É simplesmente deplorável que petistas, começando por Dilma Rousseff, estejam desqualificando Marina Silva como o “Collor de saias”. Nem mesmo a iminência da derrota justifica esta tentativa desesperada de enfiarem uma falácia, a marteladas, na cabeça dos cidadãos comuns.
Para começo de conversa, qual Collor? O que era o inimigo nº 1 do PT em 1989 ou aquele que é o aliado nº 1 do PT em 2014? O que trombeteou o adultério e filha ilegítima do Lula, ou o que o Lula depois perdoou em nome da politicalha? O que antigamente era de direita e incomodava o PT, ou o que hoje é de direita e o PT não dá a mínima para isso?
Depois, no que, afinal, Marina se assemelha ao Collor (e também ao Jânio Quadros)? Apenas em não dispor hoje de uma razoável bancada de sustentação para o seu provável governo. Mas ela se diferencia, entre outros pontos, por ter sempre pertencido ao campo da esquerda e defendido um projeto coletivo, enquanto os outros dois só podem ser considerados aventureiros de direita com projetos meramente pessoais.
Se fôssemos levar em conta uma única semelhança, poderíamos também dizer que Dilma é a nova Eurico Gaspar Dutra ou Celso Pitta, dois postes que não seriam sequer eleitos síndicos de seus prédios, mas chegaram a presidente e a prefeito tão somente porque Getúlio Vargas e Paulo Maluf assim decidiram. Ou compará-la a Fernando Haddad, o outro sapo que o beijo do Lula transformou em príncipe.
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Mas é extremamente nefasto reduzirmos a campanha sucessória a uma batalha de tortas de lama ou a um torneio de chutes na virilha. Pois, para os militantes de esquerda, o que importa não é a vitória eleitoral a qualquer preço, mas sim o engajamento das massas no processo de transformação da sociedade.
Tal regressão aos métodos nazistas e stalinistas de difamação grosseira dos adversários produz um estrago muito maior do que o ganho objetivado pelos aprendizes de feiticeiro: faz os trabalhadores descrerem da política, passando a encará-la, cada vez mais, como um ninho de ratos ou uma pocilga fedorenta. Existimos para despertar neles a consciência do que são e do que poderiam ser, não para embotá-la ao sabor de conveniências eleitoreiras.
PublicidadePara a direita, ótimo! Ela quer mesmo é que os trabalhadores continuem céticos e desorganizados – incapazes, portanto, de assumirem seu papel de sujeitos da História (segundo Marx).
Para nós, péssimo! Se os explorados perderem a fé na possibilidade de uma reviravolta, continuaremos conquistando governos e fingindo governar, mas jamais obteremos o poder que verdadeiramente almejamos, qual seja o de transformarmos radicalmente a sociedade, livrando-a da ganância capitalista. Para isto precisamos de seguidores mobilizados e dispostos à luta, não de eleitores que pressionam teclas a cada dois anos.
* Jornalista, escritor e ex-preso político. Mantém o blog Náufrago da Utopia.
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