Um estudo realizado pelo Instituto Socioambiental (ISA) analisando individualmente os focos de garimpo ao redor da bacia hidrográfica do Xingu revelou que as áreas degradadas pela atividade se tornaram incapazes de uma recuperação total diante do dano acumulado durante o governo de Jair Bolsonaro. De acordo com o instituto, a única possibilidade de reflorestamento destas terras é com atividades de intervenção humana.
A bacia do Xingu, que passa pelo norte do Mato Grosso e sul do Pará, é uma das regiões com maior concentração de comunidades indígenas e unidades de conservação na Amazônia. Paralelamente, os arredores do rio se tornaram um dos focos de atividade garimpeira em busca de ouro ao longo da última década. Entre 2018 e 2022, o garimpo resultou na perda de 12,7 mil hectares de vegetação no local, 82% da devastação acontecendo dentro de zonas de proteção.
O estudo aponta para três principais fatores para esse crescimento: a valorização do ouro na bolsa de valores, que provocou o aumento nas buscas pelo minério; a falta de mecanismos de rastreio, o que facilita a lavagem do ouro para que seja inserido no mercado por meio das distribuidoras de títulos e valores mobiliário (DTVM); e “o desmonte da fiscalização ambiental que ocorreu durante o governo de Jair Bolsonaro”, somado ao “incentivo direto do governo à exploração garimpeira”.
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O principal foco de desmatamento no Xingu provocado pelo garimpo se dá na terra indígena Kayapó, com 72% da atividade na região. Apesar da região ser explorada ilegalmente desde a década de 1960, os índices dispararam em 2019, quando foram devastados mais de 1,8 mil hectares de vegetação, contra 1,3 mil em 2018. A situação evoluiu até chegar ao pico em 2021, quando a destruição de floresta beirou 2,2 mil hectares. Em 2022, houve uma queda para 1,45 mil hectares, mas esta foi acompanhada de aumento no garimpo em outras reservas ao redor.
“A escalada dessa atividade ilegal tem graves consequências tanto com relação à integridade dos territórios e destruição de suas florestas quanto na poluição de rios e igarapés”, alertam os pesquisadores do ISA. A principal preocupação diz respeito ao uso do mercúrio, substância utilizada para separar o ouro dos demais minerais, e é despejado nos rios e no solo.
“São nas margens desses rios que se localizam a maior parte das aldeias. Algumas dessas amostras apresentaram taxas de mercúrio acima do limite seguro para ingestão diária, estabelecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS)”, apontam. A substância também contamina comunidades ribeirinhas e peixes, que são consumidos nas cidades próximas à região. A intoxicação por mercúrio ataca diretamente o sistema nervoso, provocando problemas motores permanentes e podendo resultar em morte.
Publicidade“As escassas operações de fiscalização dos órgãos de comando e controle nas áreas protegidas, entre 2019 e 2022, não foram suficientes para conter uma atividade que se viu impulsionada pela tentativa de flexibilização das leis ambientais”, registrou o ISA. Mesmo em 2023, com o aumento do fluxo de ações de fiscalização, o garimpo segue como um problema sério no Xingu.
O instituto recomenda o fortalecimento dessas operações, reforçadas por ações de inteligência incluindo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) para evitar a reativação de garimpos desmontados e o surgimento de novos focos. A lista de soluções também inclui o fim da presunção de boa-fé das DTVMs, a criação de critérios mais rigorosos de fiscalização pela Agência Nacional de Mineração (ANM) e a implementação das medidas de reflorestamento previstas na Política Nacional do Meio Ambiente.
Confira a seguir a íntegra do estudo: