As urnas eleitorais ainda estavam quentes, e o sangue dos eleitores borbulhando, quando a reeleita presidente Dilma leu um discurso afirmando que o diálogo será a marca de seu segundo mandato.
A presidente se referia, particularmente, ao diálogo entre os principais atores políticos, incluindo o diálogo interno ao governo.
Embora essa comunicação política seja necessária e imprescindível, a comunicação social também é fundamental.
Nos primeiros quatro anos da gestão de Dilma Rousseff, o governo abandonou ações de comunicação via imprensa. Por isso, apenas durante a propaganda eleitoral obrigatória as realizações do governo foram conhecidas pela grande maioria da população – e a avaliação de Dilma e de seu governo melhoraram.
O ódio nosso de cada dia
A campanha anti-PT nadou de braçada durante a primeira gestão de Dilma. Seu governo abriu brechas enormes que foram preenchidas pela desinformação e pela contrainformação.
Surgiram cavaleiros do apocalipse em praticamente todos os órgãos da grande imprensa. Por meio de um punhado de comentaristas escatológicos, a política petista é apresentada a telespectadores, ouvintes, e leitores como sendo totalmente incorreta.
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O governo é apresentado como o único responsável por todos os problemas do país, e sua política como sendo conducente a uma situação catastrófica em termos econômicos e sociais. Nada que o governo faça tem sentido. Está tudo errado em todas as áreas de políticas públicas.
O governo de fato tem culpas a serem expiadas. Mas o ataque não é apenas ácido, é sulfúrico, desrespeitoso, debochado. Deixou de ser temperado, justo e necessário.
O ataque passou a ser tão violento e corriqueiro que uma parcela significativa daqueles que são contrários ao governo começaram a achar normal ofender abertamente a presidente, quer seja ao vivo em um estádio de futebol, ou por meio da internet.
A virulência dos ataques no meio político e na imprensa acabou repercutindo nas mídias sociais. E uma grande quantidade de brasileiros passou a mimetizar o ódio destilado diariamente na grande imprensa.
A crítica exacerbada, virulenta, está abrindo caminho para afundar em descrença total as já combalidas instituições públicas brasileiras. Surgem nas ruas meia dúzia de amantes do regime militar, quiçá da ditadura.
E juntamente com o ataque às instituições, pioram os ataques às minorias sociais. Já chegaram as ofensas abertas aos nordestinos. Em breve será a vez dos negros. Os índios, esses já são desprezados. Só atrapalham o agronegócio.
O comportamento da grande imprensa está produzindo no país conflitos sociais que podem levar nossa sociedade a uma desunião jamais vista.
Os reféns da mídia e a EBC
O fato é que hoje o governo é refém da mídia e na mídia. Não tem capacidade de comunicação, não tem como debater e rebater. Não sabe explicar seu modo de governar.
O que parece mais crítico é que não apenas o governo está refém, mas o Estado também está refém porque as instituições estão sendo solapadas pela descrença que a grande imprensa fomenta.
Quando o Estado está refém, a sociedade também é refém.
Quer seja pelo argumento de governabilidade, ou pelo argumento da defesa das instituições públicas – e da própria sociedade –, torna-se necessário e urgente que o governo abra o debate político, e que tenha, também, meios de comunicação eficientes.
A Empresa Brasil de Comunicação (EBC) é, ou deveria ser, um elo fundamental nessa interação governo-sociedade. Ela não é uma “assessoria de imprensa” do governo. É uma empresa pública, com direção editorial própria. E tem por obrigação ser a promotora da cidadania, levando à sociedade um jornalismo livre das amarras da iniciativa privada, livre das bestas-feras do jornalismo marrom.
No entanto, os programas que a EBC veicula, quer seja na TV, como nas suas várias emissoras de rádio, são antiquados, burocráticos e enfadonhos. Não chegam a pontuar nas pesquisas de audiência.
É preciso transformar a EBC em uma agência dinâmica, com cobertura equilibrada, e que seja mantida sua independência editorial.
A sociedade precisa de uma rádio pública de notícias e debates 24 horas. Na televisão, o noticiário “Repórter Brasil”, da EBC, precisa receber adrenalina, carisma, e recursos.
A inserção do noticiário da EBC nos diversos canais de mídia é tímida. No Youtube, o canal da EBC possui menos de três mil seguidores, por exemplo.
O governo também necessita reforçar portais na internet que são privados e que trazem informações criteriosas e equilibradas sobre o processo político e sobre políticas públicas.
As mídias regionais – jornais, rádios, portais locais –, que eram valorizadas no governo Lula, foram abandonadas na gestão Dilma.
Essas mídias, que se comunicam com a população do interior do Brasil, necessitam ser valorizadas e receber apoio público para consolidar no interior do país a prática do debate dos problemas que a sociedade local enfrenta.
Nesse sentido, a EBC poderia, além de gerar seu próprio conteúdo, criar conteúdo compartilhado com diversos meios de comunicação existentes no interior do Brasil.
Para a tarefa de financiamento da mídia regional, pode-se imaginar a criação de um fundo que tenha administração pluripartidária e esteja baseada em critérios técnicos, para fugir de qualquer controle político.
Livrai-nos do lixo
Enfim, uma parte importante da batalha pelo diálogo deve ocorrer na sociedade. A cólera precisa ser vencida pela razão.
Não se tratar de instrumentalizar a EBC para ser a “assessoria de imprensa” do governo. Tão pouco se trata de transformá-la em um canal de divulgação ideológica.
O que a sociedade brasileira precisa é de diálogo com o seu governo. Precisa de uma imprensa ética, que reflita os interesses de todos os brasileiros, que traga notícias de todo o país, e que investigue e critique o governo – do PT ou de qualquer partido que venha a sucedê-lo – com base em argumentos sólidos, ponderados.
A existência de uma imprensa pública e independente, de qualidade, trará o benefício da redução dos conflitos sociais que já começam a escalar, e deverá deixar claro para os brasileiros o lixo que atualmente eles estão sendo obrigados a consumir nas emissoras de TV, de rádio, e na imprensa escrita.