Claudia Lima Gabionetta *
Todo conhecimento que temos até hoje a respeito da evolução do ser humano nos permite afirmar que ele sempre foi capaz de criar tecnologias para seu uso e a seu favor. O desenvolvimento de várias técnicas humanas revolucionou hábitos e permitiu à sociedade transformações colossais ao longo dos séculos.
Ao colocar um zoom em algumas técnicas que, de alguma forma, impactaram a área da educação, podemos constatar que muitas delas, inicialmente, causaram receios e críticas entre os educadores e o universo escolar. O uso das calculadoras, por exemplo, era visto como algo que poderia impedir o desenvolvimento do raciocínio lógico matemático; a TV iria competir com a atenção do professor; os computadores e seus editores de texto com a função “copia e cola” poderiam prejudicar pesquisas escolares. E não paramos por aí, pelo contrário. O surgimento de novas tecnologias segue constante e de maneira rápida, e parece que a escola, seus currículos e práticas pedagógicas não avançam no mesmo ritmo. Precisamos olhar para isso.
Na linha dos avanços “assustadores”, entram as Inteligências Artificiais (tão presentes em nosso cotidiano) ou IAs. Só esse nome já assusta um pouco, não é mesmo? Ainda neste mês, o secretário-geral da ONU, António Guterres, fez do tema o ponto central de sua fala no Fórum Econômico Mundial de Davos.
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Para começar a falar das IAs, vamos primeiro pensar sobre o conceito de inteligência?
A palavra “inteligência” tem origem no latim. Ela deriva do termo latino intelligentia, formado pela combinação de inter (entre) e legere (escolher, ler). Portanto, a raiz etimológica sugere a ideia de “escolher entre”, “discernir” ou “ler entre”. No contexto original, a palavra estava associada à capacidade de fazer escolhas e compreender.
Ao longo do tempo, o conceito de inteligência evoluiu e passou a abranger, além da capacidade de compreender para fazer escolhas, uma variedade de capacidades mentais que incluem raciocínio, aprendizado, resolução de problemas, aplicação prática do conhecimento, sem falar também da inteligência emocional abordada pela área da psicologia.
A inteligência é um conjunto complexo de capacidades que sempre diferenciou a humanidade dos animais. E é essa mesma humanidade que cria as chamadas inteligências artificiais. Podemos dizer de forma bem simplificada que as inteligências artificiais são sistemas que simulam uma inteligência análoga à inteligência humana. Em seu livro “Inteligência artificial e pensamento crítico”, o estudioso sobre o assunto Alexandre Sayad diz : “A influência do ser humano – portanto a subjetividade humana – está presente em todas as etapas de desenvolvimento e de uso dos sistemas de Inteligência Artificial.”
Em nosso dia a dia, estamos cercados desses sistemas e, muitas vezes, não nos damos conta deles. Quantas vezes somos atendidos por assistentes virtuais para resolver questões como um problema bancário ou para marcar uma consulta médica? Ou, ainda, quantas vezes já fomos bombardeados por anúncios de produtos depois de realizarmos uma simples pesquisa na internet? Temos o Chat GPT que é um modelo de linguagem que se utiliza de uma rede de dados para gerar respostas coerentes, produzir textos, entre outras tarefas específicas.
No mundo atual, marcado pela rápida evolução tecnológica, as Inteligências Artificiais emergem como protagonistas na transformação de diversos setores da sociedade, e a educação não é uma exceção. Elas podem criar um terreno fértil para explorar novas possibilidades, questionar antigos métodos e promover uma revolução no modo como aprendemos e como ensinamos. Para isso é necessário que os educadores permaneçam abertos e informados sobre essas transformações e que a inserção de Inteligências Artificiais no contexto educacional seja acompanhada de debates éticos. É preciso ainda que se leve em conta a diversidade educacional existente em nosso país. É fundamental a criação de políticas públicas e legislação para o uso das IAs na educação, além da preocupação com implantação desse assunto nos currículos de formação dos futuros professores. Estes devem ser vistos como agentes fundamentais no processo de introdução das IAs nas escolas, não mais como detentores de todo conhecimento, mas como mediadores e criadores de práticas docentes eficientes que utilizem as novas tecnologias para impulsionar aprendizagens ativas e reflexivas e sempre acompanhadas de discussões éticas sobre seu uso.
Só um conjunto de ações poderá otimizar o potencial das IAs a favor da educação, aproveitando ao máximo seus benefícios e ao mesmo tempo preservando valores fundamentais que tornam a educação uma experiência transformadora e cada vez mais democrática.
É importante mencionar que o mundo já olha para o assunto de forma bastante séria. No ano passado, a Unesco lançou um guia de regulamentação do uso de Inteligência Artificial nas escolas. É um material gratuito que dá orientações sobre política de privacidade, organização de currículos e a aplicação das novas ferramentas digitais por educadores e estudantes. Com isso, a Unesco busca desenvolver materiais normativos e de orientação que ajudem a fortalecer as competências digitais de educadores e estudantes, garantindo assim o uso das novas tecnologias, pautado na ética e nos direitos humanos. O conteúdo pode ser conferido em português aqui.
Para finalizar, convido vocês, educadores, a permanecerem no caminho da atualização e formação constantes e sempre na certeza que nenhuma tecnologia jamais será capaz de substituir o encantamento das interações humanas e tudo de potente e sensível gerado por elas.
* Claudia Lima Gabionetta é pedagoga com pós-graduação em Educação Infantil, professora de ensino fundamental, multiplicadora de Educação Midiática – Instituto Educamídia, e coordenadora pedagógica da Revista Qualé.
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