinha Moro desmoralizado como juiz. Era o presidente da República. E Moro até então um senador apagado.
Foi Lula quem ressuscitou Moro. Foi Lula quem trouxe Sergio Moro de volta à ribalta. Foi Lula quem deu de novo um palanque a Moro. Na quinta-feira (30), Bolsonaro retornará ao Brasil. Nas conversas em que sua volta foi acertada, o PL disse a Bolsonaro que os excessos verbais de Lula no momento poderiam ajudar nesse retorno. Bolsonaro pretende chegar provocando Lula. E o PT aconselha Lula a não cair nesse provocação. Bolsonaro é até agora um ex-político que se autoexilou chegando a temer a prisão e a inelegibilidade. Pior que Moro, que, embora até então apagado, era senador. Que não ganhe agora ajuda na sua tentativa de retorno à ribalta.