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Relatos de brasileiros de todas as regiões do país assustados com os preços no mercado vêm se proliferando nos últimos tempos. A alta de custos fez com que o poder de compra de parte significativa da população não dê mais conta de itens essenciais da cesta básica. Os cigarros, no entanto, parecem operar em um mercado diferente: eles não só permaneceram praticamente imunes aos reajustes vistos em outras categorias, mas se tornaram mais acessíveis. Hoje, um salário mínimo compra mais cigarros do que dez anos atrás.
Isso é particularmente grave porque políticas que elevem os preços dos produtos de tabaco são uma das medidas mais eficazes para controlar a prevalência de fumo e promover a saúde, enquanto a maior acessibilidade pode causar o efeito inverso: mais pessoas começando a fumar, especialmente jovens, menos incentivo para que fumantes parem e, consequentemente, maior incidência das mais de 50 doenças relacionadas ao tabaco, como vários tipos de câncer. Atualmente, 161 mil brasileiros morrem todos os anos por causa do fumo.
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Até 2016, o país mantinha uma política para aumentar anualmente o preço mínimo dos maços e os tributos, mas desde então não foram feitos novos reajustes – e é essa a razão da maior acessibilidade vista agora.
As empresas de tabaco costumam afirmar que já pagam muitos impostos e que elevar os preços poderia aumentar o contrabando de cigarros, mas nenhum desses argumentos se sustenta em uma análise mais profunda. Longe de ter uma carga tributária alta, o cigarro brasileiro é um dos mais baratos do mundo. Para efeitos de comparação, um maço da marca brasileira mais vendida custa cerca de R$ 5 (menos de um dólar), enquanto na Austrália o valor passa de R$ 100 (US$ 21,13).
PublicidadeAlém disso, o montante pago pela indústria em impostos é muito inferior aos custos do tabagismo, tanto pelo tratamento de doenças causadas pelo fumo quanto pelas perdas econômicas devidas a aposentadorias precoces e perda de produtividade no trabalho. Estimativas de 2020 revelam que há um déficit de mais de R$ 80 bilhões por ano que acaba na conta da sociedade: são R$ 92,7 bilhões em custos contra apenas R$ 12,2 bilhões arrecadados com os tributos sobre cigarros.
O contrabando de cigarros, por sua vez, é um problema real (apesar de superestimado pela indústria), mas que pode ser enfrentado de outras maneiras que não influenciam na política de preços e impostos. O Brasil já é um dos signatários do Protocolo para Eliminar o Comércio Ilícito de Produtos de Tabaco, instrumento elaborado pela Organização Mundial da Saúde com diversas estratégias eficazes para controlar o contrabando, como medidas para o combate às redes informais de distribuição, a cooperação internacional e o controle de fronteiras.
Para contribuir com o debate sobre a importância da taxação de cigarros, a ACT Promoção da Saúde, ONG que atua há mais de 15 anos com o controle do tabaco no Brasil, está lançando a página Conta do Cigarro, fonte das imagens que ilustram este texto, em parceria com a Vital Strategies. Lá, é possível acessar mais dados e infográficos sobre os custos do tabagismo para a sociedade, a questão do mercado ilícito e avaliações comparativas entre o preço do maço do cigarro no Brasil e em outros países, além de várias publicações relacionadas.
A Gerente de Comunicação de Programas da Vital Strategies, Tainá Costa, explica que a aposta na interatividade foi grande. “O hotsite permite que o usuário faça simulações e comparações entre dados relacionados ao cigarro brasileiro com os de outros países. Há, ainda, uma seção que apresenta os benefícios que o aumento de tributos sobre tabaco pode trazer a toda a sociedade, entre eles desestimular a iniciação de jovens, reduzir o consumo, elevar a arrecadação e diminuir os gastos com saúde. Essa é a medida mais custo-efetiva de controle do tabagismo”, diz.
Retomar a política de aumento do preço mínimo e dos tributos sobre cigarros é uma questão de saúde pública que traz grandes impactos econômicos. “É inadmissível que a sociedade brasileira tenha que arcar com custos tão altos devidos a um produto que só traz malefícios para a saúde, especialmente num momento em que muitas pessoas estão com dificuldades de adquirir alimentos básicos. O Brasil precisa continuar a ser exemplo no controle do tabaco, e para isso é preciso reverter o aumento na acessibilidade dos cigarros”, diz Mônica Andreis, diretora-geral da ACT Promoção da Saúde.