Em 31 de março, em uma jogada arriscada, o ex-ministro Sergio Moro trocou o Podemos pelo União Brasil. Ele podia não saber, mas morria ali o seu projeto de concorrer à Presidência em 2022. Responsável pelo convite a Moro e por abonar sua ficha de filiação, o deputado Junior Bozzella (União-SP) defende que todas as forças democráticas, inclusive o ex-juiz da Lava Jato, unam-se em torno de candidatura única para derrotar o presidente Jair Bolsonaro e evitar um golpe de Estado.
Lavajatista declarado, Bozzella afirma, em entrevista ao Congresso em Foco, que não há espaço para terceira via e que Lula, líder nas pesquisas, é o caminho mais viável para derrotar Bolsonaro e salvar a democracia. Para ele, é preciso deixar de lado as convicções ideológicas, neste momento, para impedir a ruptura institucional.
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“A gente não pode ficar com demagogia barata. Nem Lula nem Bolsonaro? Vai ser o Espírito Santo?”, questiona. “Lula é o mais bem posicionado. É mais fácil ganhar do Bolsonaro com Lula. Não defendo que o partido apoie Lula, mas que as forças democráticas se juntem e freiem o golpe em curso”, ressalta.
Bozzella reconhece que, para Moro, apoiar uma candidatura de Lula, seu principal inimigo político, seria “um pouco mais complicado do que para os outros”. Mesmo assim, pondera o deputado, o ex-juiz não pode se omitir caso a “escalada do autoritarismo” de Bolsonaro avance nos atos convocados pelo presidente para 7 de Setembro, feriado da Independência.
“O 7 de Setembro representará a escalada. Ele [Bolsonaro] está dando senha para o golpe. Ele quer que as pessoas peguem em armas. Vai acirrar ainda mais os ânimos”, avalia o parlamentar, que é vice-líder do União Brasil na Câmara e vice-presidente do diretório paulista do partido.
“Nunca votei no PT ou no Lula. Sou lavajatista, trouxe o Moro para o partido. Mas há momentos em que temos de fazer uma análise por causa da defesa da democracia. Se a natureza não apresentar alternativa, a política vai ter de encontrar. Esse deve ser o nosso esforço”, considera.
Na avaliação dele, é grande o risco de uma tentativa de golpe por parte de Bolsonaro. “Talvez ele nem espere as eleições. Temos de unir forças para tirar o discurso e o poder dele. Quanto mais se dividem os democratas, mais força se dá a Bolsonaro. Pessoas com discurso de anos contra o PT ficam com medo e elas não se posicionam. Elas têm de entender que são os democratas contra o autoritarismo”, defende.
Prestes a completar 42 anos, o advogado e empresário foi vereador em São Vicente (SP) e superintendente da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) em São Paulo antes de se eleger deputado federal pelo PSL em 2018, em meio à onda bolsonarista.
No primeiro ano de mandato, no entanto, rompeu com o presidente, liderando, juntamente com Luciano Bivar (PE), a ala que disputava o poder partidário com o grupo pró-governo. Desde então, Bozzella tornou-se o mais radical crítico de Bolsonaro dentro do PSL, que virou União Brasil ao se fundir com o DEM.
Para o deputado, Bolsonaro demonstrou sua incompetência e falta de compromisso para governar ainda no governo de transição. “Sempre foi um plano de poder, não um projeto de governo. Nunca cumpriu compromissos. Desde o primeiro dia ele faz campanha eleitoral. E assim foi chutando a cabeça de todo mundo. Tenta se preservar no poder como um brutamonte”, considera. “Ele sucumbiu ao establishment político para se perpetuar no poder”, acrescenta.
Ontem o presidente do partido, Luciano Bivar, desistiu da candidatura presidencial, mas indicou a senadora Soraya Thronicke (MS), ex-apoiadora de Bolsonaro, como possível candidata. A decisão será tomada pelo partido no dia 5.
Veja a íntegra da entrevista com Bozzella:
Congresso em Foco – O senhor é um crítico do presidente Bolsonaro. Na sua avaliação, qual seria a melhor estratégia para derrotá-lo?
Junior Bozzella – As forças democráticas deveriam se unir para enfrentar Bolsonaro. Há um golpe em curso. Não dá para subestimar Bolsonaro, ele já deu prova disso. Internamente, cada partido tem de fazer sua matemática. Deveriam se sentar todas as forças políticas do país, os democratas, e fazer uma discussão. A questão não é apoiar esquerda, centro-esquerda, temos de ter o foco de impedir a ruptura institucional. Reunir todo mundo em torno de uma candidatura, esse deveria ser o foco. Estamos caminhando para a ruptura institucional, não temos mais para onde correr.
Essa candidatura única seria a de Lula, que lidera as pesquisas?
Lula é o mais bem posicionado. É mais fácil ganhar do Bolsonaro com Lula. Não defendo que o partido apoie Lula, mas que as forças democráticas se juntem e freiem o golpe. Daqui a pouco não vai ter eleição. Mais importante que Lula ou Bolsonaro é a democracia.
Não há espaço para um terceiro candidato?
Tem gente que vai com o discurso nem Lula nem Bolsonaro. Vai com o Espírito Santo? Cada um faz discurso para a sua bolha e quer salvar sua própria pele. Precisa ver quem vai ter coragem. Não tem terceira alternativa que vai resultar num caminho paralelo à polarização. A gente não pode ficar com demagogia barata. Nem Lula nem Bolsonaro? Vai ser o Espírito Santo? Para fazer omelete, tem de quebrar ovos. Temos de cortar na pele.
O senhor apoia, então, a ideia de que todos se unam em torno de Lula?
Nunca votei no PT ou no Lula. Sou lavajatista, trouxe o Moro para o partido. Mas há momentos que temos de fazer uma análise por causa da defesa da democracia. Se a natureza não apresentar alternativa, a política vai ter de encontrar. Esse deve ser o nosso esforço. Não é questão de convicção, é questão de necessidade.
O senhor defende que Moro também siga esse entendimento de unir forças em torno de um candidato para derrotar Bolsonaro, mesmo que esse nome seja o de Lula, inimigo político dele?
Eu defendo que o país todo (risos). Mas não posso falar em nome dos demais. Respondo por mim. Para ele, um pouco mais do que para outros. Sempre fui lavajatista e defensor do Moro. Trouxemos ele para o partido. A ficha dele foi abonada pelo Bivar e por mim.
O senhor compreenderá se ele se abstiver nessa eleição, mesmo com o histórico de conflitos dele com Lula e Bolsonaro?
Depende do dia 7 de Setembro.
Como assim?
Deve haver uma escalada do autoritarismo. Estou bastante preocupado com o 7 de Setembro. Bolsonaro vai aglutinando forças. Como está afunilando, ele vai incitando as pessoas ao ódio, como ocorreu no assassinato do petista pelo bolsonarista em Foz do Iguaçu. Bolsonaro incentiva o ódio no subconsciente das pessoas. O 7 de Setembro representará a escalada. Ele dá senha para o golpe. Ele quer que as pessoas peguem em armas. Vai acirra ainda mais os ânimos. As pessoas acreditam que o mal não vai chegar. Quando acontecer o problema não vai ter eleição para ninguém. Não vai ter eleição para ACM Neto, Caiado… a imprensa não vai poder funcionar. Bolsonaro quer transformar o Brasil numa Venezuela. Estamos caminhando para a ruptura institucional, não temos mais para onde correr. É sentar com maturidade e organizar o jogo. Se tiver de fazer junção de todos em torno de um único nome que impeça ruptura institucional, que façamos. Mas nem todos têm essa liberdade.
Por quê?
Se não aparecer solução, não vai aparecer outro caminho para frear o golpe tramado. O golpe está armado, cai nele quem quer. Ou a gente vai passar ileso? Vai passar neutro? Votar branco ou nulo, se não tiver posição das forças políticas, corremos o risco de não ter eleição. Temos um presidente da Câmara dos Deputados conivente, um Congresso ajoelhado, refém do orçamento secreto. É perigoso.
Essa também é a dificuldade de seu partido?
Dentro do União Brasil, como em outros partidos, há dificuldade enorme. O Parlamento foi sequestrado pelo orçamento secreto, por aqueles que participam dele. As pessoas estão reféns, não têm liberdade nem para se manifestar. Como tenho independência, falo o que penso. Não estou no orçamento secreto.
O presidente de seu partido, Luciano Bivar, desistiu da candidatura presidencial, mas ainda há impasse se o União ficará neutro ou terá candidato próprio. Por que o seu partido também não caminha na direção de candidatura única?
Janones está dando passo nesse sentido. Está sendo coerente, é por aí mesmo. Ele não tem muita dificuldade, está tendo responsabilidade. É mais fácil para Janones do que para Bivar porque ele não é presidente de partido. Pode ter mais desprendimento. É uma figura mais individualizada, com seus milhões de seguidores nas redes. No nosso caso, é um grande partido, com 13 candidatos a governador. Qualquer movimento mais acentuado do Bivar, que também é presidente do União, tem uma avenida a ser atravessada. Cada um tem seu caminho para chegar ao poder, tem de entender como o cara vai se comportar.
O presidente Bolsonaro se irritou na semana passada com os manifestos liderados pela Faculdade de Direito da USP e da Fiesp, que têm apoio de banqueiros e empresários. O senhor considera que a elite está abandonando Bolsonaro?
As elites estão abandonando Bolsonaro, defendendo a democracia. Defender a democracia não é necessariamente defender Lula ou PT. Senão, todo mundo se assusta em entrar no jogo da democracia. Temos de ganhar a eleição. Se Bolsonaro for para as ruas, já sabemos como ele vai reagir. A gente quer evitar isso. Talvez ele nem espere as eleições. Temos de unir forças para tirar o discurso e o poder dele. Quanto mais se dividem os democratas, mais força se dá a Bolsonaro. Pessoas com discurso de anos contra o PT ficam com medo e elas não se posicionam. Elas têm de entender que são os democratas contra o autoritarismo. É uma questão de coincidência de momento. Se não estivesse em risco a democracia, se do lado de lá fosse um democrata, talvez essas pessoas não estivessem elucubrando uma possibilidade dessa. O mais grave é que, do lado de lá, tem um projeto de ditador. Isso nos obriga a refazer uma avaliação histórica com nossos conceitos. Mais importante que Lula e Bolsonaro é a democracia.
O senhor apoiou Bolsonaro e ele eleito junto com ele em 2018. Por que romperam? Quando enxergou nele ameaça à democracia?
Bolsonaro sempre foi arbitrário, desde o governo de transição. Quando a gente percebeu a incapacidade política, emocional e administrativa dele. Ele é limitado em todos os aspectos. Só funciona no grito, na porrada, no medo. Ele tem a questão mais grave de querer privilegiar ao máximo sua família. Ele se locupleta há 30 anos com as benesses do poder. Tanto que botou os filhos na política. Daí construiu sua vida. Não tem histórico de prosperar, de produzir emprego. Todo espólio dele foi construído dentro de um sistema político. Na primeira oportunidade como presidente já queria dar cargo de embaixador ao filho Eduardo. Enquanto tínhamos a reforma da Previdência, não moveu uma peça, não moveu com as reformas administrativa e tributária. Sempre esteve preocupado com as coisas supérfluas.
Mas a reforma da Previdência, que sempre emperrava, passou com ele.
A reforma da Previdência só passou pelo empenho do Congresso. Esforço zero do presidente. Com fracasso na gestão, ele queria sequestrar o PSL na porrada. Sempre foi um plano de poder, não um projeto de governo. Nunca cumpriu compromissos. Desde o primeiro dia ele faz campanha. E assim foi chutando a cabeça de todo mundo. Tenta se preservar no poder como um brutamonte. Se você comparar as convenções de candidatura dele a presidente, em 2018 e 2022, vai ver que houve um giro de 180 graus. Todo mundo que estava no palanque dos adversários dele naquele ano agora estava no palanque dele. Ele sucumbiu ao establishment político para se perpetuar no poder.