Jorge Gerez*
Uma das queixas que mais se ouve hoje em dia, tanto no Brasil quanto mundo afora, é que a imprensa só divulga “notícias ruins”.
No entanto, especialmente durante o período eleitoral, quando as campanhas políticas têm a oportunidade de divulgar as tais “notícias boas”, que tanto é cobrado da imprensa – e a quem não cabe fazer juízo de valor sobre o que é notícia boa ou ruim – elas apostam justamente no que criticam: em ataques e na desconstrução dos adversários, ao invés de apresentarem suas propostas ou prestarem conta do que fizeram os seus representantes no exercício dos seus mandatos.
O processo eleitoral deveria ser uma celebração de ideias e propostas em prol do melhor candidato. Mas, infelizmente, vemos que nas democracias modernas isso já parece obsoleto.
Imperando as desconstruções de um lado e do outro, centrando mais em destruir e aumentar a rejeição do que em propor ideias, apresentar soluções ou fazer um “showroom” do que foi feito, as campanhas negativas ganham espaço e pouco a pouco corroem as democracias. Esse processo, em definitivo, aumenta a rejeição à política como um todo.
Leia também
Nesse ano, o número de eleitores que se absteve no primeiro turno das eleições foi de 31 milhões de brasileiros, o que representa 20,9% de quem estava apto a votar. É a maior abstenção registrada no país nos últimos 20 anos.
A França, que também realizou eleições neste ano, registrou 28% de abstenção, a maior desde 1969. Na recente eleição para o parlamento italiano a participação caiu 10% em relação a 2018, o pior percentual de uma eleição geral na história do país. Exemplos não faltam.
A origem disto, não é tão simples: é como o “ovo e a galinha”. A simplificação de uma campanha política a inserções de 15 ou 30 segundos num formato apetecível por cidadãos que não estão interessados na política leva justamente a busca de um formato que faz com que as pessoas decidam superficialmente pelo perfil de cada candidato ou candidata.
O ideal era que tivéssemos, de um lado, campanhas propositivas, que valorizassem o debate de ideias, e do outro lado, cidadãos mais interessados nas plataformas e propostas de trabalho de cada candidato, nesse caso, teríamos uma verdadeira festa democrática de propostas e soluções, e não um embate eterno de quem é o menos pior.
Em democracias onde ganha o menos pior, ou o “anti” algo, as coisas, geralmente, não acabam bem.
Voltando ao Brasil, vemos um debate de ataques e não de ideias. E aqui há que se reconhecer o trabalho da Justiça Eleitoral que tem tentado coibir de todos os lados a chamada propaganda negativa, que traz implicitamente o pedido de “não voto” a determinado candidato.
Agora, imaginem esses 10% de eleitores que podem definir a eleição tendo que escolher seus candidatos em um contexto altamente agressivo e de desconstrução.
Entendo que aquela campanha que consiga se apoderar de uma narrativa otimista, com respeito ao futuro, será a que terá chances de fazer “click” com esses segmentos de “switchers” e desiludidos pela política.
Washington Olivetto, o maior publicitário do Brasil e um dos grandes da publicidade global, certa vez falou que “a propaganda política deveria ser um debate de ideias e propostas, e não um debate de publicitários”.
Concordo com ele e entendo que o papel dos profissionais de comunicação é melhorar o diálogo entre candidatos e eleitores, e não reforçar ainda mais os preconceitos existentes contra o campo político e políticos de forma geral.
A abstenção e o desencanto pela política só irão aumentar se continuarmos assistindo a campanhas políticas negativas, sem propostas, sem ideias, mas por sobretudo sem amor e respeito ao eleitor.
A democracia é o único caminho para viver em liberdade e em paz. Sem democracia não temos liberdade.
E para cuidar dela, deveríamos investir na educação cívica, formando cidadãos mais conscientes, só assim teríamos eleitores mais participativos.
Nas esferas legislativa e jurídica, as leis eleitorais em diversos países poderiam ser mais estritas nos filtros dos “ataques”. Os códigos de ética dos profissionais da propaganda, que valem para o mercado privado, deveriam ser observados, sobretudo, no campo político, pois se continuamos por esse caminho estaremos atentando contra a própria essência da política e da democracia, aumentando o abstencionismo e, por fim, o desinteresse pela política.
*Jorge Gerez, Estrategista e publicitário responsável pelas campanhas de eleição e reeleição do governador Carlos Massa Ratinho Junior em 2018 e 2022.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.