Entre 2013 e 2018, o Clube de Regatas do Flamengo viu sua dívida cair pela metade e o seu faturamento aumentar quatro vezes. Depois de enfrentar décadas de crise financeira, a agremiação de maior torcida do país estabelecia ali as condições para a era dos investimentos milionários, a contratação de craques e a jornada vitoriosa iniciada em 2019, com a conquista de duas Copas Libertadores da América.
Nesses seis anos de reconstrução, o clube foi liderado pelo administrador de empresas Eduardo Bandeira de Mello, funcionário aposentado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES0. Eleito com o apoio de Zico, o maior ídolo da história do Flamengo, Bandeira de Mello vive agora à sombra de outro campo, o Salão Verde da Câmara, na condição de deputado federal pelo PSB do Rio de Janeiro.
O ex-dirigente e agora deputado coleta assinaturas para a criação da Frente Parlamentar de Modernização do Futebol. Para ele, a “bancada da boa bola” no Congresso deve criar condições para que os clubes adotem as melhores práticas empresariais para se tornarem sustentáveis em todos os sentidos e façam a diferença na vida da sociedade como um todo.
“Para que o futebol seja indutor de políticas públicas, que ande de mãos dadas com a educação, por exemplo, porque isso vai ser bom para a educação e bom para o futebol”, explica. Na avaliação dele, o sucesso da empreitada passa pela articulação entre sociedade civil, governo, Congresso, clubes e atletas – personagens esses centrais dentro de campo, mas, quase sempre, excluídas das discussões extracampo.
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Nesta entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, concedida em seu gabinete no último dia 1o, Bandeira de Mello reafirma inocência no episódio mais triste da história rubro-negra: o incêndio que matou dez adolescentes da base do Flamengo no centro de treinamento em Vargem Grande, mais conhecido como Ninho do Urubu, em 8 de março de 2019.
Embora não fosse mais presidente do clube na época, Bandeira de Mello é um dos 11 réus pela tragédia que completou quatro anos na última quarta-feira (10). Sua gestão construiu os contêineres que serviam de abrigo para os jovens atletas.
Publicidade“Eu não tenho a menor dúvida de que sou injustiçado, mas acho que isso vai se resolver. Quem não deve não teme e eu tenho plena consciência de que não tenho absolutamente nada. Inclusive quem tiver alguma dúvida, acho que é só ler o processo.”, disse.
Bandeira de Mello também critica a atual gestão do Flamengo, liderada pelo presidente Rodolfo Landim, de quem é opositor. Para o ex-presidente, o clube poderia ter oferecido indenização maior às vítimas da tragédia do Ninho do Urubu.
“Como torcedor e pensando na imagem do clube eu sempre tive aquela ideia de que poderia ter sido dado outro caminho, ainda que custasse um pouco mais de dinheiro, mas certamente a imagem do clube não tem preço.” Ele também condena as relações políticas dos atuais dirigentes do clube com o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Na volta da delegação ao Brasil após a conquista da Libertadores, no final de outubro, atletas e comissão técnica foram recebidos por Bolsonaro na véspera do segundo turno da eleição. E com ele fizeram um voo, utilizado como peça de campanha eleitoral. “Entendo que o dirigente do clube pode ter sua posição política pessoal, mas o clube não pode ter.”
Leia a íntegra da entrevista:
Congresso em Foco – Deputado, o senhor chega ao Congresso depois de muito tempo no BNDES mas também muito conhecido por sua história na presidência do Flamengo, que foi um momento, assim, de virada de chave do Flamengo, como um clube muito endividado para a condição de clube mais próspero do país hoje. O que o senhor acha que dá para trazer da sua experiência, tanto de BNDES como de Flamengo para o Congresso? E como isso pode se reverter em políticas públicas e medidas legislativas?
Bandeira de Mello – Acho que dá para trazer muita coisa. O BNDES é a maior agência de fomento do Brasil e o segundo maior banco em desenvolvimento do mundo. Todos os setores da economia brasileira são cobertos pelo BNDES. É difícil dizer, nos últimos 70 anos, qual o grande projeto de infraestrutura ou industrial brasileiro que não tenha tido o apoio do BNDES. E eu, em mais de 30 anos lá, tive muita experiência em quase todas as áreas: industrial; infraestrutura; meio ambiente e social. E isso é uma experiência que a gente traz para cá. Trazendo uma visão de quem passou muito tempo lá, acho que vou poder com certeza contribuir. Em relação ao Flamengo, minha passagem foi marcada por uma virada de jogo, totalmente desacreditado, em situação financeira catastrófica, que não pagava em dia ou cumpria seus compromissos, credibilidade zero. E no dia do meu discurso de posse eu falei: “Olha, o Flamengo tem 40 milhões de torcedores, boa parte deles humilde, boa parte deles crianças e jovens, que têm no futebol o principal ponto de contato com a realidade. Então o Flamengo tem obrigação de dar exemplo para esses torcedores e o exemplo que nós estamos dando é um exemplo negativo. Nós vamos fazer os sacrifícios necessários para virar esse jogo para que o Flamengo possa ser reconhecido como um clube cidadão. Com certeza isso no futuro vai ter uma resultante altamente positiva para o clube, inclusive em termos esportivos e, claro, financeiros”. E efetivamente foi o que aconteceu. Nós conseguimos reduzir a dívida do Flamengo a menos da metade e multiplicar o faturamento por quatro, nunca atrasamos uma folha de pagamento, nunca mais deixamos de cumprir o compromisso. O Flamengo passou a ser um clube cidadão que dava orgulho aos seus torcedores e eu acho que eu posso trazer muito dessa filosofia, desse tipo de valores, para o Congresso Nacional em relação ao futebol brasileiro como um todo. Eu antes estava falando de 40 milhões de torcedores, agora estamos falando de 200 milhões. Eu acho que o futebol brasileiro tem que incorporar princípios modernos de governança, tem que incorporar até coisas que não deu tempo de fazer no Flamengo.
Por exemplo?
A minha administração foi reconhecida como uma administração revolucionária e disruptiva, quando na realidade nós não fizemos nada mais que nossa obrigação, que era pagar salário em dia, imposto em dia, cumprir suas obrigações. Só que isso no futebol brasileiro era uma novidade e o Flamengo deu exemplo não só para os torcedores, mas para vários clubes que passaram a seguir essa nossa orientação. Agora, tem muita coisa que os clubes de futebol ainda podem evoluir. As empresas brasileiras todas — todas não diria, as melhores — têm uma política definida e quase obrigatória, de responsabilidade social, ambiental, de boa governança, os princípios ESG [(Environmental, Social and Governance) – conjunto de práticas e padrões com o objetivo de avaliar se a operação de uma organização é sustentável, socialmente consciente e gerenciada de forma correta]. Hoje em dia é quase que obrigatório que uma empresa competitiva seja aderente aos princípios ESG e você não vê isso no futebol. Os clubes — tirando uma única exceção de um clube pequeno ainda na terceira divisão do campeonato carioca, que é o Pérola Nega, que estou ajudando eles, inclusive — acho que ainda não acordaram para esse tipo de coisa. Acho que na frente parlamentar de modernização do futebol brasileiro a gente deve discutir isso e deve estimular para que o futebol seja exemplo, para que o futebol seja indutor de políticas públicas, que ande de mãos dadas com a educação, por exemplo, porque isso vai ser bom para a educação e bom para o futebol.
Durante muito tempo aqui no Congresso havia uma forte bancada da bola, que tinha uma imagem muito negativa, liderada por Euricio Miranda. Como construir essa modernização e sensibilizar seus colegas deputados?
Acho que a política é a arte do diálogo e isso vai valer para a modernização não só no futebol, mas em vários setores. Essa bancada da bola nós tivemos que enfrentá-la na época da discussão do Profut, porque boa parte dos parlamentares na época, que eram ligados a clubes de futebol — essa era a bancada da bola — eles queriam que o Profut fosse apenas mais um —-, um programa de refinanciamento de dívidas tributárias que nunca seriam pagas, porque você vai lá, consolida dívida, zera tudo, cria um novo programa no primeiro, segundo, terceiro mês e mais ninguém está pagando aquelas novas prestações. Então eles não queriam que o Profut fosse nada além disso, enquanto nós — além do Flamengo alguns outros clubes e atletas que na época estavam representados por um movimento chamado “Bom senso futebol clube” e boa parte da mídia — estavam preocupados com o fato de que o Profut teria que ser uma coisa que não fosse só boa para os clubes, mas que fosse boa também para o contribuinte, que fosse boa para a Fazenda Nacional que, afinal de contas, é a detentora do crédito. Você tinha que estar preocupado efetivamente na remuneração do crédito da Fazenda Nacional e os clubes deviam demonstrar que poderiam se adequar a esse novo marco regulatório, através de políticas de responsabilidade, que eram chamadas contrapartidas do Profut. Então a gente conseguiu que, para o clube aderir o Profut, ele tinha que cumprir uma série de contrapartidas: não poderia aumentar seu endividamento, não poderia praticar apropriação indébita e havia regras para evitar aquela sucessão perpétua ou permanente de seus dirigentes. Nós não conseguimos tudo, mas conseguimos muita coisa. Acho que o Profut foi uma evolução, apesar de a gente estar lidando com alguns dirigentes que tinham um pensamento conservador, retrógrado. Acho que agora vai ser a mesma coisa, acho que nós deputados somos representantes da população e a população quer responsabilidade, a população quer princípios e valores consistentes, quer boa governança. Acho que vai demorar um pouquinho mas vamos conseguir fazer um gol de placa aí.
Do ponto de vista legislativo, para saneamento de dívidas para os clubes, qual seria a principal saída hoje?
O Profut é de 2015 e está em vigor. Alguns clubes foram excluídos do Profut, mas existem outros mecanismos, transação tributária. Hoje em dia com essa questão da dívida tributária, que é proveniente da apropriação indébita, pode existir ainda mas não é uma coisa tão candente quanto era em 2015, na época do Profut. Mas em relação às contrapartidas, as governanças dos clubes e das entidades de administração do esporte, muita coisa precisa ser feita.
Alguns clubes, como Vasco, Cruzeiro e Bahia, estão vivendo a experiência das SAFs (Sociedade Anônima do Futebol). Como é que o senhor vê esse caminho? É um caminho positivo ou oferece riscos?
Bom, tudo na vida oferece riscos. Acho que para determinados clubes as SAFs foram a única salvação, a última salvação. Eles estavam na iminência de fechar, então esses clubes tiveram que precipitar suas negociações e se organizar sob a forma de SAF, tinha uma legislação nova, que tinha acabado de ser aprovada. Agora, outros clubes podem até aderir a esse novo modelo societário, porém sem a premência de outros clubes que estavam muito endividados. E outros clubes podem até optar por não aderir ao modelo de Sociedade Anônima e continuar sendo clubes associativos. Acho que o Flamengo, por exemplo, não tem uma necessidade no momento. Pode ser que no futuro ele enxergue como uma oportunidade estratégica. O Flamengo e outros clubes não têm essa necessidade no momento. Então eles podem continuar organizados sob a forma associativa. Eu sempre disse para o Flamengo que ele tinha a obrigação de ter a eficiência da melhor empresa privada e a transparência da melhor empresa pública. Trabalhamos sempre nesse sentido. Eu acho que, não só o Flamengo, mas outros clubes que quiserem manter esse modelo societário atual, eles podem. Houve até um pré-projeto de SAF que tornava obrigatória a adesão dos clubes ao modelo, mas no momento não é obrigatório e acho que essa é uma boa solução. Quem quiser ou precisar, entra. Quem não precisar, mantém.
Mas tem alguma proposta em andamento nesse sentido, de aperfeiçoamento da legislação das SAFs?
Estou chegando agora e nós vamos discutir isso na frente na Comissão de Esporte. Eu tenho lido na imprensa que alguns clubes e algumas SAFs estão com dificuldade. Estão cobrando das SAFs dívidas que pertenciam aos clubes.
O senhor acha que é possível fazer essa modernização no futebol brasileiro sem o maior desengajamento, por exemplo, de jogadores?
O ideal seria que os jogadores se engajassem como se engajaram na época do Profut. Eu entendo que a governança do futebol brasileiro passa pelos clubes e passa pelos atletas, passa pelos profissionais que militam no esporte, passa pelas federações também. Hoje em dia a governança está totalmente entregue às federações.
Uma crítica às vezes que se faz aos atletas brasileiros é de falta de posicionamento…
É verdade, nós já tivemos esse precedente lá atrás, no movimento que se chamava Bom Senso Futebol Clube, que era capitaneado por jogadores que não precisavam, que estavam em final de carreira, muitos deles muito bem sucedidos. Mas, para dar o exemplo, e até como solidariedade aos demais atletas — se engajaram nesse movimento, que infelizmente depois acabou e eu saí do Flamengo e depois não acompanhei mais. Mas eu acho que seria muito interessante que voltasse a ter uma inciativa nesse sentido, porque os sindicatos, a gente vai olhar os sindicatos de atletas estão na mão das mesmas pessoas há anos e a gente não via muita eficiência nem alguma preocupação com os destinos do futebol brasileiro como um todo. É como foi o caso do Bom Senso, o engajamento da mídia é fundamental. Se não fosse a mídia na época, se não fossem os jornalistas mais preocupados — e hoje em dia tem vários jornalistas nessa área de business do futebol, do esporte — eu acho que o engajamento deles vai ser muito importante se a gente quiser melhorar alguma coisa.
Muitas vezes a gente pensa em um atleta e é aquele atleta bem sucedido, que joga em grandes clubes, que ganha grandes salários, mas não é a realidade, né, da grande maioria?
Não. 99% dos atletas brasileiros não ganham nem um salário mínimo.
E o que pode ser feito por esses atletas?
Eu acho que, na medida que você transforma o futebol em um negócio atrativo, não só do ponto de vista esportivo, mas do ponto de vista negocial também, econômico, todo mundo ganha com isso, inclusive os atletas. É claro que existem outros mecanismos de proteção da atividade, mas tudo isso passa por discussão do futebol como um todo. Então a discussão do calendário do futebol brasileiro é uma coisa que deveria ser estendida aos atletas também. Vários deles sofrem por conta de um calendário irracional. São obrigados a fazer contratos de três meses e depois ficam desempregados o resto do ano, por exemplo. Então é um trabalho que vai começar ainda, que a gente pretende trazer todos esses players aqui para discussão e é da discussão que vai sair alguma coisa boa aí.
É possível formar uma nova bancada da bola no Congresso, com outras características às anteriores?
Imagino que possa vir uma bancada da boa bola. E vamos torcer para que — acho que muitas das pessoas que eram contra na época não estão mais aqui — então vamos torcer para que haja essa consciência.
E dá para fazer uma tabelinha com o governo quanto a isso?
Eu acho fundamental. Na época do Profut foi feito. O Profut estava patinando e o governo tomou uma medida provisória que acabou virando a Lei do Profut. Tive uma conversa com a ministra Ana Moser (Esporte) e acho que ela também concorda com isso. Faz todo o sentido uma parceria do poder Legislativo com o poder Executivo.
Ela já sinalizou com alguma medida que possa tomar nesse sentido?
Tive uma conversa com ela, eu nem tinha tomado posse e ela tinha acabado de tomar posse, mas ela estava preocupada com essa questão do esporte, em geral com políticas públicas, o esporte para todos. Tem vários pontos em comum entre as preocupações dela e as minhas. Acho que a gente pode trabalhar juntos, não só ela as outras pessoas do governo. Essa questão do futebol, isso perpassa a administração pública como um todo. Isso tem rebate na Fazenda, no Meio Ambiente.
Entendo que o dirigente do clube pode ter sua posição política pessoal, mas o clube não pode ter
O senhor é de um campo político mais da esquerda em relação ao grupo que está hoje no comando do Flamengo, que é um grupo muito identificado com o ex-presidente Jair Bolsonaro no governo passado. O senhor entende que o clube, de certo modo, foi utilizado eleitoralmente nessa gestão?
Acho que isso ficou claro. Entendo que o dirigente do clube pode ter sua posição política pessoal, mas o clube não pode ter. Então, enquanto eu fui presidente do Flamengo, eu tive contato permanente com várias instâncias de governo. No Congresso me relacionei com partidos de direita, de esquerda, de centro. O Profut foi uma construção de vários partidos. O relator do Profut foi o Otavio Leite, que era do PSDB, e de vários outros parlamentares que ajudaram muito. A iniciativa da medida provisória veio do Palácio do Planalto, da Casa Civil, que na época era o governo do PT. Então acho que eu como presidente do Flamengo tinha a obrigação de me relacionar com todos em nome do clube, como me relacionava com o prefeito do Rio de Janeiro, como me relacionava com o governador na época — estou falando o prefeito Eduardo Paes, depois o prefeito Crivella, depois o governador Sérgio Cabral, depois o governador Pezão e a última mudança eu já não estava mais no Flamengo. Acho que é minha obrigação isso, não significa que estou aderindo a nenhum deles. Agora você tomar partido, fazer propaganda política, isso aí realmente acho feio, acho que inclusive contraria o que deve ser um clube, uma gremiação, que tem sócios de todas as origens, de todos os credos e todas as orientações políticas. Aquilo tem que ser respeitado. Quando você está lá tem que estar preocupado com o interesse do Flamengo e não com interesses pessoais, vaidades e acordos políticos.
Misturaram-se as coisas?
É, acho que não pode misturar os canais, no caso.
O senhor ainda pretende algum dia voltar à presidência do Flamengo ou não?
Não tenho essa intenção. Acho que já cumpri minha missão, fiz o melhor que eu pude, mas, como rubro-negro, acho que tenho a obrigação de participar da política do clube. Não pretendo ser candidato à presidência, mas posso apoiar um candidato a presidente, posso participar de uma chapa e ter até uma função no clube que não prejudique a atividade, a pauta dedicada hoje. Eu fui eleito e tenho que prestar conta do que estou fazendo para todos os eleitores, os que votaram em mim e os que não votaram em mim também. Então eu como deputado federal dificilmente conseguiria dar a dedicação que dei ao Flamengo entre 2013 e 2018, mas alguma coisa posso fazer para ajudar e tenho certeza que o importante vão ser as pessoas. Se você tiver uma chapa que represente os nossos princípios, os nossos valores, a responsabilidade, a impessoalidade, a rejeição total a qualquer tipo de conflito de interesses. E, além disso, a transparência, a competência, capacidade de gestão, eu posso perfeitamente apoiar essa chapa e até ajudá-la.
A chapa seria oposição a essa atual?
Sim, com certeza.
O senhor teme que o legado que deixou possa ser comprometido por essa atual gestão?
Não estou acompanhando diretamente. Eu sou hoje um torcedor de arquibancada e disso não abro mão. Sou sócio, sou conselheiro do clube. Tentaram me expulsar três vezes e não conseguiram. Mas eu não participo assim da vida política, não acompanho. Tenho amigos que acompanham. Eu sei que o Flamengo está muito longe da situação que encontramos em 2012. Acho que a renda é privilegiada, mas nós temos que estar sempre atentos porque essa questão de acordos políticos, misturar interesse do clube com interesses particulares e principalmente essa questão da impessoalidade. A administração deve sempre olhar apenas, exclusivamente, o interesse do Flamengo, nunca misturando com interesses próprios, sejam econômicos, eleitorais, políticos, ou de políticos internos do clube. Eu entendo que a gente deve estar sempre atento para esse tipo de coisa e é natural isso é da democracia. Mas voltar a ser presidente, acho que já cumpri minha missão.
No caso do Ninho do Urubu, apesar de o episódio ter ocorrido no atual mandato, gestão posterior à sua, o senhor também está respondendo o processo. Por quê?
Eu não tenho a menor dúvida que sou injustiçado, mas acho que isso vai se resolver. Quem não deve não teme e eu tenho plena consciência de que não tenho absolutamente nada. Inclusive quem tiver alguma dúvida, acho que é só ler o processo. Tem lá o parecer da maior autoridade de direito criminal do país me isentando de qualquer culpa. Isso tudo está lá no processo e agora eu tenho confiança na Justiça, eu acho que isso tudo vai se resolver. Como você falou, eu não era mais presidente do clube, os dois centros de treinamento estavam concluídos e os meninos da base em dezembro de 2018 já estavam ocupando as novas instalações. Sem contar que, lendo o processo, a gente fica sabendo, inclusive, para quem não se informou tanto, que tudo aquilo que se falava de inadequação dos alojamentos, por serem de containers, tudo isso está totalmente superado. Hoje todo mundo conhece, quem se aprofunda, que esse tipo de estrutura é usado por hotéis, hospitais, escolas. Até o alojamento de corpo de bombeiros do Rio de Janeiro é em estrutura de container, então isso aí não teria o menor problema. Mas o fato é que quando eu saí os dois alojamentos já estavam prontos e os meninos já ocupavam desde a final da copa do Brasil sub-17 de 2018, os meninos já estavam ocupando as novas instalações.
E por que eles foram levados de volta para os containers?
Aí eu já não estava mais lá para saber. Mas não acredito que tenha sido nada ligado a nenhum tipo de má intenção. Acho que quem quiser se informar sobre esse processo tem que ler o processo, ao lado de um bom advogado, formular e tal. Acho que está tudo lá.
Como torcedor e pensando na imagem do clube eu sempre tive aquela ideia de que poderia ter sido dado outro caminho, ainda que custasse um pouco mais de dinheiro
A postura do clube em relação às famílias, oferecendo valores considerados baixos às famílias como indenização, também foi alvo de muita crítica, de questionamentos. Faltou maior sensibilidade da parte do clube com essas famílias enlutadas?
Foi. Eu não estava mais lá e não acompanhei as negociações. Como torcedor e pensando na imagem do clube eu sempre tive aquela ideia de que poderia ter sido dado outro caminho, ainda que custasse um pouco mais de dinheiro, mas certamente a imagem do clube não tem preço. Mas aí seria leviandade minha entrar em detalhes porque eu não estava mais na administração, eu nunca mais sequer pisei lá no Centro de Treinamento, não tive contato com as famílias, não era mais presidente do clube ou dirigente, nem cabia esse tipo de atuação nesse sentido.
[Esta e a próxima pergunta foram feitas por escrito esta semana após a publicação da reportagem do UOL] Em entrevista publicada pelo UOL no dia 6 de março, o engenheiro José Augusto Bezerra, contratado pelo Flamengo para fazer um laudo independente, acusa o clube de adulterar a cena do incêndio no Ninho do Urubu. Segundo ele, o CEO do Flamengo, Reinaldo Belotti, mandou um funcionário arrancar parte da instalação elétrica enquanto a investigação das causas do incêndio ainda ocorria. Essa denúncia reforça a responsabilidade da atual gestão pelo incêndio? Que impacto, na sua avaliação, essa denúncia tem para o transcorrer do processo?
Não me cabe avaliar a responsabilidade de quem quer que seja sobre o incêndio. Acho que qualquer fato novo merece ser avaliado no âmbito do processo.
O senhor pretende tomar alguma medida judicial, dentro do seu processo, em relação a isso? Essa informação, na sua opinião, reforça a sua linha de defesa de que não teve responsabilidade pelo episódio?
Como todos sabem, eu já não era presidente do clube na ocasião do incêndio e os atletas já estavam ocupando as instalações novas desde dezembro de 2018. Meus advogados estão permanentemente atentos a todos os fatos relacionados ao caso e, se julgarem conveniente, se manifestarão dentro do processo.
Estamos conversando hoje numa quarta-feira (1), um dia depois de o Flamengo perder a final da Recopa Sulamericana para o Independiente de Valle. Este ano o time não chegou à final do Mundial, perdeu a Recopa e a Supercopa. Por que o senhor acredita que o time está nessa fase?
Bom, eu não to lá no dia a dia, não sei o que está acontecendo exatamente. Como torcedor, eu lamento que esses resultados negativos estejam acontecendo. Também falando como torcedor, com todas as prerrogativas que um torcedor de arquibancada tem, eu provavelmente não teria trocado o treinador. Acho o Dorival um excelente treinador, ele ajeitou aquela defesa ali no meio do ano passado, conseguiu fazer o Pedro e o Gabigol jogarem juntos, o que outros antigamente não tinham conseguido. E eu conheço o Dorival da minha época, acho que ele era um excelente treinador. Lógico que, como te falei, não to lá no dia a dia, não sei o que aconteceu, pode ser que tenha alguma justificativa mas pode ser que não também. Eu to aqui nessa, mas confiante de que a gente vai virar o jogo aí e ganhar tudo a partir de agora.