Apesar de o primeiro turno das eleições municipais ter resultado em crescimento tanto do PL, de Jair Bolsonaro, quanto do PT do presidente Lula, os partidos com maior número de novas prefeituras foram os da direita tradicional, popularmente conhecidos como “centrão”. Especialistas ouvidos pelo Congresso em Foco ressaltam que o novo cenário municipal é de enfraquecimento do discurso de polarização e de fortalecimento de lideranças fisiológicas.
Em números absolutos, os dois partidos que emplacaram o maior número de prefeitos foram o PSD e o MDB, com respectivamente 882 e 856 municípios. Proporcionalmente, o Republicanos duplicou sua capilaridade, crescendo de 211 prefeitos eleitos em 2020 para 436. O PT aumentou de 182 candidatos eleitos para 248. O PL, de 344 para 512 municípios: um crescimento elevado, mas muito inferior à meta de mil prefeitos desejada pelo seu presidente, Valdemar Costa Neto, que esperava equiparar sua capilaridade municipal à proporção da sigla no Congresso Nacional.
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Ainda assim, o PL foi o partido que mais venceu nesse domingo nos municípios com mais de 200 mil eleitores (foram dez eleições em primeiro turno) e o que mais emplacou candidatos no segundo turno, 22. A esquerda foi mal nessas cidades, como mostrou o Congresso em Foco.
“Os partidos com maior número de candidatos eleitos às prefeituras são justamente aqueles que, apesar de majoritariamente alinhados à direita, sentam para conversar com os dois lados”, destacou o economista e cientista político Ricardo de João Braga, professor do curso de Mestrado em Poder Legislativo da Câmara dos Deputados e coordenador do Congresso em Foco Análise. O PSD, presidido por Gilberto Kassab, secretário de Relações Internacionais de São Paulo, é o exemplo mais forte desse comportamento: o partido ocupa, ao mesmo tempo, pastas ministeriais do governo Lula e secretarias de um de seus rivais, o governador paulista Tarcísio de Freitas, apoiado por Jair Bolsonaro.
Também coordenador do Congresso em Foco Análise e cientista político, André Sathler descreve o mais recente resultado eleitoral como parte de um processo de amadurecimento tanto do eleitor quanto de lideranças políticas. “O prefeito Eduardo Paes [Rio de Janeiro] utilizou uma frase que, ao meu ver, bastante precisa: foi uma luta política bastante racional. No cenário geral, ele tem razão. Com exceção de São Paulo, vimos menos daquela polarização dos últimos anos e mais do que costumava ser o Brasil”, apontou.
Sathler destaca que os partidos tradicionais da direita já ocupavam amplos espaços no Congresso Nacional, e o resultado das eleições consolidou uma posição já observada por analistas dentro e fora do Planalto. Com isso, a tendência maior é de continuidade das estratégias de articulação já adotadas pelo governo, como a distribuição de emendas e ministérios em troca de apoio a proposições legislativas.
Por outro lado, para a ala radical, o resultado colhido indicou o início de um processo de fragilização. “Existe nesse grupo uma parcela formada por políticos de velha guarda precisando dividir espaços com uma nova geração que vem da influência digital. Isso cria uma dinâmica diferente dentro da direita que é muito mais volátil, muito mais instável”. Essa disputa interna se refletiu em rachaduras afetando o próprio resultado das eleições.
O principal exemplo citado pelo cientista foi a disputa eleitoral em São Paulo: o emedebista Ricardo Nunes, político tradicional na cidade e coligado a Jair Bolsonaro, precisou disputar espaço com um novo influenciador de extrema-direita, o empresário Pablo Marçal, do PRTB. A rachadura se refletiu no eleitorado, fazendo com que nenhum dos dois alcançasse uma vitória em primeiro turno.
Em Curitiba, a fragilidade interna entre lideranças de direita também resultou em um segundo turno: pelo PSD, o candidato Eduardo Pimentel estava oficialmente coligado ao PL. Nos momentos finais antes do pleito, porém, Bolsonaro direcionou seu apoio à jornalista Cristina Graeml, do PMB. Os dois agora seguem para a disputa em segundo turno.
Duas forças políticas tradicionais, porém, saíram duramente enfraquecidas na disputa eleitoral: o PSDB, partido que já formou a maior bancada de centro-direita do país, elegeu apenas 273 prefeitos, pouco mais da metade dos 523 de 2020. O PDT, partido de centro-esquerda que em diversos momentos rivalizou com o PT por influência, sofreu de forma ainda mais intensa, caindo de 315 para 149 prefeituras.
Sathler considera que, ao menos para os tucanos, a queda é irreversível. “O PSDB é um partido que tende a acabar. Os demais partidos já estão sondando os caciques remanescentes para atrair o capital político restante. É um movimento consequente das últimas reformas eleitorais, que favorecem a consolidação partidária e piora a situação para os partidos pequenos. A tendência é ele desaparecer nos últimos anos”, antecipou.
Para o PDT, por outro lado, o pesquisador acredita que o encolhimento municipal possa ressuscitar o debate interno sobre uma federação ou fusão junto ao PSB, partido ideologicamente mais próximo e que, apesar de ter conseguido colher um saldo positivo nas eleições de domingo, também lida com dificuldades para se manter diante da cláusula de barreira.
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