Com o avanço das revelações sobre a Operação Lava Jato da Polícia Federal e o caso que se tornou conhecido como “petrolão”, a questão da corrupção parece destinada a frequentar ainda por muito mais tempo o noticiário nacional. O que há de pior nos nossos costumes políticos está sendo diariamente exposto em rede nacional e, com isso, a discussão sobre a reforma política vai ficando cada vez mais urgente.
Hoje existem duas grandes propostas de reforma apresentadas, uma oriunda de um conjunto de organizações da sociedade civil e outra vinda do próprio Congresso Nacional. A proposta dos cidadãos, que é a da Coalizão pela Reforma Política Democrática, tem a grande vantagem de ser mais legítima e abrangente. Mas também tem a desvantagem de vir diretamente da sociedade civil, o que faz com que tenha de conseguir perto de um milhão e meio de assinaturas de apoio de cidadãos mais conscientes, o que por si só já é um esforço hercúleo. Principalmente quando vemos que até hoje os apoios mal passam de 600 mil.
Mas não é só isso. Conseguidas as assinaturas da sociedade, será preciso o apoio de um grupo de parlamentares para fazer com que efetivamente dê entrada no Congresso, e aí possa seguir os rituais de discussão nas duas Casas legislativas. Só então, caso aprovada, passaria ter força de lei. Será que o Brasil aguenta esperar tanto tempo?
Por outro lado, temos uma opção mais objetiva, visto que já está tramitando no Congresso: a Proposta de Emenda Constitucional número 352, de 2013. Como resposta do parlamento às manifestações populares de junho do ano passado, a alternativa apresentada pela Câmara dos Deputados foi a criação de um grupo de trabalho, sob a coordenação do deputado paulista Cândido Vaccarezza (PT). O objetivo foi compilar e converter em um projeto de lei toda discussão acumulada ao longo de décadas. A PEC resultante desse trabalho contempla 16 pontos, e até hoje aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, a CCJ.
Por mais que a maioria da sociedade fique de pé atrás com uma proposta de reforma política vinda dos próprios políticos, alguns pontos dessa PEC devem merecer o devido crédito. Um deles, na verdade um dos mais importantes, é a instituição do voto facultativo nas eleições. Afinal de contas, votar somente será um verdadeiro direito se cada cidadão eleitor puder fazer a escolha consciente entre comparecer ou não às seções eleitorais. Voto como dever é algo que simplesmente não existe em qualquer democracia que se preze.
Um outro ponto da reforma é o que mais tem causado discussões na sociedade: a doação de empresas para campanhas eleitorais. A PEC 352 propõe que a manutenção das doações de pessoas jurídicas, mas apenas para partidos políticos, e não mais para políticos individuais, e mantido o limite atual de 2% do faturamento bruto anual. Pode funcionar, se esse dispositivo vier acompanhado de uma regulamentação rigorosa em cima das agremiações políticas. A opção de extinção completa do financiamento privado não é razoável, pois serviria apenas para fazer disparar o fluxo de recursos “por baixo dos panos”, o famoso Caixa 2. Não aceitar isso é apenas um exercício idealista de wishful thinking.
Não podemos esquecer que as tentativas de coibir o caixa 2 em campanhas eleitorais são antigas, tendo origem na lei que regulamentou as doações, a de número 4737/1965, instituída exatamente para enfrentar essa questão.
Outros pontos da PEC da Câmara também deveriam ser considerados, como o fim da reeleição para cargos no poder Executivo, o fim das coligações partidárias e a imposição de cláusulas de desempenho para os partidos. Esse item de desempenho é especialmente relevante. Pela PEC proposta, para um partido ter acesso ao tempo de TV e rádio e aos recursos públicos do Fundo Partidário, ele deverá obter em uma eleição pelo menos 3% do total de votos válidos na Câmara dos Deputados e 3% em no mínimo 9 unidades da federação. Com isso, espera-se uma redução no número de partidos criados não apenas para o troca-troca de favores por tempo de mídia, mas também para garantir um quinhão nessa bolada.
Ao final do processo, a PEC determina que o texto legal definido no parlamento deverá receber a aprovação da sociedade, através de um referendo.
A luta contra a corrupção na política é uma questão debatida no mundo inteiro, e no Brasil é mais do que urgente. Com certeza, é preciso conhecer melhor as propostas da Coalização pela Reforma Política. Mas deixar de lado a proposta vinda da classe política sem o devido debate e sem pressionarmos por seu aperfeiçoamento pode fazer o Brasil perder um tempo de que não dispõe.
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